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FILOPARANAVAÍ

domingo, 27 de março de 2011

MITO e Filosofia: Esquemas de conteúdos

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Expor preconceito não é coragem, mas covardia


publicado em 06/04/2011 Atualizado em filoparanavai 08.04.2011



Por Marcelo Semer Fonte: Terra Magazine com fpabramo, em 06/4/2011


Depois da imensa reprovação social à entrevista do deputado Jair Bolsonaro, considerada ofensiva a negros e homossexuais, vivemos um perigoso refluxo.




Aos pedidos de abertura de processo na comissão de ética e representações de entidades civis, sucederam-se diversas manifestações, entre notas, artigos e reportagens na grande imprensa, em defesa do deputado. E pelos piores fundamentos.


Admitindo publicamente seus preconceitos, Bolsonaro vem sendo considerado um político corajoso. Estaria apenas exercendo seu direito a ser tacanho. E, desta forma, representando um importante pilar para a defesa da liberdade de expressão. Até Voltaire foi tirado indevidamente da tumba para justificar o direito ao preconceito.


Um exagero retórico, certamente.


Comparar o preconceito a uma posição política é o primeiro dos erros. De fato, não há democracia sem pluralismo. Mas nem todas as 'políticas' são permitidas na democracia. Uma proposta higienista e racista como a de Hitler se chocaria com nossos princípios mais elementares. Não é antidemocrático proibi-la, nem punir quem a defenda publicamente. Considerar o racismo uma 'proposta política' é o mesmo que tratar a pedofilia como uma tara.


Pode-se afirmar que o comportamento humano não se acomoda a limites, ou como dizia a música de Chico Buarque, que sexo é "o que não tem governo, nem nunca terá". Mas quando a perversão se dirige a crianças, desprovidas de discernimento, a sociedade tem o pleno direito de proibir seus atos e punir seus praticantes.


Com a palavra não é muito diferente.


O pluralismo depende da liberdade de expressão. Mas isso não impede que certos abusos sejam passíveis de punição, porque podem ser feridos outros direitos igualmente relevantes e protegidos.


O próprio STF já se debruçou sobre a questão, condenando um editor de livros nazistas, ao reconhecer que o estímulo ao preconceito se sobrepunha à liberdade de expressão. Afinal, não vivemos em uma Constituição de um só artigo e a dignidade da pessoa humana é nada menos do que uma das premissas da República.


É certo que para a garantia do exercício parlamentar, a imunidade em suas palavras, discursos e votos é imprescindível. A punição do discurso político é um perigo para a democracia, porta aberta para o autoritarismo. Mas como nenhum direito é irrestrito, nenhuma imunidade tampouco é absoluta - a irresponsabilidade das autoridades é uma marca própria da monarquia, não da república.


A jurisprudência do STF é tradicionalmente restritiva no que respeita à punição de parlamentares por suas palavras. Da história recente, apenas o deputado Eurico Miranda teve contra si uma queixa-crime recebida pelo tribunal, por ofensa não ligada ao exercício do mandato.


Mas isso não é lá um grande parâmetro, porque o número de políticos condenados pelo Supremo por outros delitos também é irrisório. O que mais incomoda na defesa ao deputado são os elogios à sua coragem de dizer abertamente o que muitos somente diriam entre quatro paredes. Este é um tipo de tema, no entanto, em que a franqueza não representa vantagem alguma. Ninguém é punido por seus íntimos preconceitos, inclusive porque o controle de pensamentos, impressões ou sentimentos não está a nosso alcance.


O que a lei pune é justamente a exteriorização do preconceito, a manifestação pública por meio de palavras ou atitudes. Estes atos são impactantes no sentido de menosprezar a pessoa, humilhando-a no que tem de mais precioso, sua própria essência. É quando o preconceito magoa, mutila e destrói, paulatinamente, a autoestima do discriminado. Expor o preconceito, violando os vulneráveis, não é coragem alguma.


É simplesmente covardia.


Mas ainda há mais. Muitas pessoas se satisfazem em disparar ofensas e agressões rasteiras. Mas tantas outras são incensadas ao ódio pelas palavras de ordem do preconceito, e não param por aí. Quem estimula racismo e homofobia não gera apenas constrangimentos, provoca uma cadeia de condutas que não raro desbanca em agressões.


Homossexuais e nordestinos, por exemplo, têm sido presas fáceis de bárbaros discriminadores país afora, da mesma forma que muçulmanos são a bola da vez na Europa.


As bravatas de hoje invariavelmente se tornam violências do amanhã. Criminalizar preconceitos não é fazer a defesa fútil do politicamente correto, mas do humanamente digno. O que está em jogo não é uma etiqueta, uma regra de conduta, mas o tipo de sociedade que estamos construindo.


A que está em nossa Constituição, livre, justa e solidária, não admite o racismo e as mais variadas formas de preconceito. As ditaduras, todavia, já se mostraram capazes de conviver muito bem com todos esses monstros. Talvez por isso o deputado seja tão saudoso da nossa...


*Marcelo Semer é Juiz de Direito em São Paulo. Foi presidente da Associação Juízes para a Democracia. Coordenador de "Direitos Humanos: essência do Direito do Trabalho" (LTr) e autor de "Crime Impossível" (Malheiros) e do romance "Certas Canções" (7 Letras). Responsável pelo Blog Sem Juízo. Fonte:fpabramo



A partir de hoje iniciamos as postagens de esquemas de aulas - do professor organizador deste blog - já aplicadas em salas de aulas onde atuamos no cotidiano letivo. Esperamos que estes sejam úteis para os alunos (as) na revisão dos conteúdos já trabalhados e que também possam ser úteis para os demais internautas visitantes deste blog. Nosso objetivo aqui é socializar ao máximo nossos estudos de filosofia nestes tempos em que a FILOSOFIA finalmente voltou às salas de aulas do Ensino Médio no Brasil.


ABORDAGENS GERAIS:


1. Conteúdo Estruturante Mito e Filosofia 2. Conteúdos Básicos 2.1 Saber mítico; 2.2 Saber filosófico; 2.3 Relação Mito e Filosofia; 2.4 Atualidade do mito; 2.5 O que é a Filosofia? Por Lucio LOPES, atualizado em filoparanavai em 26.03.2011 às 22h00


IMPORTANTE: Considerações gerais do professor O vocábulo mito ► vem do grego μύθος (mýthos) ► Um mito é uma narrativa sobre a origem de alguma coisa



► O mito apesar de ser um conceito não definido de modo preciso e unânime, constitui uma realidade antropológica fundamental, pois ele não só representa uma explicação sobre as origens do homem e do mundo em que vive, como traduz por símbolos ricos de significado o modo como um povo ou civilização entende e interpreta a existência, é um SABER que orienta a organização cotidiana de uma sociedade.É um conjunto de conhecimentos construídos a partir do imaginário social e transmitido através de ESTÓRIAS contadas, transmitidas, por intermédio de uma Linguagem Alegórica. Estas estórias são imaginárias, porém, sempre tendem a um fundo de verdade.


O MITO é um saber de caráter NÃO JORNALÍSTICO (que descreve um dado acontecimento com pormenores e rigor quanto a identificação de local, data, etc.). O MITO é saber que tem caráter e objetivo estritamente EDUCATIVO.


► Mito também é uma narrativa tradicional de conteúdo religioso e artítico, uma vez que ele é constituído de linguagem alegórica e procura explicar os principais acontecimentos da vida a partir da dimensão sobrenatural.


► O conjunto de narrativas desse tipo e o estudo das concepções mitológicas encaradas como um dos elementos integrantes da vida social são denominados mitologia.



► Segundo Mircea Eliade, a tentativa de definir mito é a seguinte, [...] o mito é uma realidade cultural extremamente complexa, que pode ser abordada e interpretada em perspectivas múltiplas e complementares....o mito conta uma história sagrada, relata um acontecimento que teve lugar no tempo primordial, o tempo fabuloso dos começos...o mito conta graças aos feitos dos seres sobrenaturais, uma realidade que passou a existir, quer seja uma realidade tetal, o Cosmos, quer apenas um fragmento, uma ilha, uma espécie vegetal, um comportamento humano, é sempre portanto uma narração de uma criação, descreve-se como uma coisa foi produzida, como começou a existir...(Mircea Eliade, Aspectos do Mito, pg. 12ss)


TODOS OS POVOS ANTIGOS EM ALGUM MOMENTO DE SUA HISTÓRIA E A PARTIR DE CARACTERÍSTICAS PRÓPRIAS DE SUA CULTURA CONSTRUÍRAM SABERES MÍTICOS ESPECÍFICOS. Os gregos, os persas, os romanos, os judeus, os egípcios, etc...


► O PROFANO DÁ LUGAR AO SAGRADO.


O mito NÃO É UMA MENTIRA, ele reflete sempre a realidade interpretada a partir de um racicínio influenciado pela CRENÇA RELIGIOSA e explicitado através de uma linguagem alegórica. Mircea Eliade trata disso também e destaca que: [...] o mito é considerado como uma história sagrada, e portanto uma história verdadeira, porque se refere sempre a realidades. O mito cosmogónico é verdadeiro porque a existência do mundo está aí para o provar, o mito da origem da morte é também verdadeiro porque a mortalidade do homem prova-o...e pelo facto de o mito relatar as gestas dos seres sobrenaturais e manifestações dos seus poderes sagrados, ele torna-se o modelo exemplar de todas as actividades humanas significativas. (Mircea Eliade, Aspectos do Mito, pg.13).


► Aquilo que os seres humanos têm em comum revela-se no mito. Segundo Campbell, eles são estórias da nossa vida, da nossa busca da verdade, da busca do sentido de estarmos vivos. Os mitos são pistas para as potencialidades espirituais da vida humana, daquilo que somos capazes de conhecer e experimentar interiormente. O mito é o relato da experiência da vida. Eles ensinam que nós podemos voltar-nos para dentro.E desde aí voltar-se para o mundo exterior em busca de seus mistérios. (Joseph Campbell, www.geocities.com/viena/2809/mitos.html)


► Para nós é importante lançarmos um olhar sobre o Mito Grego e desde ele compreender como é que a FILOSOFIA irrompeu desde a REALIDADE histórica grega. PARA LOCALIZARMOS O SABER MÍTICO DENTRO DO GRANDE SISTEMA OCIDENTAL DE CONHECIMENTO



► TODO SABER É RACIONAL A organização do Conhecimento Ocidental ocorre a partir de 6 saberes específicos em natural interação entre os mesmos. O PRIMEIRO SABER É O ARTÍSTICO e data desde que o Homem enquanto em processo de evolução hominídea passa a utilizar-se daquilo lhe é próprio e que o diferencia dos demais animais: A Faculdade Anímica da Razão. É bom recordar que as espécies hominideas em evolução construíram este saber a partir da necessidade também central de elaborarem respostas para questões existenciais fundamentais de seu cotidiano, ou seja, questões relacionadas ao campo prático da sobrevivência. O Homem em processo de deslocamentos grupais, na forma nômade, queria encontrar formas facilitadoras para adquirir alimentos e proteção para seus grupos sociais.


LEMBRE-SE O PLANETA TERRA TEM em torno de 4bi de anos: Idade da Terra: Em 1654, um arcebispo irlandês calculou, com base em textos bíblicos e em crenças religiosas, que a Terra teria se formado às 9 horas do dia 26 de outubro de 4.004 a.C. Hoje,por intermédio do saber científico, sabemos que a Terra tem em torno de 4,5 bilhões de anos. O Big bang teria ocorrido há 15 bilhões de anos atrás; as Galáxias teriam se formado há 13 bilhões de anos; as Primeiras estrelas teriam surgido há 10 bilhões de anos; o Sol teria se formado há 5 bilhões de anos; e a Terra há 4,5 bilhões de anos (fonte:Paulo Araújo Duarte. Professor de Astronomia do Departamento de Geociências da Universidade Federal de Santa Catarina. Março/1999. (http://planetario.paginas.ufsc.br/?s=Planeta+ter ra+tem+4+bi&x=9&y=4)). Confira uma rápida panorâmica em relação ao movimeto evolucionista hominídeo:



Ramapitheco - Viveu há cerca de 14 milhões de anos e é considerado o mais antigo ancestral do homem, provavelmente vivia em árvores. Australopitheco - Hominídeo surgido há 3 milhões de anos. Tinha menos da metade do nosso volume cerebral. Andava em pé.Usava as mãos para colher frutos, atirar pedras e paus para abater pequenos animais.


Homo habilis - Primeira forma humana, surgida há 2 milhões de anos. O cérebro era um pouco maior que o do Australopitheco e fabricava suas ferramentas quebrando lascas de pedra.Junto a seus fósseis foram econtrados vestígios das cabanas que construía.


Pithecantropo ou Homo erectus - O Homem de Java e de Pequim. Forma humana surgida há 1,6 milhões de anos. Tinha o cérebro maior que o do Australopitheco e o corpo mais evoluído. Vivia em bandos de 25 a 30 pessoas. Descobriu o fogo, fabricava instrumentos, caçava, pescava e coletava raízes e frutos. Saiu da África e se espalhou pela Europa e pela Ásia.


Homem de Neanderthal (Homo sapiens neanderthalensis) - Surgiu há cerca de 150 mil anos atrás. Enfrentou um período glacial muito intenso. Seu cérebro era aproximadamente igual ao nosso. Usava instrumentos bem feitos e já enterrava os mortos. Conviveu com os primeiros homens modernos. Homem atual (Homo sapiens sapiens) - O mais antigo fóssil dessa espécie é a do Homem de Cro-magnon, surgido há cerca de 35 mil anos atrás. Fisicamente é igual ao homem atual. Seu cérebro era bem desenvolvido. Em busca de caça, ocupou todas as partes da Terra, em grupos de caçadores e coletores. Compreendendo mais facilmente este primeiro momento de construção do saber humano:



O SABER ARTÍSTICO SE CARACTERIZOU POR SER TRANSMITIDO PRIMEIRAMENTE ATRAVÉS DE PINTURAS RUDIMENTARES NAS PAREDES DAS CAVERNAS - da linguagem mímica para a linguagem alegórica - locais onde o homem abrigava-se para ter maior segurança contra animais selvagens e intempéries da natureza. Assim eles além de guardarem conhecimentos para suas futuras gerações, também acabavam por socializarem os conhecimentos adquiridos com outros grupos hominídeos - por exemplo a invenção da técnica de fabricar uma lança que facilitaria abater animais grandes, etc. O SABER RELIGIOSO Este saber também não tinha grande complexidade.


O ARTÍSTICO não dava conta de responder questões que fugiam da dimensão do natural e passavam para o aspecto da crença, do oculto, do invisível, enfim, do SOBRENATURAL.


O Homem passa a ter necessidade de relacionar-se com seres imaginários sobrenaturais: brota a ideia de deuses e depois no processo cria-se a institucionalização de aparatos religiosos - as religiões. CHEGAMOS AO SABER MÍTICO Quando finalmente o homem desenvolveu a agricultura e domesticação dos animais (Não sabemos ao certo, mas é algo em torno de 10.000 a.C) ele passou de uma organização extremamente simples para uma maior complexidade. Com a agricultura os grupos nômades puderam se estabelecer próximos a rios e se utilizar deles para a irrigação do solo, conseguindo assim a sobrevivência sem a necessidade de se mudar frequentemente em busca de alimentos.Uma vez fixados na terra é que se tornou possível a formação de comunidades. Dois bons exemplos: As primeiras cidades antigas que se formaram ao longo dos rios Tigre e Eufrates ( na Mesopotâmia ) e as cidades do antigo Egito ao longo do rio Nilo.


NASCE ENTÃO A NECESSIDADE DE UM SABER NOVO, uma vez que o ARTÍSTICO E O RELIGIOSO não davam mais conta do novo contexto histórico do homem sedentário e que passa a viver em civilização. (Revolução Neolítica (ou Revolução Agrícola) é a expressão criada pelo arqueólogo inglês Gordon Childe para designar o movimento dado na Pré-História, que marcou o fim dos povos nômades e o inicio da sedentarização do homo sapiens, com o aparecimento das primeiras vilas e cidades. No Período Paleolítico, os grupos nômades não possuíam moradias fixas. Já no Neolítico, as sociedades humanas desenvolveram técnicas de cultivo agrícola e passaram a ter condições de armazenar alimentos. Isso levou a grupos humanos a se fixarem por mais tempo em uma região e a se deslocarem com menor frequência.Essa foi a fase da evolução cultural em que se deu a passagem do ser humano "de parasita a sócio ativo da natureza". Foi uma transformação que levou o homo sapiens a se fixar definitivamente em um local e o adaptar às suas necessidades, tendo por base uma economia produtora. O processo de transformação da relação do Homem com os animais e plantas proporcionou um maior controle das fontes de alimentação.(fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A 7%C3%A3o_neol%C3%ADtica)


NASCE O SABER MÍTICO que interagindo com o artístico e o religioso - passa a responder questões cada vez mais complexas. O MITO, enquanto saber tem função exclusivamente SOCIAL. Agora preste muita atenção para a JUSTIFICATIVA SOBRE A IMPORTÂNCIA DE CONHECERMOS AS LINHAS GERAIS DO SABER MÍTICO NA GRÉCIA ANTIGA Promover um estudo investigativo e, ao mesmo tempo, uma reflexão sobre o saber mítico na Grécia Antiga é possibilitar ao estudante de Filosofia, uma compreensão mais ampla e menos preconceituosa sobre esta forma de saber.


Ela é identificada não apenas nos povos primitivos da antiguidade, mas também, possivelmente identificada ainda hoje nas culturas dos povos nativos do Brasil e de outros povos espalhados nos demais territórios continentais. Este saber mítico, produzido ao longo de milênios, de séculos, é muitas vezes recurso essencial para a manutenção da identidade comunitária e cultural destes povos nativos. Converte-se em ícone de resistência. Compreender o Mito Grego é essencial para uma compreensão de como surgiu o pensamento racional, conceitual, entre os gregos. Isto decorre do fato de que o conhecimento Filosófico nada mais é do que fruto de um processo de auto-afirmação histórica da RAZÃO (LOGOS) diante do conhecimento mitológico desenvolvido na Grécia.


O pensamento racional/conceitual entre os gregos foi decisivo no desenvolvimento da cultura da civilização ocidental. Logo, entender as relações entre o Mito e a Filosofia é condição fundamental para entendermos que o Homem ao longo do processo de construção de sua história desenvolveu diversas formas de conhecimentos a partir da busca incessante de respostas diante das questões e/ou problemas existenciais de seu cotidiano – Artístico e Religioso, seriam as duas primeiras modalidades e/ou conjuntos de conhecimentos, por exemplo – o artístico responderia por questões práticas e o religioso brota da necessidade de compreender o não compreensível (sobrenatural) e, que, o Mito tanto na Grécia quanto nos demais povos marca um período em que o Homem era dominado pelo medo diante do uso da Razão, uma vez que este medo era perpetuado pela crença de que o uso desta faculdade anímica era uma atividade reservada apenas aos ricos aristocratas, com autorização expressa dos deuses que eram os únicos a possuírem o direito natural de seu uso, crença esta atestada, por exemplo, na obra “Teogonia” do poeta Hesíodo e muito bem retratada no mito de Prometeu.



Ora, que relação poderíamos fazer entre este uso da Razão regulado na antiguidade e os conceitos de Ideologia e Alienação nas sociedades contemporâneas? Eis aqui um problema filosófico. O mito, rico em sua linguagem disseminada nas diversas culturas e, em especial na grega, possibilitará na medida em que as fronteiras de seus limites demarcados sejam superados pelo homem insurgente, imerso justamente na capacidade de transcender fronteiras no que tange a processos de conhecimentos, o diálogo entre diferentes formas de expressões deste saber nas diferentes culturas dos povos, uma crise relacional que forjará a Filosofia enquanto atividade Reflexo/Racional, de caráter genuinamente contestadora diante das verdades com status de dogma. Dessa forma, é importante que o estudante do Ensino Médio conheça o contexto histórico e político do surgimento da Filosofia e o que ele significou para a cultura helênica.


Conhecer os fatores sócio/econômico/político/culturais e religiosos, que possibilitaram o surgimento da Filosofia na Grécia e não em outro lugar qualquer do Planeta, é fundamental para a compreensão das grandes linhas de pensamento que dominam todas as nossas tradições culturais Ocidentais. Levar os estudantes de Filosofia a uma compreensão dos conflitos gerados na passagem do conhecimento mitológico para o pensamento racional é de fundamental importância para que os mesmos possam ainda identificar em nosso cotidiano atual aqueles problemas elaborados na antiguidade e que hoje, pedem respostas diferentes devido a complexidade mais profunda com a qual se apresentam.


A alienação imposta pela classe dominante sobre as classes populares, por exemplo, é apenas um problema filosófico ainda não resolvido plenamente e que se arrasta desde o dia em que o homem passou a viver em civilização com um mínimo de organização política. Estudar o Mito Grego é condição sine qua non para uma compreensão do saber filosófico em suas origens. Este segundo saber não anula o primeiro, nem mesmo é mais verdadeiro, apenas propõe uma nova possibilidade, uma nova forma de relacionar-se com o conhecimento.


Aliás, só para situar a validade dessa proposição é bom lembrar que em suas obras, tanto Platão quanto Aristóteles, tratam o mito como MATÉRIA PRIMA do pensamento filosófico. Na sua perspectiva, Aristóteles tinha a compreensão de que o Mito era a matéria prima da Filosofia, até mesmo porque em contraponto ao Mito, os primeiros filósofos, desde Tales, se aventuraram na busca de princípios e, era sobremaneira a especulação sobre os princípios e causas - a marca que fazia o verdadeiro filósofo, segundo Aristóteles. Apesar de criticar na sua obra “Metafísica” os filósofos cosmologistas por se ocuparem apenas do princípio e causa material (a busca por um Arché do Cosmo e da Physis), os reconhecia como sendo os primeiros filósofos: “(...) Com efeito, foi pela admiração (thauma) que os homens começaram a filosofar tanto no princípio como agora; perplexos, de início, ante as dificuldades mais óbvias, avançaram pouco a pouco e enunciaram problemas a respeito das maiores (...). E o homem que é tomado de perplexidade e admiração julga-se ignorante - por isso o amigo dos mitos [filómito] é de um certo modo filósofo... “ (Aristóteles, Metafísica, A 982b)


Portanto, compreender o Mito a partir do contexto de seu “chão” é abrir a possibilidade de compreender mais profundamente a Filosofia originária da Grécia Antiga tal qual ela é: Irrompida da DÚVIDA e convertida em Atividade Crítico/racional composta de regras claras e profundo rigor, motivada pela busca da verdade e/ou seja, a aproximação mais possível à verdade. Conhecer o Mito e o poder de sua linguagem alegórica é uma dessas tarefas primordiais na longa aventura do estudo filosófico. O Mito não está isolado e perdido no passado, seus conteúdos interagem com os conteúdos de todos os conjuntos de conhecimentos AINDA HOJE, ora com o artístico, ora com o religioso, ora com o senso comum, ora com a filosofia, ora com a ciência... O Mito em conexão com a Filosofia e os demais saberes, pode e muito, nos oferecer pistas para elaborarmos respostas às questões existenciais da atualidade, sobretudo respostas que possam levar o homem ao reencontro de seu poder re-humanizador.


PODE TAMBÉM NOS AJUDAR A IDENTIFICARMOS AS RAÍZES DE COMPORTAMENTOS CULTURAIS PROFUNDAMENTE ENRAIZADOS NO IMAGINÁRIO MÍTICO DA ANTIGUIDADE - por exemplo, a Cultura do Machismo que impera no Ocidente e que tem suas raízes nos saberes míticos grego e judeu.



A imagem acima representa a deusa Gaia no ato criador:


Na mitologia grega, Gaia (Géia) é a personificação divina da Terra (como elemento primitivo e latente de uma fecundidade devastadora e infindável). Segundo Hesíodo e sua Teogonia, ela é a segunda divindade primordial, nascendo após Caos e foi uma uma das primeiras habitantes do Olimpo. Como dissemos, sua potenciadade progenitora é tão intensa que, sem intervenção masculina, dá a luz a Urano (seu filho e esposo), às Montanhas e ao Mar. Casada com o Céu, a Terra gera também os Titãs e os Ciclopes. Absolutamente tudo que cai em seu ventre fértil ganha vida.


Na próxima postagem o esquema geral do Mito da Criação do Cosmos na versão grega e o mito da criação do homem e da mulher.


LEIA MAIS sobre a relação entre MITO e FILOSOFIA - PARA APROFUNDAR NOSSA COMPREENSÃO ACERCA DA RELAÇÃO ENTRE SABER MÍTICO E SABER FILOSÓFICO


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MITO E FILOSOFIA: Acesso fácil aos conteúdos


A relação Filosofia e Mito é estudada na disciplina de Filosofia com o objetivo de compreender o nascimento da reflexão filosófica na Grécia Antiga. A Filosofia, percebendo as contradições e limitações dos mitos, foi reformulando e racionalizando as narrativas míticas, transformando-as numa outra coisa, numa explicação inteiramente nova e diferente.


Compreendendo de maneira simples o MITO

 Ensaio: MiTO e FiloSofia...

Um pouco da História da Grécia Antiga: Berço da Filosofia

MITO E FILOSOFIA: ALGUMAS INFORMAÇÕES IMPORTANTES SOBRE O SABER MÍTICO

LEITURA DE TEXTO FILOSÓFICO: O nascimento da filosofia

Demarcando as diferenças entre Mito e Filosofia

FILOSOFIA: Resumos de aulas, atividades, textos...

A PALAVRA FILOSOFIA E A SIMBOLOGIA DA CORUJA DE ATHENA/MINERVA

MITO E FILOSOFIA: Oque é o Mito? Quais as funções do Mito? O Mito continua a existir na atualidade?

CARACTERÍSTICAS GERAIS DO MITO ‘GREGO’

Leitura de texto filosófico: MITO E RELIGIÃO e o homem da era científica

Leitura de texto filosófico: O MITO HOJE: O mito do Superman

A FILOSOFIA NO MUNDO, por Karl Jaspers

Resumo do Poema Ilíada de Homero por Duclós

PDF's 'Ilíada' e 'Odisseia' de Homero

Hesíodo e sua obra Teogonia: A origem dos deuses.

Principais períodos da história da Filosofia

O nascimento da Filosofia

A origem da Filosofia




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LEITURA DE TEXTOS FILOSÓFICOS: HEGEL (ÉTICA, POLÍTICA E LIBERDADE) parte 1

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Hegel e o caráter ético-político da ideia de liberdade

(PARTE1)

Textos Filosóficos


HEGEL, Friedrich. Hegel e o caráter ético-político da idéia de liberdade. in MARÇAL, Jairo (org.). Antologia de textos filosóficos. Curitiba: SEED/PR, 2009. pp. 299-337. Texto de apresentação e notas: RAMOS, Cesar A. Tradução do alemão e notas: Cesar A. Ramos e MULLER, Marcos Lutz


Georg Wilhelm friedrich hEGEl nasceu em Stuttgart (Alemanha), em 1770, e morreu em Berlin, aos 61 anos em 1831. Estudou teologia e filosofia (1788-1793) no seminário da igreja protestante em Wurttemberg (Tubinger Stift), mas desistiu de ser pastor, e dedicou-se à filosofia. Nessa época, em Tubingen, conheceu o poeta Hölderlin e o estudante de filosofia Schelling. Ainda jovem, nutriu grande admiração pela Revolução Francesa (1789). Depois de deixar o seminário, o jovem Hegel trabalhou como preceptor de filhos de famílias ilustres da época, e depois como professor de filosofia em um Ginásio em Nuremberg, do qual foi diretor em 1808.

Em 1816 foi nomeado para a cátedra de Filosofia da Universidade de Heidelberg, e, em 1818, ingressou na Universidade de Berlin, nela permanecendo até a sua morte, vítima de cólera. Pouco antes, em 1829, tinha assumido o cargo de reitor desta mesma Universidade.

Em 1801 publicou seu primeiro livro: Diferença entre os sistemas filosóficos de Fichte e Schelling. Em 1807 surgiu a Fenomenologia do espírito. No período de 1812, 1813 e 1816 publicou a Ciência da lógica, em três volumes. Em 1817 escreveu a Enciclopédia das ciências filosóficas, uma expo-sição em compêndio sobre todo o seu sistema filosófico, com reedições ampliadas em 1827 e 1830. No período em que esteve na Universidade de Berlin, publicou as Linhas fundamentais da filosofia do direito (1820), um texto, também em compêndio, sobre ética, filosofia política e direito, o qual foi objeto de sucessivas lições nas suas aulas na Universidade, em 1818/19, 1819/20, 1821/22, 1822/23, 1824/25. Nesse mesmo tempo, além destes cursos, proferiu lições sobre filosofia da arte, história da filosofia, filosofia da história e filosofia da religião. Após a morte de Hegel, os discípulos editaram e publicaram os apontamentos do mestre sobre as lições, complementados com as anotações dos próprios alunos. Esse material foi conhecido como Filosofia da história, Estética, Filosofia da Religião e História da filosofia. São textos de grande serventia didática para um estudo introdutório ao pensamento hegeliano. 1

[1 Após a sua morte, a influência do hegelianismo foi significativa, sobretudo, nas áreas da filosofia política e do direito. Na Alemanha, logo após a sua morte, presença do pensamento hegeliano ocorreu sob a forma de duas correntes, cada qual disputando a herança hegeliana – os “hegelianos de direita” (Davi Strauss, Kuno Fischer, Karl Rosenkranz) – na perspectiva de um pensamento conservador e religioso; e os “hegelianos de esquerda” (Ludwig Feuerbach, Bruno Bauer, Arnold Ruge, Max Stirner e Karl Marx), seguindo uma leitura revolucionária e crítica da realidade social, e para a qual o arcabouço teórico da filosofia de Hegel era extremamente útil. Mas a influência de Hegel, ainda que díspar e controversa, se estende à filosofia do século XX, nas aproximações possíveis que ela permite na filosofia marxista, nos filósofos da teoria crítica da Escola de Frankfurt e em alguns pensadores, chamados comunitaristas, como C. Taylor e outros nos nossos dias.]

Hegel foi considerado como o último grande pensador que escreveu um sistema filosófico. De fato, as suas ideias versam sobre um vasto campo, abrangendo os mais diversos aspectos da filosofia: lógica, teoria do conhecimento, ética, filosofia política e do direito, filosofia da história, da arte, da religião e outros. A exposição das suas ideias, escritas numa linguagem de compreensão nem sempre fácil, está enfeixada segundo um encadeamento metodológico sistemático. São ideias que revelam a intenção do autor em compreender a riqueza das determinações da realidade que se apresentam para o conhecimento filosófico.


O hegelianismo se propõe ao desafio de ser um discurso filosófico sobre a totalidade. Isso porque o conhecimento da realidade – multifacetária e contraditória – para se constituir em saber verdadeiro, deve ser ri-goroso, sistemático e racional, o que configura, no vocabulário de Hegel, uma “ciência do absoluto”. Esta é a pretensão de uma filosofia especulativa que tem por objeto uma análise exaustiva e “omnicompreensiva” (A Enciclopédia das ciências filosóficas retrata essa pretensão) de tudo aquilo que pode se apresentar e se realizar como ideia: do ponto de vista “da Ideia em si e para si” – objeto da Lógica; da ideia “em seu ser-outro” – a Filosofia da Natureza; e da ideia que “em seu ser-outro retorna a si mesma”, o domínio da Filosofia do Espírito.2 No que diz respeito à Filosofia do Espírito3,


[2 HEGEL, Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften I, Werke 8, § 18. 3 O conceito de espírito apresenta uma diversidade de sentido filosófico, psicológico e religioso na tradição da história das ideias. Na filosofia hegeliana, espírito (Geist) denota um significado fundamental no sistema filosófico de Hegel. Do ponto de vista da divisão deste sistema, o espírito é a Ideia na forma de um retorno de um outro da Ideia lógica – a natureza. Se a Filosofia da Natureza tem por objeto a Ideia na forma de um outro que lhe é exterior – aquilo que é finito e contingente –, a Filosofia do Espírito analisa a Ideia que retorna a si, como liberação da natureza, e permanece junto de si, no seu próprio elemento. Esta Filosofia pode ser do espírito subjetivo, objetivo e absoluto. O espírito subjetivo refere-se às manifestações interiores da alma (Antropologia), aos fenômenos da consciência (Psicologia). O espírito objetivo de um modo geral diz respeito à mente humana e às formas espirituais da sua realização como produtos ou objetivações da atividade espiritual, em oposição à natureza, como mundo da liberdade realizada. O espírito absoluto significa um processo de totalização ou de plenitude que compreende a arte, a religião e a filosofia, formas da sua realização, nas quais ele tem a si mesmo por objeto.]


um conceito é fundamental na organização do pensamento de Hegel – a liberdade. A dinâmica de efetivação da sua realidade consiste num processo (histórico) que retrata o desenvolvimento progressivo do espírito objetivo segundo uma lógica (movimento dialético) que lhe é imanente. Nesse sentido, ele tem a sua objetivação – é espírito objetivo – que supera e, ao mesmo tempo, conserva a sua diferença – o espírito subjetivo. É no âmbito do espírito objetivo que ocorre a investigação filosófica hegeliana no campo do direito, da política e da moral, objeto, sobretudo, da obra Linhas fundamentais da filosofia do direito. Nesta obra, encontra-se uma discussão detalhada da Ideia de liberdade, a qual é vista como princípio do agir humano seja de ordem subjetiva, seja de ordem objetiva, institucional (social, jurídico e político).

O tema da liberdade constitui um dos aspectos essenciais da filoso-fia moderna, presente no Jusnaturalismo e, sobretudo, no Idealismo Alemão em filósofos como Kant, Fichte e Schelling. Hegel reconhece o mérito destes pensadores, pois, erigiram a liberdade como princípio subjetivo do agir e, também, como fundamento da vida política. Contudo, critica-os pelo caráter limitante que a liberdade possui: o seu sentido e alcance se restringe ao indivíduo e à sua associação com os demais, sem compreender o valor intrínseco da universalidade da liberdade na forma da sua realização objetiva e concreta na vida social e política dos homens.


Hegel pretende aprofundar o potencial especulativo do conceito de liberdade compreendendo-a, ainda na trilha do Idealismo Alemão, como Ideia. Mas, trata-se de um conceito que se desenvolve em duas dimensões ou sentidos que se interpenetram: o lógico-conceitual e o histórico- institucional. Dimensões estas que podem, ainda, ser retratadas pelo aspecto subjetivo e objetivo da liberdade. 4

[4 Para esclarecer sua posição quanto à ideia e ao seu idealismo, Hegel retoma a discussão entre Platão e Aristóteles no que diz respeito ao significado que tem a ideia nesses filósofos, tomando o partido de Aristóteles. Defende a tese de que ideia constitui um princípio ativo, aquilo que é verdadeiro: uma efetividade que não se separa de um conteúdo (real) do qual constitui a sua forma, o eidos, a Ideia e no qual se objetiva. Quando Hegel afirma que a Ideia é “a unidade do ideal (Ideellen) e do real (Reellen), do finito e do infinito, da alma e do corpo”, quer apontar, precisamente, para os dois aspectos solidários da ideia e da idealidade do conceito. O momento do conceito se apresenta como aquele em que o ideal, o infinito é a ideia enquanto forma conceitual; e o seu aspecto real, se configura como o finito, o corpo: o Dasein do conceito, enquanto idealidade que possui uma existência empírica, um conteúdo objetivado. O conceito encerra em si, portanto, um ideal que demanda ser efetivado, e a realização efetiva desse ideal é a ideia, a idealidade concreta, o momento superior da unidade da identidade (da identidade do conceito) e da sua diferença (a finitude). A idealidade, enquanto qualidade da ideia, consiste no entrelaçamento da finitização do ideal (conceitual) e da elevação do real em ideal. Por isso, nada mais estranho a Hegel do que conceber a separação e o isolamento desses dois momentos. Nada mais falso do que a representação de um ideal divorciado do real ou de um real apartado do ideal seja no idealismo transcendente de Platão, seja no idealismo transcendental de Kant.]


Do ponto de vista lógico-conceitual, a liberdade se traduz pela estrutura autorreferente da lógica do conceito.5


[ 5 A Ciência da lógica, dividida em dois momentos: a lógica objetiva e a subjetiva, trata de três estruturas lógicas: o ser, a essência e o conceito. Este último diz respeito às determinações que não são deduzidas de um estado cognitivo de quem representa conceitualmente pelo pensamento um objeto, mas determinações conceituais autoproduzidas segundo um desenvolvimento imanente de um sujeito (não empírico ou gramatical) ontológico que abarca ou “compreende” o enunciado e a enunciação, o objeto e a sua apreensão racional, a objetividade e a subjetividade. A lógica do conceito exprime de modo mais incisivo a noção conceitual da ideia, cuja dinâmica se manifesta pela articulação dialética dos seus três momentos: universalidade, particularidade e singularidade. Quando Hegel diz que “no conceito se abriu, por conseguinte, o reino da liberdade” (Wissenschaft der logik, II, Werke 6, p. 125) quer retratar o elemento autorreferente do conceito, assimilando-o ao caráter definidor daquilo que é livre: o estar consigo mesmo ou junto a si.]

Livre é quem permanece no seu próprio elemento, que está “em casa”, junto a si. O aspecto essencial dessa liberdade é a autosuficiência, ou seja, algo (um sujeito lógico) é livre quando permanece nele mesmo, transita no seu próprio âmbito e tem em si mesmo a razão de ser da sua identidade autônoma e não depende de nada senão de si mesmo como algo que espontaneamente se põe como entidade autorreferente, contemplando, assim, o estatuto lógico daquilo que é em-si e para-si. Esse é o sentido da liberdade enquanto realidade conceitual. Nessa medida, ela representa a mais absoluta autorreferencialidade de algo que está junto de si (Beisichselbstsein). Esta é a característica essencial da liberdade que é, também, atribuída ao espírito, uma vez que ela constitui a própria essência do espírito e a sua efetividade (Wirklichkeit)6 – diz Hegel, ao defini-lo como uma singularidade que se manifesta numa relação idêntica a si e, por isso mesmo, livre, tal como é, de forma análoga, aquilo que se define como subjetividade.

[ 6 Sobre o termo efetividade (Wirklichkeit) ver nota 15.]


Esse caráter autorreferencial da liberdade como estar junto de si pode, também, de forma, isomórfica, ser atribuído à liberdade subjetiva dos indivíduos. Desse ponto de vista, o indivíduo para ser livre deve ter nele mesmo a fonte e a razão de ser de seus atos, o que inclui o domínio racional do sujeito como agente consciente de si e de sua ação, que dirige as suas escolhas e que encontra satisfação no seu agir como expressão da sua subjetividade. Ou seja, a presença da liberdade supõe uma condição lógica: a autoposição do sujeito como senhor de si mesmo. Este aspecto da liberdade constitui um pressuposto necessário para que as ações de interferências não sejam invasivas à liberdade do sujeito, tornando-o suscetível a toda sorte de dominação por forças estranhas à sua autonomia.

Hegel se refere ao termo liberdade subjetiva (subjektive Freiheit) em vários sentidos, todos eles indicando a realização da particularidade de um sujeito. A liberdade subjetiva refere-se a um tipo de ação conscientemente escolhida pela livre vontade do indivíduo. Diz respeito à subjetividade da vontade como determinação moral, o que implica a não-dominação daquelas ações que os sujeitos livremente escolhem, opondo-se, assim, às práticas não desejadas que provêm da coerção e da autoridade de terceiros. Diz respeito, ainda, às pretensões pessoais que visam satisfazer os interesses e as necessidades do indivíduo quanto à sua felicidade e aos seus direitos. Mas, a liberdade subjetiva indica, também, aquelas ações que demonstram arbítrio e têm o sentido depreciativo de idiossincrasias contingentes de um sujeito. Na diversidade do seu significado, essa liberdade constitui um fato histórico do mundo moderno. Compreendê- la e assegurá-la significa reconhecê-la como o grande princípio da modernidade, o qual surge como elemento histórico distintivo em relação aos tempos antigos.

Além do caráter autorreferencial, e que envolve a subjetividade do indivíduo, a liberdade compreende, também, o elemento objetivo da sua manifestação. Nessa medida, ela se apresenta como ser-aí (Dasein) ou exteriorização da sua identidade autorreferencial, e que pode ser compreendido como o seu outro. Assim, o desenvolvimento do espírito é o próprio movimento de sua realização, ou seja, da liberdade, cujo registro não é outra coisa senão a objetividade histórica das intervenções humanas.

O aspecto histórico-institucional representa, portanto, o processo histórico (e objetivo) de efetivação da ideia de liberdade. Por isso, Hegel afirma que “a história universal representa a marcha gradual do princípio cujo conteúdo e a consciência da liberdade.”7 Paralelamente, esse processo revela-se como a “exposição” do espírito que alcança, nos tempos modernos, a sua constituição, representada pela realidade institucional do Estado. Nessa medida, Hegel pretende compreender a liberdade não mais como limite ou restrição, confinada à subjetividade das liberdades individuais (livre-arbítrio) conflitantes entre si, mas como o processo de sua plena efetivação como Ideia que abarca o momento subjetivo autorreferente e o objetivo de sua manifestação. Constitui-se, desse modo, a segunda dimensão da liberdade – o aspecto histórico-institucional – que retrata, numa relação de alteridade, o outro da identidade conceitual, precisamente de um outro que lhe é adequado, próprio – o seu outro.


[7 HEGEL, Vorlesungen uber die Philosophie der Geschichte, Werke 12. p. 77]


Para não cair na vacuidade de uma vontade que se reflete a si mesma, a liberdade necessita de um ser-aí, de uma referência que, a despeito de ser externa a si, não lhe é estranha. O homem só pode estar consigo mesmo na objetivação de suas ações e junto com os outros em relações de intersubjetividade. A liberdade do indivíduo retrata (e repõe) a liberdade espiritual do estar junto de si no seu outro, mediante o qual ele permanece em si mesmo; mas, ao mesmo tempo, ele deve efetivar a sua liberdade neste outro que ele reconhece como o seu outro – o aspecto objetivo da liberdade.


Mas, qual é o elemento que permite a passagem do caráter autorreferencial da liberdade (a face subjetiva) para a sua objetivação? O mecanismo que vai permitir que a liberdade possa transitar no seu próprio elemento sem depender de um outro e, ao mesmo tempo, ter para si um conteúdo ou uma referência por uma “outridade”, abandonando, assim, a vacuidade da sua condição abstrata e formal é, justamente, a dialética do reconhecimento. Para que as relações comunitárias possam desempenhar o papel do mútuo reconhecimento, elas necessitam dispor de instituições ético-políticas que possibilitam a mediação de formas positivas de reconhecimento. A família, a sociedade civil-burguesa e o Estado são instituições políticas e sociais – daquilo que Hegel chamou de eticidade ou vida ética (Sittlichkeit).8 É a eticidade que cumpre esse papel, permitindo que a liberdade subjetiva alcance uma realização efetiva, nelas se reconhecendo como o seu outro, uma realidade que não é estranha ao indivíduo e à sua liberdade.

[ 8 A tradução de Sittlichkeit por “eticidade”, “vida ética” ou “moralidade objetiva” não dá conta do significado amplo e profundo que Hegel atribui a esse vocábulo. Esta forma de moralidade social, comunitária, objetiva distingue-se da moral individual, interior e subjetiva, chamada de moralidade (Moralität), objeto da segunda parte das Linhas fundamentais da filosofia do direito. Na figura da pessoa do direito abstrato, e que Hegel desenvolve na primeira parte desta obra, a liberdade se apresentou como ser-aí imediato da liberdade. Na moralidade, ela se determinou como bem de uma subjetividade ou como “reflexão da autoconsciência”. Essa universalidade interiorizada do bem não deve permanecer abstratamente encerrada em-si, mas se efetivar na realidade objetiva. Configura-se, então, o terceiro momento da Ideia de liberdade que possui tanto a determinação da totalidade substancial, como a da subjetividade singular, o qual será desenvolvido na terceira parte da Filosofia do Direito, denominada de eticidade.]

O direito, as instituições políticas e sociais da eticidade são realizações comunitárias que trazem o sinal da sua própria razão de ser: instaurar e assegurar a liberdade que não se reduz à sua dimensão meramente individual e subjetiva A novidade que Hegel apresenta à filosofia social (ético-política) do seu tempo consiste em compreender a sociedade moderna na articulação de três esferas no processo de efetivação da Ideia de liberdade: a) a esfera da família, lugar da intimidade efetiva da vida imediata privada dos indivíduos; b) um segundo momento, ainda privado, a esfera da liberdade subjetiva da particularidade, da vida econômica e do trabalho dos indivíduos (burgueses) na sociedade civil; e c) a esfera superior da universalidade do Estado que encerra em si o monopólio político da vida pública dos cidadãos, momento não só distinto e superior aos dois primeiros, como também, fim último e razão de ser deles.

São estas instituições que efetivam a Ideia de liberdade, dandolhe a dimensão de uma realidade objetiva. Por isso, Hegel identifica a liberdade nessa esfera como o “reino da liberdade efetivada, o mundo do espírito produzido a partir do próprio espírito como uma segunda natureza.”9 O lado objetivo diz respeito ao mundo social destas instituições e das práticas sociais e intersubjetivas que operam no sentido de desenvolver e manter a liberdade subjetiva, a qual só adquire sentido e estabilidade na objetivação da liberdade, cuja consistência, por sua vez, depende da ação (política e moral) dos sujeitos. Uma ordem social livre é suficientemente forte e estável para assegurar e ampliar a liberdade subjetiva apenas se os cidadãos são membros de instituições que os amparam com objetivos, valores e convicções éticas e políticas.

A família constitui o agrupamento social imediato que inaugura a arquitetônica da vida ética da Filosofia do Direito. Nela, os indivíduos demonstram uma forma de reconhecimento segundo a unidade ética da intimidade familiar, na qual os membros participam de um agrupamento imediato, íntimo, próprio da identidade afetiva, e mediante a qual indivíduos se reconhecem vinculados pelo sentimento e pelo amor. O elemento autorreferencial da liberdade desloca-se para a intimidade da comunidade da família, onde o indivíduo está efetivamente no seu próprio elemento, permanecendo em si mesmo na privacidade do grupo familiar.


[9 HEGEL, G.W.F. Grundlinien der Philosophie des Rechts oder Naturrecht und Staatswissenschaft im Grundrisse, [Lineamentos da Filosofia do Direito ou Direito Natural e Ciência do Estado em Compêndio] Werke 7, eds. E. Moldenhauer e K. M. Michel, Frankfurt am Main: Suhrkamp Verlag, 1975, § 4. Desse ponto de vista, é possível compreender a tese hegeliana de que a “Ideia do direito é a liberdade e para apreendê-la verdadeiramente é preciso conhecê-la no seu conceito e no seu ser-aí (Dasein)” (idem, § 1, adendo).]

A sociedade civil (burgerliche Gesellschaft)10 representa o momento em que o princípio da liberdade subjetiva e o interesse da particularidade se manifestam. Os indivíduos estão unidos segundo uma universalidade formal que revela a integração recíproca dos seus interesses e necessidades mediada pelas relações dos indivíduos uns com os outros. São relações sociais (civis) porque vinculam os homens numa sociabilidade interdependente, marcada pelas necessidades recíprocas que o trabalho de todos pretende suprir. Mas, eles não estão isolados, pois, satisfazem as suas necessidades em relações sociais que eles mantém entre si. Cada um reconhece no outro um meio para a realização das necessidades individuais e comunitárias. São relações sociais que retratam uma forma de reconhecimento social, ainda que permeada pela disputa, pelo conflito e pela mútua-dependência. Mas, é uma forma de reconhecimento que revela o jogo das necessidades recíprocas que os sujeitos necessitam e manifestam.


Para Hegel, a sociedade civil não possui a medida da universalidade, apesar dela demonstrar a dinâmica da liberdade individual no âmbito de relações sociais intersubjetivas. Submetida às regras de uma lógica da particularidade, ela se repõe a si própria num processo de constante reposição (a “má infinitude”) que pode desencadear, se abandonada a si própria, a sua autodestruição. Urge, então, realizar uma forma superior de eticidade para amparar e efetivar a própria liberdade subjetiva. Para além da esfera da particularidade, Hegel reivindica o espaço éticopolítico do Estado para superar as contradições e limitações da sociedade civil. Nele, o mútuo reconhecimento de seus membros é realizado sob a forma da autoconsciência coletiva que retrata uma sociabilidade comunitária mais elevada e superior, momento em que a liberdade se efetiva objetivamente.

[ 10 A sociedade civil em Hegel indica não apenas o caráter civil do segundo momento da eticidade. Significa, também, o caráter burguês dessa sociedade segundo a sua forma de organização social e econômica. O termo alemão Burger denota tanto o civil como o burguês, mas Hegel consagra essa expressão para o membro da sociedade civil (bourgeois), e não para o citoyen membro da sociedade política. Hegel se afasta da tradição da filosofia política do jusnaturalismo e passa dispensar atenção à economia política inglesa, à revolução econômica industrial e à valorização da categoria do trabalho. A sociedade civil deixa de ser a comunidade política (societas civilis) e passa a ser o lócus da sociabilidade dos indivíduos burgueses associados segundo interesses particulares, mediados pelo princípio da liberdade subjetiva.]

A Filosofia do Direito define o Estado como a “efetividade (Wirklichkeit) da liberdade concreta”11, a etapa derradeira no desenvolvimento progressivo da Ideia de liberdade.12 Sem o Estado, o indivíduo, meramente determinado na sua particularidade como membro da sociedade civil, se dissipa no arbítrio do princípio autorreferente da liberdade subjetiva. O Estado constitui uma forma mais plena de reconhecimento que solidifica o senso de união comunitária de participação, e de autoidentidade compartilhada, fundamento da vida política.


Concluindo, pode-se dizer que a filosofia política hegeliana admite o princípio liberal da liberdade dos indivíduos, denominada por Hegel de liberdade subjetiva, a qual opera como um dos elementos essenciais do Estado moderno, sobretudo, na esfera da sociedade civil. Contudo, à pretensão da ideia liberal de ênfase ao exclusivismo autorreferente da liberdade subjetiva, e, consequentemente, a instrumentalização do Estado aos interesses e direitos individuais, Hegel retoma na modernidade o conceito aristotélico da prioridade do Estado, da supremacia do bem comum como uma exigência teórica e prática, apreendida na noção irrenunciável e evidente de que os fins da comunidade são superiores aos fins dos membros individualmente considerados.13

[11 HEGEL, Grundlinien der Philosophie des Rechts, op. cit., § 260. 12 O hegelianismo político foi interpretado como a filosofia que diviniza, em diversos matizes, o Estado: ora como glorificação do regime político prussiano (H. Heller, F. Rosenzweig, T. Litt, J. Dewey, L.T. Hobhouse, S. Hook, J. Plamenatz), ora como ideólogo do Estado fechado e totalitário inimigo da sociedade aberta das democracias ocidentais (K. Popper), ora como inspirador da ideologia de um poder mistificador e salvador (E. Topitsch), ora como mentor do mito do Estado forte (E. Cassirer). Apesar da suspeita que estes críticos levantam contra o hegelianismo político, a filosofia política de Hegel não faz a apologia do estatismo, negando a liberdade dos indivíduos, mesmo quando enfatiza o caráter da necessidade racional do Estado na constituição das formas modernas de uma sociabilidade ético-política. A reação contra essa interpretação ocorreu precisamente a partir do resgate do princípio da liberdade individual na filosofia hegeliana como expressão da modernidade O filósofo passou a ser visto como pensador da moderna sociedade politicamente organizada segundo os elementos do Estado de direito, e próximo de algumas teses do liberalismo. Estudos mais recentes da obra de Hegel demonstraram a improcedência das acusações de que o filósofo nega a liberdade individual e os direitos da pessoa. Essa interpretação manifestou-se na França (E. Weil, E. Fleischmann, J. D’Hondt, F. Grégoire, J-C. Pinson, G. Planty-Bonjour H. Denis, B. Bourgeois J-F Kervégan), na Inglaterra e nos Estados Unidos da América (T.M. Knox, J.N. Findlay, W. Kaufmann, Z. Pelczynski, S. Avineri, C. Taylor, S. Smith, A. Wood, A. Patten. R. Williams, R. Pippin, M. Forster, T. Pinkard,), na Itália (D. Losurdo), na Alemanha (J. Ritter, G. Rohrmoser. R. Maurer, O. Marquard, K-H Ilting, A. Honneth, H. Lubbe, D. Henrich e H-F. Fulda, M. Theunissen).]

[13 A intenção especulativa de Hegel, presente nos seus escritos da maturidade, não induz ao abandono do antigo princípio da Polis grega da prevalência da totalidade ética que o Estado representa. Significa, antes, uma tentativa de conciliação deste princípio com o da liberdade subjetiva da modernidade.]

A filosofia de Hegel constitui, assim, exemplo de um grandioso e radical investimento especulativo, qualificado como Ideia de liberdade. Ao mesmo tempo em que tem a pretensão de analisar a liberdade segundo um modo conceitual (lógico-ontológico) quer, também, compreendê- la como uma forma histórica de sua manifestação. Ou, dito de outro modo, sem abandonar o seu caráter autorreferencial (subjetivo), o filósofo pretende efetivá-la na sua necessária forma institucional (objetiva). Com essa dupla tarefa, Hegel se afasta do caráter autorreferente e limitativo da liberdade, incorporando-a num processo coletivo ou universal da sua realização que supera e, ao mesmo tempo, conserva14 os fins privados da liberdade individual de uma forma mais efetiva e consistente. Se a liberdade subjetiva não alcançar essa dimensão, e se circunscrever no âmbito dos interesses e desejos particulares dos indivíduos nas suas relações privadas, o próprio princípio da liberdade se vê ameaçado. A sustentação dessa liberdade é possível apenas numa lógica de mediação social em que a liberdade se realiza pela dialética do reconhecimento.


[14 Superação e conservação no sentido em que, hegelianamente, é empregado o termo Aufhebung (cf. nota n. 17 )]

Sugestões de Leitura PrinciPais obras de hegel Publicadas em língua Portuguesa


HEGEL, G. W. F. Fenomenologia do espírito. Tradução de Paulo Meneses. Petrópolis, Vozes, 2002.


HEGEL, G. W. F. A fenomenologia do espírito. Tradução de Henrique C. de Lima Vaz. São Paulo: Abril Cultural, 1974. (Coleção Os Pensadores). Indicação principalmente do Prefácio, introdução e do primeiro e segundo capítulos.

HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das ciências filosóficas em compêndio: A ciência da lógica. Tradução de Paulo Meneses com a colaboração de José Machado. São Paulo: Loyola, 1995-1997. v.1.

HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das ciências filosóficas em compêndio: Filosofia da natureza. Tradução de Paulo Meneses com a colaboração de José Machado. São Paulo: Loyola, 1995-1997. v.2.


HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das ciências filosóficas em compêndio: Filosofia do espírito. Tradução de Paulo Meneses com a colaboração de José Machado. São Paulo: Loyola, 1995-1997. v.3.

HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das ciências filosóficas em epítome. Tradução de Artur Morão, Lisboa: Edições 70, 1989. HEGEL, G. W. F. Princípios da filosofia do direito. Tradução de Orlando Vitorino. São Paulo: Martins Fontes, 2000.


HEGEL, G. W. F. Princípios da filosofia do direito. Tradução de Norberto de Paula Lima. São Paulo: Ícone, 1997. HEGEL, G. W. F. Linhas fundamentais da filosofia do direito ou direito natural e ciência do estado no traçado fundamental. Tradução de Marcos Lutz Muller. Inédito.


HEGEL, G. W. f. O Direito Abstrato. Tradução de Marcos Lutz Muller. Clássicos da filosofia: Cadernos de Tradução [IFCH/UNICAMP], Campinas, n. 5, set. 2003.

HEGEL, G. W. F. Introdução à Filosofia do Direito. Tradução de Marcos Lutz Muller. Clássicos da filosofia: cadernos de Tradução [IFCH/UNICAMP], Campinas, n. 10, ago. 2005.


HEGEL, G. W. F. Estética. O Ideia e o ideal, O belo artístico e o ideal. Tradução de Orlando Vitorino. São Paulo: Abril Cultural, 1974. (Coleção Os Pensadores).

HEGEL, G. W. F. História da filosofia: Introdução. Tradução de Antônio Pinto de Carvalho. São Paulo: Abril Cultural, 1974. (Coleção Os Pensadores).


HEGEL, G. W. F. Cursos de estética. Tradução de Marco Aurélio Werle e Oliver Tolle. São Paulo: Edusp, 1999-2000. 2 v.

HEGEL, G. W. F. A Razão na história: introdução à filosofia da história universal. Tradução de Artur Mourão. Lisboa: Edições 70, 1995. HEGEL, G. W. F. O Sistema da vida ética. Tradução de Artur Mourão. Lisboa: Edições 70, 1991.


HEGEL, G. W. F. Propedêutica filosófica. Tradução de Artur Mourão. Lisboa: Edições 70, 1989. HEGEL, G. W. F. Filosofia da história. Tradução de Maria Rodrigues e Hans Harden, Brasília: UNB, 1995.


obras sobre hegel


ARANTES, P. Hegel: a ordem do tempo. São Paulo: Polis, 1981. BOBBIO, N. Estudos sobre Hegel. São Paulo: Unesp, 1989.


HÖSLE, V. O Sistema de Hegel. São Paulo: Loyola, 2007. INWOOD, M. Dicionário Hegel. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.

KERVÉGAN, J-F. Hegel e o hegelianismo, São Paulo: Loyola, 2008. PLANT, R. Hegel. São Paulo: Unesp, 2000.

RAMOS, C. A. Liberdade subjetiva e estado na filosofia política de Hegel. Curitiba: Editora da UFPR, 2000.

ROSENFIELD, D. Hegel. Rio de Janeiro: Zahar, 2002. ROSENFIELD, D. (Org.) Hegel, a moralidade e a religião. Rio de Janeiro: Zahar, 2002.

ROSENZWEIG, F. Hegel e o Estado. São Paulo: Perspectiva, 2008. SINGER, P. Hegel. São Paulo: Loyola, 2003. TAYLOR, C. Hegel e a sociedade moderna. São Paulo: Loyola, 2005.

WEBER, T. Hegel: liberdade, Estado e história. Petrópolis: Vozes, 1993.


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Hegel e o caráter ético-político da idéia de liberdade.
Excertos e parágrafos traduzidos1
HEGEL, Friedrich. Hegel e o caráter ético-político da idéia de liberdade. in MARÇAL, Jairo (org.). Antologia de textos filosóficos. Curitiba: SEED/PR, 2009. pp. 299-337. Texto de apresentação e notas: RAMOS, Cesar A. Tradução do alemão e notas: Cesar A. Ramos e MULLER, Marcos Lutz


O sentido especulativo da Ideia como princípio para o idealismo filosófico e a sua conexão com o conceito dinâmico de totalidade


“Quando se fala de ideia, não se quer representar com isso algo de distante e situado num além. A Ideia é, antes, aquilo que está absolutamente presente” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, I, Werke 8, § 213, ad.).


[1 A tradução dos parágrafos, anotações e adendos das Linhas fundamentais de filosofia do direito é de Marcos Lutz MULLER, extraída das seguintes partes já publicadas: HEGEL, G. W. f. O Direito Abstrato. Tradução de Marcos Lutz Muller. Clássicos da filosofia: Cadernos de Tradução [IFCH/UNICAMP], Campinas, n. 5, set. 2003; HEGEL, G. W. F. Introdução à Filosofia do Direito. Tradução de Marcos Lutz Muller. Clássicos da filosofia: cadernos de tradução[IFCH/UNICAMP], Campinas, n. 10, ago. 2005; HEGEL, G. W. F. A Sociedade Civil. Tradução de Marcos Lutz Muller. Clássicos da filosofia: cadernos de tradução[IFCH/UNICAMP],Campinas, n. 10, ago. 2005. Também foi utilizada a versão on line da tradução das Linhas fundamentais da filosofia do direito, disponibilizada pelo tradutor. Nos demais parágrafos e excertos das outras obras, a tradução é de nossa autoria com base nas obras completas: HEGEL, G. W. F. Werke in zwangig Bänden. edição de Eva Moldenhauer e Karl M. Michel, Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1970-1986. 20 v. Os subtítulos intercalados nos textos traduzidos não constam do original. São informações que têm por objetivo sugerir ao leitor o sentido geral das passagens citadas.]


“Essa idealidade do finito é a proposição capital da filosofia, e toda verdadeira filosofia é, por esta razão, um idealismo” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, I, Werke 8, § 95, adendo).

“A ideia é o verdadeiro em-si e para-si, a unidade absoluta do conceito e da objetividade. Seu conteúdo ideal (ideeler Inhalt) não é outra coisa senão o conceito em suas determinações; seu conteúdo real é apenas a exposição do conceito que ele se dá na forma de um ser-aí (Dasein) exterior, e esta figura (Gestalt) está incluída na sua idealidade, em seu poder, e, desse modo, o conceito se conserva na ideia” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, I, Werke 8, § 213).


“É preciso, com efeito, não conceber o idealismo de Platão como um idealismo subjetivo, como aquele mau idealismo que, sem dúvida, se apresenta nos tempos modernos, como se o homem não fosse capaz de aprender nada nem fosse determinado exteriormente, e que todas as representações são emanadas do sujeito. Afirma-se com frequência que o idealismo consiste em que o indivíduo estabeleça a partir de si mesmo todas as suas representações, inclusive as mais imediatas. Porém isto é uma noção anti-histórica e completamente falsa; se esta tosca representação define o idealismo, podemos dizer que nenhum filósofo foi, em verdade, idealista, e tampouco o idealismo platônico tem a ver com esta forma” (Vorlesungen uber die Geschichte der Philosophie, II, Werke 19, p. 54-55).

“É justamente nesta posição da filosofia em relação à efetividade que se encontram mal-entendidos [...]

O que é racional, é efetivo;

E o que é efetivo, é racional.

Nesta convicção está toda consciência desprevenida, bem como a filosofia, e é daqui que esta parte para a consideração tanto do universo espiritual quanto do natural. Se a reflexão, o sentimento ou seja qual for a figura que a consciência subjetiva tenha, olha para o presente como uma coisa vã, se está além dele e sabe tudo melhor, então ela encontra-se no que é vão, e porque só tem efetividade no presente, ela mesma é, assim, somente vaidade. Se, ao invés, a ideia é tida por aquilo que, assim, é só uma ideia, uma representação num opinar, a filosofia, ao contrário, garante a intelecção de que nada é efetivo a não ser a Ideia. O que então importa, então, é reconhecer na aparência do temporal e do transitório a substância que é imanente, e o eterno que é presente. Com efeito, o racional, que é sinônimo da ideia, quando ele entra em sua efetividade simultaneamente na existência externa, emerge numa riqueza infinita de formas, fenômenos e configurações, e reveste o seu núcleo com uma casca multicolor, na qual a consciência inicialmente se instala, e que só o conceito transpassa, para encontrar o pulso interno e sentir igualmente o seu batimento nas configurações externas” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, prefácio, p. 24, 25).

“É tarefa da filosofia conceber o que é, pois, aquilo que é é a razão. No que concerne ao indivíduo, cada um é, de todo modo, um filho do seu tempo; do mesmo modo que a filosofia é seu tempo apreendido em pensamentos.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, prefácio, p. 26).


“Os membros de um organismo têm, de igual modo, realidade exterior, mas o conceito é a sua própria essência inerente, o qual não lhe imprime exteriormente uma forma unificadora, mas constitui, por si só, sua existência. Por isso, os membros de um organismo possuem uma realidade que não é aquela das pedras de um edifício ou das plantas, das luas, ou dos cometas no sistema planetário, mas uma existência interna do organismo idealmente posta pela ideia, inerente ao organismo, e desvinculada de toda a realidade. Uma mão amputada, por exemplo, perde sua existência independente, ela não mantém mais, como no organismo, sua vivacidade, seus movimentos, seu aspecto, sua forma etc., mudam; ela sofre até mesmo a decomposição e toda sua existência se desvanece. Ela só pode existir como membro do organismo, ela só é real quando está integrada na unidade posta pela Ideia” (Vorlesungen uber die Äslhetik, I, Werke 13, Enter Teil, p. 163-164).

“O verdadeiro é o todo. Mas o todo é somente a essência que alcança a sua completude mediante o seu desenvolvimento. Sobre o absoluto deve-se dizer que ele é essencialmente resultado; que somente no fim ele é o que é em verdade; e é nisto que consiste propriamente a sua natureza, de ser efetividade, sujeito ou desenvolvimento de si mesmo.” (Phänomenologie des Geistes, Werke 3, prefácio, p. 24).

“Segundo o meu modo de ver – que será justificada apenas na apresentação [Darstellung] do próprio sistema –, tudo depende disso: apreender e exprimir o verdadeiro não como substância, mas também, precisamente, como sujeito.” (Phänomenologie des Geistes, Werke 3, prefácio, p. 22- 23).


“O princípio motor do conceito, enquanto ele não só dissolve as particularizações do universal, mas, também, enquanto as produz, eu chamo de dialética, – dialética, portanto, não no sentido de que ela dissolve, confunde e conduz daqui para lá e de lá para cá um ob-jeto, uma proposição, dados ao sentimento, à consciência imediata em geral, e só tem a ver com a derivação do seu contrário – uma modalidade negativa de dialética, tal como ela frequentemente aparece também em Platão... A dialética superior do conceito não consiste em produzir e apreender a determinação meramente como barreira e como contrário, mas, sim, em produzir e apreender a partir dela o conteúdo e o resultado positivos, enquanto por essa via, unicamente, a dialética é desenvolvimento e progredir imanente. Esta dialética não é, pois, um fazer externo de um pensar subjetivo, mas a alma própria do conteúdo, que organicamente faz brotar os seus ramos e os seus frutos. Para este desenvolvimento da ideia, enquanto atividade própria da sua razão, o pensar enquanto subjetivo apenas olha, sem adicionar ingrediente algum de sua parte. Considerar algo racionalmente não significa acrescentar de fora uma razão ao ob-jeto e, por este intermédio, elaborá-lo, senão que o ob-jeto é por si racional; aqui é o espírito na sua liberdade, o ápice da razão autoconsciente, que se dá efetividade e se gera como mundo existente; a ciência tem somente a tarefa de trazer à consciência esse trabalho próprio da razão da coisa.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7 § 31, anotação).

A Liberdade como essência do Espírito e a estrutura autorreferencial da liberdade como estar junto de si


“Como a substância da matéria é o peso, assim devemos dizer que a liberdade é a substância, a essência do espírito. Qualquer um tem um conhecimento imediato de que a liberdade, dentre outras características, pertence ao espírito. A filosofia, no entanto, nos ensina que todas as características do espírito só existem por meio da liberdade, todas elas são apenas meios para a liberdade, todas a procuram e a produzem. Que a liberdade seja a única verdade do espírito, isso é um conhecimento da filosofia especulativa... A matéria tem a sua substância fora de si, o espírito é o estar junto de si mesmo (Bei-sich-selbst-Sein). E isso é, precisamente, a liberdade, pois, quando sou dependente, então relaciono-me com um outro que não sou eu; eu não posso ser sem um exterior; eu sou livre quando estou junto a mim. Este estar junto de si mesmo do espírito é autoconsciência, a consciência de si próprio.” (Vorlesungen uber die Philosophie der Geschichte, Werke 12, p. 30).

“Formalmente, a essência do Espírito é, por conseguinte, a liberdade, a absoluta negatividade do conceito enquanto identidade consigo mesmo. Segundo essa determinação formal, ele pode abstrair-se de toda exterioridade e de sua própria exterioridade, do seu próprio ser-aí (Dasein), pode suportar a negação de sua imediatidade individual, sua dor infinita; isto é, nessa negatividade pode manter-se afirmativo e ser idêntico a si mesmo. Essa possibilidade é sua universalidade abstrata em si, sendo para si mesmo” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, III, Werke 10, § 382).


“A substância do espírito é a liberdade, isto é, não ser dependente de um outro, e referir-se a si mesmo. O espírito é ser para si, tem a si mesmo por ob-jeto (Gegenstand) como conceito efetivamente realizado. Nessa unidade, presente nele, do conceito e da objetividade consiste, ao mesmo tempo, sua verdade e sua liberdade.” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, III, Werke 10, § 382, adendo).

“Somente nessa liberdade a vontade está pura e simplesmente junto de si, porque ela não se relaciona a nada que não seja ela mesma, com o que, assim, desaparece dela toda relação de dependência de alguma outra coisa. Ela é verdadeira, ou melhor, ela é a própria verdade, porque seu determinar consiste em que ela seja no seu ser-aí, isto é, enquanto estando defronte a si mesma, aquilo que o seu conceito é, ou, noutros termos, porque o puro conceito tem a intuição de si mesmo por seu fim e por sua realidade.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 23).

“A liberdade está apenas lá onde não há para mim nenhum outro que não seja eu mesmo. O homem natural, determinado apenas por suas pulsões, não está junto de si: por mais caprichoso que seja, o conteúdo do seu querer e da sua intenção não é, contudo, seu próprio conteúdo, e a sua liberdade é apenas formal” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, I, Werke 8, § 23, adendo 2).

A estrutura autorreferencial da liberdade como estar junto a si no seu outro

“A liberdade do espírito, porém, não é simplesmente estar fora do outro, mas uma independência do outro conquistada junto com o outro, não chega à efetividade (Wirklichkeit)2 pela fuga perante o outro, mas pelo predomínio sobre ele. O espírito pode sair de sua universalidade abstrata que é para si, de sua relação simples para consigo mesmo; pode pôr em si mesmo uma diferença efetiva determinada, um outro como é o eu simples, portanto, um negativo: e essa relação com o outro não é simplesmente possível para o espírito, mas necessária, porque ele, mediante o outro e mediante a suspensão (Aufhebung)3 deste, chega a se afirmar como aquilo que deve ser de fato segundo o seu conceito, a saber, a idealidade do exterior, a ideia que a si retorna em seu ser-outro, ou, exprimindo de modo mais abstrato, o universal que se diferencia a si mesmo, e, na sua diferença existe em si e para si. O outro, o negativo, a contradição, a cisão pertencem assim à natureza do espírito. Nessa cisão reside a possibilidade da dor... Mesmo nessa sua cisão extrema, nesse arrancar-se pela raiz de sua natureza ética que é em si, nessa mais completa contradição consigo mesmo, o espírito permanece, pois, idêntico a si mesmo e, portanto, livre” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, III, Werke 10, § 382, adendo).


[2 A expressão Wirklichkeit, que Hegel emprega frequentemente nos seus escritos, é traduzida por “efetividade”, e está ligada ao verbo wirken que significa ser ativo, efetivar. A efetividade se distingue daquilo que simplesmente existe como mera realidade (Realität) contingente, que está aí, e que depende de outras categorias lógicas para afirmação da sua consistência ontológica. Já a efetividade tem poder de autoefetivação em direção à sua idealidade, momento em que algo torna-se efetivo segundo um conjunto de determinações que constituem a sua realidade (efetiva) de forma plena e acabada. 3 O substantivo Aufhebung e o verbo aufheben, amplamente empregados na filosofia hegeliana, têm um significado filosófico próprio. Na ausência de vocábulos na língua portuguesa que possam dar conta do sentido que estas expressões têm na língua alemã, e que são utilizados de uma forma original por Hegel nos seus textos, os tradutores optam por termos linguísticos alternativos nem sempre fiéis ao vocábulo original. Assim, Aufhebung é traduzido ora por “supressão”, ora por “superação”, ora por “suprassunção” e outros. Optamos pela solução proposta por Marcos L. Muller, na sua tradução para o português das Linhas fundamentais da filosofia do direito. Segundo Muller, Aufheben é um termo polissêmico e tem três sentidos principais: 1) elevar; levantar(-se), erguer(-se); 2) suprimir, pôr fim, anular, abolir, abrogar, revogar, cancelar; compensar-se; 3) guardar, conservar, guardar e entregar em custódia.. Ainda segundo Muller, “dentro do espírito hegeliano de encontrar nos termos da linguagem corrente o seu potencial semântico especulativo..., a palavra da língua portuguesa usual que, analogamente, melhor reproduz o tríplice sentido especulativo do auheben é suspender. Além do significado de pendurar, aqui não pertinente, suspender adquire em alguns contextos o significado de erguer, levantar, noutros, o de cancelar, anular, fazer cessar, e no sentido químico, remete também ao significado de conservar, como no caso de uma mistura líquida de dois elementos de densidade diferente e que se repelem, em que o menos denso se separa e flutua na solução líquida, dizendo-se que ele se suspende. A suspensão do azeite na água, por exemplo, remete, no caso, tanto à elevação quanto à conservação do elemento denso menos composto... Como em muitos contextos de ocorrência de aufheben o sentido negativo é o predominante, senão, às vezes, o exclusivo, utilizar-se-á, neste caso, suprimir, e nos contextos em que a plena polissemia é evocada, suspender.” (MULLER, M.L. Introdução à Filosofia do Direito. Clássicos da Filosofia: Cadernos de Tradução[IFCH/UNICAMP], Campinas, n. 9, 2003, nota 25, p. 89-90).]


“Assim, o espírito está inteiramente junto de si e, portanto, livre, pois a liberdade consiste justamente em estar junto de si mesmo no seu outro, em depender de si, em ser a atividade determinante de si mesmo. Em todas as pulsões eu parto de um outro, de algo que é para mim exterior. Aqui, nós falamos então de dependência.” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, I, Werke 8, § 23, adendo 2).

“Somente assim se realiza a verdadeira liberdade; pois, uma vez que ela consiste na minha identidade com o outro, então, eu somente sou verdadeiramente livre quando o outro é, também, livre e é reconhecido por mim como livre.” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, III, Werke 10, § 431, adendo).

“[...] a comunidade da pessoa com o outro deve essencialmente ser considerada não como uma limitação da verdadeira liberdade do indivíduo, mas como o seu prolongamento [...] Se a comunidade dos seres racionais fosse essencialmente a limitação da verdadeira liberdade, ela seria em si e para si a suprema tirania.” (Differenz des Fichteschen und Schllingschen Systems der Philosophie – 1801. In: Hegel Jenaer Schriften. 1801-1807, Werke 2, p. 82). “O universal é, por conseguinte, a potência livre (freie Macht); ele é ele mesmo e sobre-agarra (greift uber) seu outro, não como algo de violento, mas antes, nesse mesmo ”outro”, está em repouso e no seu próprio elemento” (Wissenschaft der Logik, Werke 6, p. 277).


A liberdade da vontade, os seus elementos conceituais (universalidade, particularidade e singularidade) e a liberdade subjetiva


“A melhor maneira de explicar-se a liberdade da vontade é por uma referência à natureza física. É que a liberdade é uma determinação fundamental da vontade, do mesmo modo como o ser-pesado o é dos corpos. Quando se diz que a matéria é pesada, poder-se-ia crer que esse predicado seja apenas acidental; ele, porém, não o é, pois a matéria nada é sem peso; esta é, antes, o próprio ser-pesado. O ser-pesado constitui e corpo e é o corpo. O mesmo se passa com a liberdade e com a vontade, pois o [ser] livre é a vontade. Vontade sem liberdade é uma palavra vazia, assim como a liberdade só é efetiva enquanto vontade, enquanto sujeito.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 4, adendo).


“O que chamamos propriamente de vontade contém os dois momentos precedentes [universalidade abstrata e particularidade] dentro de si. O eu é, enquanto tal, antes de tudo, atividade pura, o universal que está junto de si (bei sich); mas este universal determina-se e, nesta medida ele não está mais junto de si, mas põe-se como um outro e cessa de ser universal. O terceiro momento consiste em que o eu na sua restrição, nesse outro, está junto de si mesmo, e, ao se determinar, permanece junto de si e não cessa de reter firmemente o universal: este é, então, o conceito concreto da liberdade, ao passo que os dois momentos precedentes foram havidos como abstratos e unilaterais. Já temos esta liberdade na forma do sentimento, por exemplo, na amizade e no amor. Neles não se está mais unilateralmente dentro de si, mas cada um [dos relatos] se restringe, de bom grado, em relação a um outro e sabe-se como si mesmo nessa restrição. Na determinidade o homem não deve sentir-se determinado, mas ao considerar o outro enquanto outro, ele somente nisso tem o sentimento próprio de si. A liberdade não reside, portanto, nem na indeterminidade, nem na determinidade, senão que ela é ambas. A vontade que se restringe apenas a um isto é própria do teimoso, que presume não ser livre se ele não tem esta vontade. A vontade, contudo, não está ligada a um conteúdo restrito, mas tem de ir mais além, pois a natureza da vontade não é esta unilateralidade e esta vinculação, ao contrário, a liberdade consiste em querer algo determinado, porém, nessa determinidade, em estar junto de si e retornar novamente ao universal.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 7, adendo).


“O fato de que este momento da particularidade do agente está contido e seja plenamente realizado na ação constitui a liberdade subjetiva em sua determinação mais concreta, o direito do sujeito de encontrar sua satisfação na ação.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 121).


“A pergunta pela autodeterminação da vontade, bem como seus móbeis e seus propósitos, sobrevém no campo moral. O valor do homem é apreciado pela sua ação interior; o ponto de vista moral é, portanto, a liberdade sendo para si.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 106, adendo).

“A vontade, que é vontade apenas segundo o conceito, é livre em si, mas também, ao mesmo tempo, não-livre, pois ela só seria verdadeiramente livre enquanto conteúdo verdadeiramente determinado; então ela é livre para si, tem a liberdade por objeto, é a liberdade. O que é somente segundo o seu conceito, o que é meramente em si, é só imediato, só natural. Isso é também notório na representação. A criança é homem em si, tem a razão só em si, é só possibilidade de razão e da liberdade, e, assim, é livre somente segundo o conceito. Mas o que é somente em si, não está em sua efetividade. O homem que é racional em si tem que, pela produção de si mesmo, trabalhar-se plenamente saindo de si, mas, igualmente, cultivando-se interiormente, a fim de que ele seja racional também para si.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 10, adendo).

“Como ser vivo o homem pode certamente ser subjugado, isto é, o seu lado físico e qualquer lado exterior seu pode ser submetido à violência de outros, porém a vontade livre não pode, em si e por si, ser coagida (§ 5), a não ser na medida em que ela não se retira a si mesma da exterioridade na qual ela é retida, ou da representação desta (§ 7). Somente pode ser coagido a algo aquele que quer se deixar coagir.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 91).

A liberdade subjetiva como princípio do mundo moderno e a sua presença na sociedade civil


“Constitui uma grande obstinação que honra ao homem, a de não querer reconhecer na sua disposição de ânimo nada que não tenha sido justificado pelo pensamento. Esta obstinação constitui o traço característico dos Novos Tempos e, ademais, o princípio próprio do protestantismo.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, prefácio, p. 27 ).

“Kant foi quem começou a fundar o direito sobre a liberdade. Também Fichte faz da liberdade princípio no seu direito natural; porém, é a liberdade sob a forma do indivíduo singular, como em Rousseau” (Vorlesungen uber die Geschichte der Philosophie, III, Werke 20, p. 413).

“Essa liberdade subjetiva ou moral é, principalmente, aquela se chama de liberdade, no sentido europeu. Em virtude do direito dessa liberdade, o homem deve possuir, propriamente, um conhecimento da diferença entre o bem e o mal em geral; as determinações éticas bem como as religiosas, não devem ser seguidas por ele apenas como leis e prescrições exteriores de uma autoridade, mas devem, também, ter em seu coração disposição, consciência, discernimento etc., o seu consentimento, reconhecimento ou mesmo sua fundamentação. A subjetividade da vontade tem nela mesma seu próprio fim, momento absolutamente essencial.” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, III, Werke 10, § 503, anotação).

“Este princípio de liberdade subjetiva surge posteriormente; é o princípio da época moderna desenvolvida, que aparece também no mundo grego, mas como princípio de corrupção do Estado grego... Nos estados modernos rege a liberdade de consciência que cada indivíduo pode exigir para poder dedicar-se aos seus interesses.” (Vorlesungen uber die Geschichte der Philosophie II, Werke 19, p. 114).

“O direito da particularidade do sujeito de encontrar sua satisfação ou, o que é o mesmo, o direito da liberdade subjetiva constitui o ponto de inflexão e central na diferença entre a Antiguidade e a época moderna.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7 § 124, anotação).


“Já faz bem um milênio e meio que a liberdade da pessoa começou a florescer graças ao cristianismo e se tornou princípio universal entre uma parte, de resto pequena, do gênero humano. Mas só ontem, por assim dizer, a liberdade da propriedade foi reconhecida como princípio, aqui e ali.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7 § 62, anotação).


“O desenvolvimento subsistente por si da particularidade (cf. § 124 Anot.) mostra-se, nos Estado antigos, como o momento em que irrompe a corrupção dos costumes e como o fundamento último do declínio destes. Esses Estados, construídos seja sobre o princípio patriarcal e religioso, seja sobre o princípio de uma eticidade mais espiritual, porém mais simples, – em geral sobre uma intuição natural originária, – não podiam suportar dentro de si a cisão dessa intuição e a reflexão infinita da autoconsciência dentro de si, e assim,] sucumbiram a essa reflexão quando ela começou a se salientar, primeiro na disposição de ânimo e, depois, na realidade efetiva, porque faltava ao princípio ainda simples desses Estados a força verdadeiramente infinita, que reside unicamente naquela unidade que deixa a oposição da razão divergir em todo o seu vigor e que a dominou, unidade que, portanto, se mantém nessa oposição e a mantém coesa dentro de si.... O princípio da personalidade infinita dentro de si, subsistente por si, do singular, o princípio da liberdade subjetiva, que despontou interiormente na religião cristã, e exteriormente, ligado por conseguinte à universalidade abstrata, no mundo romano, não acede ao seu direito nessa forma somente substancial do espírito real efetivo. Esse princípio é historicamente posterior ao mundo grego, e a reflexão filosófica, que desce até esta profundidade, é igualmente posterior à ideia substancial da filosofia grega.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 185, anotação).


“O momento particularmente essencial de nossa época é aquele, no qual os homens não são mais conduzidos a algo pela autoridade e pela confiança; mas apenas pelo próprio entendimento, mas eles desejam consagrar e engajar a sua atividade em uma coisa apenas pelo seu próprio entendimento, convicção e opinião independentes.” (Vorlesungen uber die Philosophie der Geschichte, Werke 12, p. 30).


“O princípio do mundo moderno em geral é a liberdade da subjetividade, ele está em que todos os lados essenciais que existem na totalidade espiritual, em chegando ao seu direito, se desenvolvam. Partindo desse ponto de vista, mal se pode levantar a questão ociosa de saber qual forma seja a melhor, se a monarquia ou a democracia. Só é legítimo dizer que as formas de todas as constituições políticas que não conseguem suportar dentro de si o princípio da livre subjetividade e que não sabem corresponder à razão plenamente formada são unilaterais.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 273, adendo).


“A liberdade civil [burguesa – burgerlich] é, com efeito, a privação do universal, princípio do isolamento. Mas esta liberdade (para bourgeois e citoyen não temos duas palavras) constitui um momento necessário que os antigos estados não conheciam e nem mesmo esta completa independência das partes, mas tinham, justamente, uma maior independência do todo a vida orgânica superior.” (Vorlesungen uber die Geschichte der Philosophie, II, Werke 19, p. 228).


A mediação do reconhecimento na reciprocidade das autoconsciências na constituição da autoconsciência universal da eticidade

“A autoconsciência alcança sua satisfação somente em outra autoconsciência.” (Phänomenologie des Geistes, Werke 3, p. 144).

“A autoconsciência é em si e para si quando e porque é em si e para si para uma outra consciência de si; quer dizer, ela só é enquanto um ser reconhecido.” (Phänomenologie des Geistes, Werke 3, p. 145).

“A autoconsciência universal é o saber afirmativo de si mesmo em um outro si mesmo, cada um deles, como individualidade livre, tem absoluta independência; porém, em virtude da negação da sua imediatidade ou apetite, um não se distingue do outro; é [autoconsciência] universal e objetiva e tem, assim, a real universalidade como reciprocidade; de modo que se sabe reconhecido em um outro indivíduo livre, e o sabe enquanto reconhece o outro e o sabe livre. Este reaparecer universal da autoconsciência, o conceito que se sabe em sua objetividade como subjetividade idêntica consigo e, portanto, universal, é a forma de consciência própria à substância de toda espiritualidade essencial da família, da pátria, do Estado, como de todas as virtudes do amor, da amizade, do valor, da honra, da glória.” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, III, Werke 10, § 436).

A crítica ao jusnaturalismo


“A expressão direito natural, que chegou a ser costumeira na doutrina filosófica do direito, contém o ambiguidade se o direito existe de modo natural imediato ou se ele se determina pela natureza da coisa, isto é, pelo conceito. O primeiro sentido é aquele que foi visto outrora: do mesmo modo que, ao mesmo tempo, foi inventado um estado de natureza, no qual devia valer o direito natural, e diante do qual a condição da sociedade e do Estado parecia exigir e levar consigo uma limitação da liberdade e um sacrifício dos direitos naturais. Porém, em realidade, o direito e todas as suas determinações fundam-se somente na livre personalidade: uma autodeterminação que é o contrário da determinação natural. O direito da natureza é, portanto, o ser-aí da força, a prevalência da violência; e um estado de natureza é um estado da brutalidade e da injustiça, do qual nada mais verdadeiro se pode dizer que é preciso sair dele. A sociedade, ao contrário, é, antes, a condição na qual o direito tem somente a sua realidade efetiva; o que é preciso limitar e sacrificar é, justamente, o arbítrio e a violência do estado de natureza.” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, III, Werke 10, § 502, anotação)

O desenvolvimento tripartite da Ideia da vontade livre como base para a divisão da obra linhas fundamentais da filosofia do direito

“Segundo o andamento gradual do desenvolvimento da ideia da vontade livre em si e para si, a vontade é:


A. imediata; seu conceito [é], por isso, abstrato, a personalidade, e o seu ser-aí [é] uma coisa exterior imediata; – a esfera do direito abstrato ou formal;

B. a vontade refletida (a)dentro de si a partir do ser-aí externo, determinada como singularidade subjetiva em face do universal; – este [sendo] em parte como algo interno, o bem, em parte como algo externo, um mundo aí-presente, e esses dois lados da ideia [sendo] somente enquanto mediados um pelo outro; a ideia na sua cisão ou na sua existência particular, o direito da vontade subjetiva em relação ao direito do mundo e ao direito da Ideia, mas da ideia sendo somente em si, a esfera da moralidade;

C. a unidade e a verdade desses dois momentos abstratos, – a ideia pensada do bem, realizada na vontade refletida (a) dentro de si e no mundo exterior; - de sorte que a liberdade, enquanto substância, existe tanto como efetividade e necessidade quanto como vontade subjetiva, – a ideia na sua existência universal em si e para si; a eticidade.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 33).


“Ao falarmos, aqui, do Direito não aludimos meramente ao direito civil, ao que se entende usualmente por direito, mas à moralidade e à eticidade, e à história do mundo, que igualmente pertencem a essa esfera, porque o conceito reúne os pensamentos segundo a verdade. A vontade livre, para não permanecer abstrata, tem de, primeiramente, dar-se um ser-aí, e o primeiro material sensível desse ser-aí são as Coisas, isto é, as coisas externas. Este primeiro modo da liberdade é o modo que devemos conhecer como propriedade, a esfera do direito formal e abstrato, à qual não pertence menos a propriedade na sua figura mediada, enquanto contrato, do que o direito em sua lesão enquanto crime e pena. A liberdade que temos aqui é o que denominamos pessoa, quer dizer, o sujeito que é livre para si, e que se dá um ser-aí nas Coisas. Esta mera imediatez do ser-aí, porém, não é adequada à liberdade, e a negação dessa determinação é a esfera da moralidade. Eu sou livre não mais simplesmente nesta Coisa imediata, mas o sou, também, na imediatez suspensa, quer dizer, eu sou em si mesmo, no [que] é subjetivo. Nesta esfera o que importa é o meu discernimento e a minha intenção, e o meu fim, ao passo que a exterioridade é posta como indiferente. O bem, que é aqui o fim universal, não deve entretanto permanecer meramente no meu interior, mas deve realizar-se. Pois a vontade subjetiva exige que o seu interior, isto é, o seu fim, receba um ser-aí externo, que, portanto, o bem deva ser consumado na existência exterior. A moralidade, tal como momento anterior do direito formal, uma e o outro são abstrações, cuja verdade é somente a eticidade. A eticidade é, assim, a unidade da vontade no seu conceito e da vontade do singular, quer dizer, do sujeito. Seu primeiro ser-aí, novamente, é algo natural, na forma do amor e do sentimento: a família; o indivíduo suspendeu aí a sua rigidez de personalidade e encontra-se com a sua consciência num todo. Mas no degrau ou estágio seguinte, vê-se a perda da eticidade propriamente dita e da unidade substancial: a família desagrega-se, e os seus membros relacionam-se uns com os outros enquanto subsistentes por si, visto que somente o vínculo da carência recíproca os entrelaça. Este estágio, o da sociedade civil, foi frequentemente encarado como sendo o Estado. Mas o Estado é só o terceiro, a eticidade e o espírito, no qual ocorre a prodigiosa união da subsistência por si da individualidade e da substancialidade universal. O direito do Estado é, por isso, superior ao [direito] dos outros degraus ou estágios: ele é a liberdade em sua configuração mais concreta, que só se subordina, ainda, à suprema verdade absoluta do espírito do mundo.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 33, adendo).

“O solo do Direito é, em geral, o [elemento] espiritual e o seu lugar mais próximo e ponto de partida [é] a vontade que é livre, assim que a liberdade constitui a sua substância e a sua destinação, e que o sistema do direito é o reino da liberdade efetivada (verwirklichten Freiheit), o mundo do espírito produzido a partir do próprio espírito como uma segunda natureza.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 4).


A articulação da liberdade subjetiva na objetividade da vontade universal da eticidade


“A unilateralidade do espírito subjetivo é a determinação de si próprio – de modo igualmente abstrato – em oposição ao universal, em sua singularidade interior. Superadas essas unilateralidades, a liberdade subjetiva é, assim, como vontade universal racional em si e para si, a qual tem na consciência da subjetividade singular seu saber de si e sua disposição (Gesinnung) subjetiva, bem como ela tem, ao mesmo tempo, sua atuação e sua realidade efetiva universal imediata como costume (Sitte), a liberdade autoconsciente tornada natureza.” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, III, Werke 10, § 513).

“A eticidade (Sittlichkeit) é a consumação do espírito objetivo, a verdade do próprio espírito objetivo e subjetivo. A unilateralidade do espírito objetivo é ter, em parte, a sua liberdade [de forma] imediata na realidade, portanto, na exterioridade – a coisa; em parte, no bem como uma universalidade abstrata. A unilateralidade do espírito subjetivo consiste na autodeterminação interior, de igual modo abstrata, em oposição à universalidade da sua individualidade. Uma vez superadas essas unilateralidades, a liberdade subjetiva é, assim, como vontade universal racional em si e para si, a qual tem na consciência da subjetividade singular seu saber de si e sua disposição (Gesinnung) subjetiva, assim como ela tem, ao mesmo tempo, sua atuação e sua efetividade universal imediata como costume (Sitte), a liberdade autoconsciente que se tornou natureza.” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, III, Werke 10, § 513).


“A eticidade é a ideia da liberdade enquanto [sendo] o bem vivo,o qual tem na autoconsciência o seu saber e o seu querer, e, mediante o seu agir, a sua realidade efetiva, assim como este agir tem no ser ético a sua base sendo em si e para si e o seu fim motor, – o conceito de liberdade tornado mundo existente e natureza da autoconsciência” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 142).


“Moralidade e eticidade, que habitualmente quase se equivalem como sinônimos, são tomados, aqui, em sentido essencialmente diverso. Entrementes, mesmo a representação parece distingui-los; a linguagem kantiana serve-se, de preferência, da expressão moralidade, pois os princípios práticos desta filosofia restringem-se inteiramente a esse conceito, tornam, até, impossível o ponto de vista da eticidade, e, mesmo, expressamente a aniquilam e lhe resistem. Mesmo que moralidade e eticidade fossem, segundo a sua etimologia, sinônimos, isto não obstaria a que se usasse essas palavras, uma vez que diversas, para conceitos diversos.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7 § 33, anotação).


O indivíduo na esfera da família e a sua subsunção na sociedade civil

“Num primeiro momento a família é o todo substancial ao qual compete a prevenção deste lado particular do indivíduo, tanto no que diz respeito aos meios e habilidades para poder adquirir para si [algo] da riqueza patrimonial universal, como também no que diz respeito à sua subsistência e ao seu provimento no caso de incapacidade interveniente. A sociedade civil arranca, porém, o indivíduo desse laço familiar, torna os membros da família estranhos uns aos outros e os reconhece como pessoas subsistentes por si; além disso, ela substitui a natureza orgânica externa e o solo paterno, no qual o singular tinha a sua subsistência, pelo seu [próprio] solo e submete o subsistir de toda a família à dependência da sociedade, à contingência. Assim, o indivíduo tornou-se filho da sociedade civil, que tanto tem pretensões em relação a ela, quanto ele tem direitos em relação a ela.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 238).

“A família, enquanto substancialidade imediata do espírito, tem como sua determinação a unidade sob a forma do sentimento (empfindende Einheit), o amor, de sorte que a disposição de ânimo (Gesinnung) é de ter a autoconsciência de sua individualidade nesta unidade, enquanto essencialidade em si e para si, a fim de existir nela como membro e não como uma pessoa para si.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 158)


O significado da sociedade civil – da particularidade e da liberdade subjetiva nesta sociedade – e as suas limitações e contradições


“A sociedade civil é a diferença que intervém entre a família e o Estado, embora a sua formação plena ocorra mais tarde do que a do Estado, pois, como diferença, ela pressupõe o Estado, que ela, para existir, tem de ter diante de si como algo subsistente por si. A criação da sociedade civil pertence, de resto, ao mundo moderno, que, pela primeira vez, faz justiça a todas as determinações da Ideia. Se o Estado é representado como uma unidade de pessoas diversas, como uma unidade que é somente serem- comum, então só se visa com isso a determinação da sociedade civil. Muitos teóricos modernos do Estado não puderam alcançar nenhuma outra maneira de ver o Estado. Na sociedade civil cada um é fim para si, e tudo o mais nada é para ele. Mas sem relação aos outros ele não pode atingir a amplitude dos seus fins; esses outros são, por isso, meios para o fim do particular. Porém, pela sua relação aos outros, o fim particular se dá a forma da universalidade e se satisfaz enquanto, ao mesmo tempo, satisfaz conjuntamente o bem-próprio de outrem.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 182, adendo).

“A pessoa concreta, que como particular é fim para si, enquanto ela é um todo de carências e uma mistura de necessidade natural e de arbítrio, é um princípio da sociedade civil, – mas a pessoa particular, enquanto ela está essencialmente em relação a outra tal particularidade, assim que cada uma se faça valer e se satisfaça mediada pela outra e, ao mesmo tempo, pura e simplesmente só enquanto mediada pela forma da universalidade, é o outro princípio.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts,Werke 7, § 182).

“Mantida, porém, pela ordem objetiva, em conformidade com ela e, ao mesmo tempo, no seu direito, a particularidade subjetiva torna-se o princípio de toda a animação da sociedade civil-burguesa, do desenvolvimento da atividade pensante, do mérito e da honra. O reconhecimento e o direito de que aquilo que na sociedade-civil e no Estado é necessário pela razão simultaneamente aconteça pela mediação do arbítrio é uma determinação mais precisa daquilo que, nomeadamente na representação geral, chama-se liberdade (§ 121).” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, §206, anotação).

“No direito o objeto é a pessoa, no ponto de vista moral é o sujeito, na família é o membro da família, na sociedade civil em geral é o cidadão (como bourgeois) – aqui, do ponto de vista das carências (cf. § 123 Anot.), é o concreto da representação, o que se chama homem; portanto, é pela primeira vez aqui e só aqui que se fala do homem nesse sentido.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 190, anotação).


“Tal como na sociedade civil o direito em si se torna lei, assim também o ser-aí imediato e abstrato do meu direito singular passa à significação do ser-reconhecido enquanto um ser-aí [baseado] no saber e no querer universais existentes. Por isso, as aquisições e as ações relativas à propriedade tem de ser empreendidas e revestidas com a forma que lhes dá esse ser-aí. Agora, [na sociedade civil] a propriedade repousa sobre o contrato e sobre as formalidades que a tornam suscetível de prova e lhe dão força jurídica.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 217).


“A particularidade para si, enquanto ela é, por um lado, a satisfação, se expandindo para todos os lados, das suas carências, do arbítrio contingente e do capricho subjetivo, destrói nas suas fruições a si mesma e o seu conceito substancial; por outro lado, enquanto infinitamente excitada e em completa dependência da contingência externa e do arbítrio, assim como restringida pelo poder da universalidade, a satisfação da carência, seja ela necessária, seja ela contingente, é [ela própria] contingente. A sociedade civil oferece, nestas oposições e no seu emaranhamento, o espetáculo simultâneo da extravagância, da miséria e da corrupção física e moral comum a ambas.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 185).

A conciliação entre a liberdade subjetiva e a liberdade objetiva no valor ético-político superior do Estado

“O homem tem uma existência conforme a razão somente no Estado. O fim de toda educação é a de que o indivíduo não permaneça como um ser subjetivo, mas que ele se torne objetivo no Estado. Um indivíduo pode muito bem fazer do Estado um meio para alcançar isto ou aquilo. Mas o verdadeiro é que cada um queira a coisa mesma e elimine o que é inessencial. Tudo o que o homem é ele o deve ao Estado; é somente nele que o homem tem a sua essência. Todo o valor que o homem possui, toda efetividade espiritual, ele somente as possui pelo Estado... Somente assim ele é consciência, somente assim ele está no costume ético; da vida jurídica e ética do Estado. Porque o verdadeiro é a unidade da vontade universal e da vontade subjetiva, e o universal está no Estado, nas leis, nas determinações universais e racionais... O Estado é a vida ética efetiva e existente, pois ele é a unidade do querer universal e essencial e do querer subjetivo, e esta unidade constitui a vida ética. O indivíduo que vive numa tal unidade tem uma vida ética e um valor que consiste apenas nesta substancialidade.” (Die Vernunft in der Geschichte. Ed. J. Hoffmeister, Hamburg: Felix Meiner, 1955, p. 111-112)

“O Estado é a substância ética autoconsciente, a união do princípio da família e da sociedade civil-burguesa; a mesma unidade, que na família é como sentimento do amor, constitui a sua essência, a qual, porém, ao mesmo tempo, mediante o segundo princípio do querer que sabe e é ativo a partir de si, recebe a forma da universalidade que se sabe. Esta unidade tem (...) por conteúdo e fim absoluto a subjetividade ciente de si, isto é, que quer para si este racional.” (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, III, Werke 10, § 535).

“Se o Estado é confundido com a sociedade civil e se a sua determinação é posta na segurança e na proteção da propriedade e da liberdade pessoal, então o interesse dos singulares enquanto tais é o último fim em vista do qual eles estão unidos, e daí segue-se, igualmente, que depende do bel-prazer ser membro do Estado. – Mas o Estado tem uma relação inteiramente diferente ao indivíduo; como o Estado é espírito objetivo, o indivíduo só tem objetividade, verdade e eticidade enquanto ele é membro do Estado. A união como tal, ela própria, é o verdadeiro conteúdo e fim, e a destinação dos indivíduos é levar uma vida universal; a sua ulterior satisfação particular, a sua atividade e as suas modalidades de comportamento têm esse [elemento] substancial e universalmente válido por ponto de partida e por resultado. – Considerada abstratamente, a racionalidade consiste, em geral, na unidade em que se interpenetram a universalidade e a singularidade e aqui, concretamente, segundo o conteúdo, na unidade da liberdade objetiva, isto é, da vontade substancial universal, e da liberdade subjetiva enquanto liberdade do saber individual e da vontade que busca os seus fins particulares – e, por isso, segundo a forma, [consiste] num agir que se determina segundo leis e princípios pensados, isto é, universais.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 258, anotação.)


“No Estado tudo depende da unidade da universalidade e da particularidade. Nos Estados antigos o fim subjetivo era absolutamente uma coisa só com o querer do Estado; nos Tempos Modernos, ao contrário, exigimos uma maneira de ver própria, um querer e uma consciência moral que nos sejam próprios. Os antigos, neste sentido, não tinham nada disto; a vontade do Estado era para eles a última instância... O Estado confere às determinações da vontade individual um ser-aí objetivo e só por meio dele elas alcançam a sua verdade e a sua realização efetiva. O Estado é a condição única da consecução do fim e do bem-próprio particulares.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 261, adendo).


“O Estado é a efetividade da liberdade concreta; ora a liberdade concreta consiste em que a singularidade pessoal e os seus interesses particulares tanto tenham o seu desenvolvimento completo e o reconhecimento do seu direito para si (no sistema da família e da sociedade civil), quanto, em parte passem por si mesmos ao interesse do universal, em parte reconheçam- no, com saber e vontade, como o seu espírito substancial, e sejam ativos a favor do universal como seu fim-último, e isso de tal maneira que nem o universal valha e possa ser consumado sem o interesse, o saber e o querer particulares, nem os indivíduos vivam apenas para estes como pessoas privadas, sem querê-los, simultaneamente, no universal e para o universal e sem que tenham uma atuação consciente desse fim. O princípio dos Estados modernos tem este vigor e esta profundidade prodigiosos de deixar o princípio da subjetividade plenificar-se até o extremo subsistente por si da particularidade pessoal e, ao mesmo tempo, de reconduzi- lo à unidade substancial, e, assim, de manter essa unidade substancial nesse próprio princípio da subjetividade.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 260).


“O Estado é a efetividade da ideia ética, – o espírito ético enquanto vontade substancial, clara a si mesma, manifesta, que se pensa e se sabe e realiza plenamente o que ela sabe e na medida em que o sabe. No costume ele tem a sua existência imediata e na autoconsciência do singular, no saber e na atividade do mesmo, a sua existência mediada, assim como essa autoconsciência do singular, através da [sua] disposição de ânimo, tem no Estado, como sua essência, fim e produto da sua atividade, a sua liberdade substancial.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 257).


“O Estado, enquanto efetividade da vontade substancial, efetividade que ela tem na autoconsciência particular erguida à universalidade do Estado, é o racional em si e por si. Esta unidade substancial é auto-fim imoto, absoluto, no qual a liberdade chega ao seu supremo direito, assim como este fim-último tem o direito supremo em face dos singulares, cujo dever supremo é o de ser membro do Estado.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 258).


“O Estado, enquanto [elemento] ético, enquanto interpenetração do substancial e do particular, implica que a minha obrigação para com o substancial seja, simultaneamente, o ser-aí da minha liberdade particular, isto é, que, nele, obrigação e direito estejam unidos numa e mesma relação.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 261, anotação).

“No Estado tudo depende da unidade da universalidade e da particularidade. Nos Estados antigos o fim subjetivo era absolutamente uma só coisa com o querer do Estado; nos Tempos Modernos, ao contrário, exigimos uma maneira de ver própria, um querer e uma consciência moral que nos sejam próprios. Os antigos, neste sentido, não tinham nada disso; a vontade do Estado era para eles a última instância. Enquanto que nos despotismos asiáticos o indivíduo não tem nenhuma interioridade e nenhuma legitimação em si mesmo, o homem moderno quer ser respeitado na sua interioridade. A ligação entre dever e direito tem esta dupla face, de sorte que o que o Estado exige como dever é, também, imediatamente, o direito da individualidade, visto que eles nada são senão a organização do conceito de liberdade. O Estado confere às determinações da vontade individual um ser-aí objetivo e só por meio dele elas alcançam a sua verdade e a sua efetivação. O Estado é a condição única da consecução do fim e do bem-próprio particulares.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 261, adendo).


“O Estado é efetivo e a sua efetividade consiste em que o interesse do todo se realize nos fins particulares. Efetividade é, sempre, a unidade da universalidade e da particularidade, a explicação e desdobramento (Auseinandergelegtsein) do universal na particularidade, que aparece como uma particularidade subsistente por si, embora ela seja somente enquanto sustentada pelo todo e nele mantida. Enquanto essa unidade não estiver presente, algo não é efetivo, ainda que seja legítimo supor a [sua] existência. Um mau Estado é um Estado que meramente existe; um corpo doente também existe, mas ele não tem nenhuma realidade verdadeira. Uma mão que está decepada também parece ainda com uma mão e existe, sem ser, contudo, efetiva: o que é efetivo é em si mesmo necessário. A necessidade consiste em que o todo esteja dividido nas diferenças do conceito e que esse momento dividido forneça uma determinidade sólida e duradoura, que não é rígida como a morte, mas que se engendra continuamente na [sua] dissolução. Ao Estado acabado pertence essencialmente a consciência, o pensamento; o Estado sabe por isso o que ele quer, e o sabe enquanto algo pensado.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 270, adendo).


“Uma vez que o espírito só é efetivo enquanto aquilo que ele sabe de si, e o Estado, enquanto espírito de um povo, é simultaneamente a lei que penetra e perpassa todas as situações desse povo, os costumes e a consciência dos seus indivíduos, segue-se que a constituição de um povo determinado depende, em geral, da maneira de ser e da formação da autoconsciência do mesmo; nesta autoconsciência reside a liberdade subjetiva desse povo e, portanto, a efetividade da constituição.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 274).

“A essência do Estado moderno está em que o universal esteja ligado com a plena liberdade da particularidade e com a prosperidade dos indivíduos, em que, portanto, o interesse da família e da sociedade civil tem de se concentrar e convergir para o Estado, mas em que [também] a universalidade do fim não pode progredir sem o saber e o querer próprios da particularidade, que deve reter o seu direito. O universal, por conseguinte, tem de ser ativado, mas, por outro lado, a subjetividade tem de ser inteiramente e vivamente desenvolvida. Somente pelo fato de que ambos momentos subsistem no seu vigor é que o Estado pode ser encarado como um Estado articulado e verdadeiramente organizado.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 260, adendo).


“Em face das esferas do direito privado e do bem-próprio privado, da família e da sociedade civil, o Estado é, por um lado, uma necessidade exterior e a potência superior a elas, a cuja natureza estão subordinadas as leis bem como os interesses dessas esferas e de cuja natureza dependem; mas, por outro lado, ele é o fim imanente dessas esferas, e tem o seu vigor na unidade do seu fim-último universal e do interesse particular dos indivíduos, em que os indivíduos têm deveres para com ele na medida em que, ao mesmo tempo, têm direitos em face dele.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 261).


“Visto que o espírito só é efetivamente real enquanto é aquilo que ele sabe de si, e o Estado, como espírito de um povo, é simultaneamente a lei que penetra e perpassa todas as relações desse povo, os costumes e a consciência dos indivíduos, segue-se que a constituição de um povo determinado depende, em geral, da maneira de ser e da formação da autoconsciência do mesmo; nesta autoconsciência reside a liberdade subjetiva desse povo e, portanto, a realidade efetiva da constituição.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 274).

“O Estado não é, de maneira nenhuma, um contrato (veja-se § 75), nem a sua essência substancial é tão incondicionadamente a proteção e a garantia da vida e da propriedade dos indivíduos enquanto singulares, ao contrário, ele é uma instância superior, que reclama essa vida e essa propriedade, e exige o seu sacrifício.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 100, anotação).

“O direito dos indivíduos à sua destinação subjetiva para a liberdade tem o seu cumprimento no fato de que eles pertencem à efetividade ética, enquanto a certeza da sua liberdade tem a sua verdade em tal objetividade e enquanto eles efetivamente possuem no elemento ético a sua própria essência, a sua universalidade interna.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 153).

“Faz parte da formação, do pensar enquanto consciência do singular na forma da universalidade, que eu seja apreendido como pessoa universal, no que todos são idênticos. O homem vale, portanto, porque ele é homem, e não porque seja judeu, católico, protestante, alemão, italiano etc. Essa consciência, para a qual o pensamento vale, é de uma importância infinita, – ela só é defeituosa, quando, por exemplo, no sentido do cosmopolitismo, ela se fixa em defrontar com a vida concreta do Estado.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 209, anotação).


“A essencial disposição de espírito dos cidadãos em relação ao Estado e ao seu governo não é nem de obediência cega às suas ordens, nem de um assentimento individual que cada um deveria dar às disposições e regras instituídas no seio do estado, mas uma confiança e uma obediência esclarecida.” (Nurnberger und Heidelberger Schriften. 1808-1817, Werke 4, Propädeutik, § 196).

“A opinião pública é o modo inorgânico como se dá a conhecer aquilo que um povo quer e opina. O que efetivamente se faz valer no Estado tem de sem dúvida tornar-se ativo de um modo orgânico, e isso ocorre na constituição. Mas, em todos os tempos, a opinião pública foi um grande poder e o é particularmente no nosso tempo, em que o princípio da liberdade subjetiva tem esta importância e esta significação. O que atualmente deve valer, não vale mais pela força, menos pelo hábito e pelo costume, mas sim pelo discernimento e por razões.” (Grundlinien der Philosophie des Rechts, Werke 7, § 316, adendo).


filoparanavai 2011