ACESSE O ARQUIVO DO BLOG
FILOPARANAVAÍ

quinta-feira, 28 de março de 2019

DITADURA MILITAR NO BRASIL: 55 anos de uma história que deve ser conhecida, jamais esquecida e que jamais deve ser repetida!

ATUALIZADO
DÊ CLIQUE AQUI PARA SER REDIRECIONADO PARA A PÁGINA ATUALIZADA

UM PERÍODO DE NOSSA HISTÓRIA QUE JAMAIS DEVE SER ESQUECIDO E MUITO MENOS COMEMORADO: O erro do Brasil foi nunca ter punido os agentes  dos governos militares pelo golpe e por todo o mal que fizeram aos civis! A impunidade permitiu que convivamos com o espectro da Ditadura Militar rondando nossa sociedade e ameaçando nossa frágil Democracia que sofreu um novo Golpe em 2016 (parlamentar-jurídico) e que forjou a eleição de um líder de extrema-direita apologista da ditadura. Até Ernesto Geisel, em entrevista na década de 1990, alertou que Jair Bolsonaro era "anormal" por defender as décadas de trevas.

Os 'gênios militares' conseguiram endividar o Brasil (Em 1964 a dívida externa brasileira somava US$ 3,294 bilhões e, em 1985 totalizava US$ 105,171 bilhões, ou seja, cresceu 32 vezes durante os governos militares - https://auditoriacidada.org.br/); retiraram direitos dos trabalhadores e reduziram o salário mínimo paulatinamente; aumentaram a distância que entre pobres e ricos - sendo que os primeiros entraram em um ciclo de empobrecimento chegando à miséria e fome; na educação imperou a pedagogia do medo e da alienação - quer dizer, tentaram, mas houve muitos estudantes que resistiram às arbitrariedades dos ditadores e foram protagonistas na luta pela Democracia; a corrupção correu solta nos governos militares; a inflação disparava mês a mês passando dos 200% ao final desse tempo de trevas com a chegada do processo de redemocratização. Quem ousava discordar podia sofrer ameaças, ser preso, torturado, exilado, desaparecer ou simplesmente ser assassinado e jogado em valas comuns (cemitérios clandestinos) 





Filoparanavaí 2019

quarta-feira, 27 de março de 2019

Não foi por falta de aviso! Agora assistimos o caos de um desgoverno anunciado.



Somente alguém muito idiota - naquela concepção do grego 'idiotes' ou do latim 'idiota' que é a mesma que pessoa simples, sem instrução, iletrada, pateta, parvo, tolo - para acreditar que um governo de Jair Bolsonaro, em tese e em concretude, pudesse ter alguma chance de dar certo para o bem do povo.

O desgoverno de Jair Bolsonaro é um fracasso retumbante. Leia o artigo de Ricardo Kotscho Brasil "(1500-2019): País regride 50 anos em 3 meses e coloca em risco o futuro" (acesse dando clique aqui). 

Sobre as eleições 2018 e o futuro do Brasil, Luís Marques Mendes, na SIC TV de Portugal, profetizava o que agora constatamos. 



Primeiro, porque Bolsonaro jamais foi do lado do povo em sua vida política. Foram quase 30 anos na vida parlamentar, depois de ser expurgado do exército, sem apresentar um histórico mínimo de realizações em benefício do povo. 

Em relação ao Exército, Bolsonaro era um mau militar, e olha que a revelação é de um militar. Em entrevista de 1993, Ernesto Geisel (1907-1966)  disse que Bolsonaro era mau militar que pedia volta da ditadura (Leia mais aqui)Bolsonaro é “completamente fora do normal” (Leia mais aqui).


Segundo, porque as forças da sociedade que o apoiaram em sua campanha rumo ao Palácio do Planalto, foram aquelas forças mais reacionárias que jamais tiveram o povo e suas demandas como problema central. Desde forças reacionárias do capital aos reacionários religiosos. 

No final do ano de  2018 eu mesmo publiquei, neste blog, um texto vislumbrando o que seria a era Bolsonaro comparada à era Temer. (Leia mais aqui)

Donde então apresento algumas simples questões apenas para que possamos refletir.

Como é que poderia dar certo o governo de um candidato que utilizou o nome de 'Deus' em vão no slogan de sua campanha? Em vão porque  o Deus de Jesus Cristo, o qual reivindicava jamais pode ser identificado como um Deus apologista do ódio, e da tortura. O candidato legitimou sua campanha na disseminação do ódio e da mentira (havia uma real fábrica de fake news contra o opositor que eram disseminadas nos 'porões' das redes sociais da internet por seus fanáticos seguidores e robôs eletrônicos). Em vão porque o ódio disseminado ficou registrado na história através de inúmeros ataques às 'minorias' mulheres, LGBTTQI, indígenas, negros, imigrantes, pobres.

O vídeo abaixo é muito pedagógico, apesar de seu caráter humorístico fala de uma tragédia real vivenciada pelos brasileiros.



Como poderia dar certo o governo de um candidato que passou toda a campanha fazendo símbolo de 'arminhas' com as mãos? 

Como poderia dar certo o governo de eleitores que faziam 'arminhas'? 

Como poderia dar certo o governo de um candidato que tinha como bandeira principal flexibilizar posse e porte de armas? E que em sua sanha contra os 'inimigos' foi capaz de posse de uma arma simbólica ameaçá-los? Durante um ato de campanha no Acre, Bolsonaro prometeu “fuzilar a petralhada toda aqui”, conforme registrado em vídeo, cuja autenticidade foi confirmada pela própria equipe do candidato. O deputado usou um tripé de uma câmera de vídeo para imitar uma metralhadora. (Leia mais aqui). 

Como poderia dar certo o governo de um candidato que foi filmado quando segurava no colo uma menina e a auxiliava, com um largo sorriso no rosto, a usar os dedos polegar e indicador para simular que segurava uma arma em suas mãos? Em seguida, ele também faz o gesto. (Leia mais aqui). 

O candidato sempre dissimulava quando indagado, sobre seus feitos públicos, que era uma brincadeirinha. 

Como poderia dar certo o governo de um candidato que fugiu dos debates? 

Fico por aqui nas demonstrações. 

Quem não percebeu naquele contexto de campanha que o candidato era um perigo para a Democracia e para a civilidade brasileira, jamais irá perceber o caos no qual nos encontramos agora. 

Lamento dizer que para o povo trabalhador deste país este governo já nasceu fracassado. Está aprofundando a 'dor' da grande parcela do povo mais pobre (12 milhões de desempregados, 15 milhões de brasileiros na miséria), a economia afunda-se dia a dia no caos provocado pelo desgoverno internamente e pelas decisões de entregar nosso país aos domínios dos EUA e de Israel. 

A Reforma da Previdência visa sangrar os mais pobres para engordar os banqueiros.

Para finalizar eu recomendo o vídeo do 'Conversa Afiada'.



Filoparanavaí 2019

Mais de 400 juristas lançam manifesto ao STJ em defesa de Lula Livre: Juristas estão contra a prisão do ex-presidente, e fizeram um manifesto com mais de 400 magistrados pela liberdade de Luiz Inácio Lula da Silva

Não é preciso ser jurista para saber que a prisão de Lula é política e não respeitou seus direitos fundamentais como cidadão brasileiro. Lula está sequestrado após um processo de encarceramento para que não concorresse e não voltasse a presidir o país. Como não havia cometido crime, o processo que o condenou carece de provas, tendo sido fundamentado em uma delação sem provas e sem compromisso com a verdade. O mais interessante é que as testemunhas de acusação, em sua maioria, inocentaram Lula. Condenado por 'fatos indeterminados' e sob a acusação de ser proprietário de um apartamento no Estado de São Paulo, que nunca pertenceu a ele ou a qualquer um de seus familiares. O processo correu nas primeiras e segundas instâncias na velocidade-tempo de um 'foguete', quando sabemos que processos na Justiça correm na velocidade de 'tartarugas'. Para ajudar, O STF deu sua contribuição empurrando com a barriga a discussão de prisão em segunda instância. Sem contar que a liberdade de Lula foi impedida duas vezes, quando um desembargador do TRF deu alvará de soltura e o mesmo quando um ministro do STF entendeu pela liberdade. Os mesmos protagonistas das agressões que Lula sofre, mobilizaram-se rapidamente nos 'porões' para impedir a liberdade. Todo o injusto processo contra Lula seguiu-se de exposições midiáticas criminosas lideradas pela Globo. Mesmo quando a ONU, por meio de um de seus comitês, cobrou tratados internacionais assinados pelo Brasil  e pediu as garantias judiciais dos direitos do cidadão Lula, para participar do pleito eleitoral de 2018, sendo ignorado pelo Estado brasileiro violador de Direitos Humanos, quando ainda o país estava sob a presidência do golpista Michel Temer. A prisão de Lula gerou o cenário favorável para a eleição de um aventureiro de extrema direita tido como 'salvador da pátria' construído em um processo eleitoral onde as Fakes News foram fundamentais. Lula continua preso, o único político que pode conciliar a nação! O país segue em um desgoverno que já preocupa inclusive aqueles que apoiaram o 'aventureiro', tido pelos críticos como incompetente para o cargo que exerce.



Um manifesto assinado por mais de 400 juristas brasileiros pede a liberdade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que é mantido como preso político desde 7 de abril de 2018, após ser condenado em segunda instância por corrupção passiva e lavagem de dinheiro sem apresentação de provas.O documento é endereçado aos ministros que integram a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).O manifesto recebeu a assinatura de 464 juristas, advogados e operadores do direito. Entre eles Pedro Serrano, Gisele Cittadino, Lenio Streck, Dalmo Dallari, Fábio Konder Comparato, Carol Proner e Antônio Carlos de Almeida Castro.

Leia, abaixo, o manifesto na íntegra: Manifesto de Juristas em prol da liberdade do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva 

Aos Excelentíssimos Senhores Ministros Integrantes da Quinta Turma do STJ 
Dr. Félix Fischer 
Dr. Jorge Mussi 
Dr. Reynaldo Soares da Fonseca 
Dr. Ribeiro Dantas 

Desde abril de 2018, o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva perdeu sua liberdade. Nunca, antes, na história desse país, um ex-Presidente da República, sua família e seus amigos conheceram tamanho sofrimento e a ele reagiram com tanta altivez e confiança na justiça e no processo histórico. O ex-Presidente Lula tem insistido que dispensa a liberdade em prol da dignidade, especialmente quando muitos sugerem que a fuga ou o exílio teriam sido melhores alternativas. 

Sabemos que a corrupção é marca comum das sociedades cuja trajetória tem início com as colônias de exploração. Tem sido assim em várias regiões do mundo e não é diferente no Brasil. Como forjar o compromisso do povo com sua terra se as riquezas por ele produzidas não serão investidas na construção e no desenvolvimento de um mundo por todos compartilhado? Nessas circunstâncias, o sentimento de pertencimento a uma comunidade de destino se perde em meio aos caminhos atlânticos por onde escoava nosso patrimônio. Enfrentar hoje a corrupção no Brasil é, portanto, lutar pela dupla possibilidade de que alguns não se sintam excluídos dessa sociedade e que outros não a vejam como sua propriedade. Em outras palavras, nem as camadas populares podem se sentir à margem da comunidade, nem as elites podem agir como predadores, porque, como lembrava Tocqueville, o exemplo que vem do alto costuma se espalhar por todos os espaços sociais. 

Luiz Inácio Lula da Silva foi o primeiro presidente brasileiro oriundo das camadas populares e, lamentavelmente, essa pode ser uma das explicações para a sua prisão. A chamada “era Lula” atuou fortemente em dois sentidos distintos, mas, como vimos, complementares, pois construiu um conjunto consistente de políticas públicas voltadas para a inclusão dos mais desfavorecidos, ao mesmo tempo em que inaugurou uma série de instrumentos, políticas, normas e procedimentos voltados para a luta contra a corrupção em todos os níveis de governo. Lula, dessa maneira, revelava o seu compromisso com aquilo que Darcy Ribeiro já descreveu como o “povo brasileiro”, sujeito sem o qual não há como se pensar na construção de uma Nação. Incluir, por um lado, e evitar a privatização daquilo que deveria ser exclusivamente público, por outro, foram duas das principais conquistas da “era Lula”, base sobre a qual o Brasil pode construir uma comunidade de destino compartilhado. 

É absurdo o fato de que o ex-Presidente Lula esteja preso acusado de ter-se apropriado de recursos públicos. Depois de décadas de vida pública e política, de grandes embates sindicais, da construção de uma agremiação partidária, da luta pela reconstrução da democracia no Brasil, e de processos eleitorais disputados, trata-se de um cidadão conhecido, observado e investigado. Nunca, durante décadas, nem mesmo anos após ter deixado a Presidência da República, mudou seu modesto estilo de vida, tanto quanto sua família. Onde estão esses recursos indevidamente apropriados? Em que bancos, nacionais ou estrangeiros, estarão as contas abarrotadas de dinheiro sujo? E o patrimônio amealhado, onde se esconde? Não há registro de apartamento na Europa, nem mesmo de uma mansão no Uruguai. Por que a polícia nunca conseguiu encontrar uma mala, uma pasta ou mesmo uma caixa de uísque repleta de dinheiro? 

Uma sentença condenatória é algo terrível se recai sobre um inocente. Não há maior injustiça do que aquela representada por uma decisão ilegal de um dos poderes do Estado sobre um cidadão qualquer. Quando o poder estatal e o monopólio da violência recaem sobre corpos civis, é fundamental que tal decisão seja legal e legítima. O ex-Presidente Lula ou qualquer outro cidadão brasileiro só podem ser condenados, perdendo patrimônio e liberdade, se a materialidade do delito estiver fartamente comprovada, a defesa amplamente assegurada, e garantidas todas as regras do devido processo. Não foi isso que aconteceu com Lula. De uma incompreensível condução coercitiva à ilegal divulgação de grampos telefônicos ilegalmente captados, passando por toda sorte de constrangimentos públicos decorrentes de vazamentos seletivos, o cidadão Luiz Inácio Lula da Silva experimenta um calvário que jamais recaiu sobre um político brasileiro. 

Todos os que vivem nesse país, simpáticos ou não ao ex-Presidente Lula, tinham a mais absoluta certeza da sua condenação. Logo, não foi difícil para o juiz de piso e demais desembargadores na segunda instância recorrerem a interpretações normativas e argumentos inteiramente desapropriados. Apenas como exemplo, podemos citar o adjetivo “formal” que foi, sem a menor cerimônia, adicionado ao conceito de titularidade, ocasião em que o país foi apresentado à mais nova sensação do direito civil: a propriedade de fato. O ex-Presidente Lula não teria a “titularidade formal” do conhecido “triplex”, mas foi condenado porque era seu “proprietário de fato”. A denúncia do Ministério Público, por sua vez, apontava para propinas que teriam sido recebidas pelo ex-Presidente em troca de vantagens para a OAS em contratos da Petrobras. O juiz, ao contestar os embargos de declaração formulados pela defesa, afirmou que nunca considerou a possibilidade do ex-Presidente Lula ter recebido vantagens indevidas provenientes dos recursos ilicitamente desviados da Petrobras, inaugurando, dessa maneira, uma regra processual que lhe permite condenar com base em algo que não estava presente na denúncia. Outras irregularidades da sentença poderiam ser aqui mencionadas, como o já quase clássico “ato de ofício indeterminado”. No âmbito da segunda instância, como se admitir que os desembargadores do TRF-4 possam afirmar que “não é razoável exigir-se isenção dos procuradores da República, que promovem a ação penal”? Como conviver com um Ministério Público que não pretende ser apenas “parte processual ou “parte-imparcial”, mas “parte-mesmo”, ou seja, acredita que deve atuar como se fosse um grande escritório de advocacia de “defesa social”, autorizado a agir estrategicamente para obter resultados pré-determinados? Mas talvez seja mais eficaz fazer uma singela pergunta: alguém conhece um jurista de renome, um professor de direito, um pesquisador na área de direito penal ou processo penal, ou um experiente advogado criminalista que tenha dedicado atenção a tais decisões judiciais senão para criticá-las? Ninguém acha estranho a inexistência de um único e bom artigo em defesa das sentenças publicado em qualquer lugar? 

Tais sentenças condenatórias cumpriram sua finalidade política: baniram o ex-Presidente Lula das eleições presidenciais. Dentre todas as consequências negativas de tal processo, essa indevida intervenção no espaço público, em um país tão habituado com rupturas institucionais, talvez tenha sido a consequência mais perversa do uso do direito para fins de perseguição política. Outros processos, igualmente descabidos, estão em andamento. A juíza substituta responsável pela sentença condenatória do segundo processo – o caso da reforma no Sítio de Atibaia – copiou os arquivos do juiz anterior, o que já foi demonstrado pela perícia, mencionou um agora inexistente “apartamento”, além de ter transformado um único delator em duas pessoas distintas. Pressa? Desatenção? Perseguição? Nada disso importa, pois todo o país tinha, exatamente como no caso anterior, a certeza da condenação.

O ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisa ser libertado! Em qualquer país do mundo cuja democracia esteja consolidada, seria moral e politicamente indefensável que o juiz que o afastou do processo eleitoral, condenando-o à prisão, aceitasse abandonar a carreira de magistrado para ingressar na vida político-partidária, ocupando o cargo de Ministro da Justiça do governo que indiretamente ajudou a eleger.

O ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisa ser libertado! O Brasil precisa reconstruir sua vida política na normalidade democrática e essa prisão se constitui numa mancha autoritária incompatível com o respeito ao papel da oposição numa sociedade comprometida com a liberdade política. 

O ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisa ser libertado! São ingênuos aqueles que acreditam que podem enterrar na prisão, junto com Lula, os anseios dos cidadãos e dos movimentos sociais por uma sociedade menos desigual. 

O ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisa ser libertado! Porque não foi definitivamente condenado, não existe trânsito em julgado da decisão e tampouco uma situação de perigo a justificar uma prisão cautelar. Ele está preso por conta de inconstitucional e inconvencional execução antecipada da pena, um dos maiores equívocos decisórios cometidos na história do STF e que deve ser corrigido. 

O ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisa ser libertado! Os julgamentos históricos acontecem mais cedo ou mais tarde. A grandiosidade política de Lula torna inexorável esse julgamento e a história não perdoará aqueles que, tendo responsabilidade política e jurídica, optaram por não se importar com suas próprias biografias. 

Fonte: Agência PT de Notícias



Filoparanavaí 2019

sábado, 23 de março de 2019

As distinções necessárias sobre os conceitos de ÉTICA e MORAL

Um exemplo de ação anti-ética e imoral que fere diretamente a Dignidade Humana, aconteceu no final da última semana. Lê-se entre as manchetes de um portal de notícias: "'CIDADÃOS DE BEM' COMEMORAM INCÊNDIO EM FAVELA DE SP". No disparador da notícia lê-se: "Os moradores da Favela do Cimento, no entorno do Viaduto Bresser, na Zona Leste da capital paulista, que neste domingo (24) seriam alvo de reintegração de posse e tiveram seus barracos destruídos por incêndio ocorrido no sábado (23), foram insultados por "cidadãos de bem" que passavam de carro comemorando as chamas com buzinaço e gritos de "vagabundos"". 'O homem não é nada além daquilo que a educação faz dele', já dizia o filósofo Immanuel kANT. Para Kant, a dignidade é o valor de que se reveste tudo aquilo que não tem preço, ou seja, não é passível de ser substituído por um equivalente. Dessa forma, a dignidade é uma qualidade inerente aos seres humanos enquanto entes morais: na medida em que exercem de forma autônoma a sua razão prática, os seres humanos constroem distintas personalidades humanas, cada uma delas absolutamente individual e insubstituível. Consequentemente, a dignidade é totalmente inseparável da autonomia para o exercício da razão prática, e é por esse motivo que apenas os seres humanos revestem-se de dignidade. O grande legado do pensamento kantiano para a filosofia dos direitos humanos, contudo, é a igualdade na atribuição da dignidade. Na medida em que a liberdade no exercício da razão prática é o único requisito para que um ente se revista de dignidade, e que todos os seres humanos gozam dessa autonomia, tem-se que a condição humana é o suporte fático necessário e suficiente à dignidade, independentemente de qualquer tipo de reconhecimento social. Portanto, conclui-se que os referidos "cidadãos de bem" demonstraram um ataque direto à Dignidade Humana. Chamar alguém de 'vagabundo' porque mora em  favela, em um país onde 1 em cada 4 brasileiros sobrevive com menos de R$ 406,00 demonstra uma grande ignorância e crueldade. Além de demonstrar uma profunda desumanização que beira à barbárie. São faces simbólicas da onda de ódio que é alimentada politicamente e socialmente no Brasil desde o Golpe Parlamentar-Jurídico de 2016. O mesmo ódio alimentado por Fake News e discursos de violência contra minorias e pessoas que pensam de forma diferente da deles. Essas ditas pessoas de bem, o que é uma ironia, colocam-se numa condição de superiores e são capazes de comemorar a desgraça humana, atitude que não encontra-se em meio a nenhuma outra espécie animal. Lamentável, mas esse é um exemplo concreto que vai contra os valores morais e éticos da sociedade brasileira e mundial.  (Leia mais aqui).


Ética vem do grego “ethos” que significa modo de ser; “conjunto de valores que orientam o comportamento do homem em relação aos outros homens na sociedade em que vive, garantindo, outrossim, o bem-estar social”, ou seja, Ética é a forma que o homem deve se comportar no seu meio social. Ética está em relação à Moral. Na etimologia Moral é More (vem do Latim) e Ética é Ethos (vem do Grego). Ambas significam COSTUME. Em outras palavras é dizer que os humanos deveriam, em tese, viver de forma Moral e Ética na Sociedade. É o que se espera de pessoas ditas civilizadas.

Para a introdução, reproduzo a seguir o artigo de Thomas Mautner, da Universidade Nacional da Austrália, intitulado Ética e Moral, que pode nos auxiliar na compreensão desse problema que envolve os dois conceitos:

A palavra "ética" relaciona-se com "ethos", que em grego significa hábito ou costume. A palavra é usada em vários sentidos relacionados, que é necessário distinguir para evitar confusões.

1. É a investigação racional, ou uma teoria, sobre os padrões do correto e incorreto, do bom e do mau, com respeito ao carácter e à conduta, que uma classe de indivíduos tem o dever de aceitar. Esta classe pode ser a humanidade em geral, mas podemos também considerar que a ética médica, a ética empresarial, etc., são corpos de padrões que os profissionais em questão devem aceitar e observar. Este tipo de investigação e a teoria que daí resulta (a ética kantiana e a utilitarista são exemplos amplamente conhecidos) não descrevem o modo como as pessoas pensam ou se comportam; antes prescrevem o modo como as pessoas devem pensar e comportar-se. Por isso se chama "ética normativa": o seu objectivo principal é formular normas válidas de conduta e de avaliação do carácter. O estudo sobre que normas e padrões gerais são de aplicar em situações-problema efetivos chama-se também "ética aplicada". Recentemente, a expressão "teoria ética" é muitas vezes usada neste sentido. Muito do que se chama filosofia moral é ética normativa ou aplicada. 

2. A ética social ou religiosa é um corpo de doutrina que diz respeito o que é correto e incorreto, bom e mau, relativamente ao carácter e à conduta. Afirma implicitamente que lhe é devida obediência geral. Neste sentido, há, por exemplo, uma ética confucionista, cristã, etc. É semelhante à ética normativa filosófica ao afirmar a sua validade geral, mas difere dela porque não pretende ser estabelecida unicamente com base na investigação racional. 

3. A moralidade positiva é um corpo de doutrinas, a que um conjunto de indivíduos adere geralmente, que dizem respeito ao que é correto e incorreto, bom e mau, com respeito ao carácter e à conduta. Os indivíduos podem ser os membros de uma comunidade (por exemplo, a ética dos índios Hopi), de uma profissão (certos códigos de honra) ou qualquer outro tipo de grupo social. Pode-se contrastar a moralidade positiva com a moralidade crítica ou ideal. A moralidade positiva de uma sociedade pode tolerar a escravatura, mas a escravatura pode ser considerada intolerável à luz de uma teoria que supostamente terá a autoridade da razão (ética normativa) ou à luz de uma doutrina que tem o apoio da tradição ou da religião (ética social ou religiosa). 

4. Ao estudo a partir do exterior, por assim dizer, de um sistema de crenças e práticas de um grupo social também se chama ética, mais especificamente "ética descritiva", dado que um dos seus objetivos principais é descrever a ética do grupo. Também se lhe chama por vezes étnoética, e é parte das ciências sociais. 

5. Chama-se "metaética" ou "ética analítica" a um tipo de investigação ou teoria filosófica que se distingue da ética normativa. A metaética tem como objecto de investigação filosófica os conceitos, proposições e sistemas de crenças éticos. Analisa os conceitos de correto e incorreto, bom e mau, com respeito ao carácter e à conduta, assim como conceitos relacionados com estes, como, por exemplo, a responsabilidade moral, a virtude, os direitos. Inclui também a epistemologia moral: o modo como a verdade ética pode ser conhecida (se é que o pode); e a ontologia moral: a questão de saber se há uma realidade moral que corresponde às nossas crenças e outras atitudes morais. As questões de saber se a moral é subjectiva ou objectiva, relativa ou absoluta, e em que sentido o é, pertencem à metaética. 

A palavra "moral" e as suas cognatas refere-se ao que é bom ou mau, correto ou incorreto, no caráter ou conduta humana. Mas o bem moral (ou a correção) não é o único tipo de bem; assim, a questão é saber como distinguir entre o moral e o não moral. Esta questão é objeto de discussão. Algumas respostas são em termos de "conteúdo". Uma opinião é que as preocupações morais são unicamente as que se relacionam com o sexo. Mais plausível é a sugestão de que as questões morais são unicamente as que afetam outras pessoas. Mas há teorias (Aristóteles, Hume) que considerariam que mesmo esta demarcação é excessivamente redutora. Outras respostas fornecem um critério "formal": por exemplo, que as exigências morais são as que têm origem em Deus, ou que as exigências morais são as que derrotam quaisquer outros tipos de exigências ou, ainda, que os juízos morais são universalizáveis. 

A palavra latina "moralis", que é a raiz da palavra portuguesa, foi criada por Cícero a partir de "mos" (plural "mores"), que significa costumes, para corresponder ao termo grego "ethos" (costumes). É por isso que em muitos contextos, mas nem sempre, os termos "moral/ético", "moralidade/ética", "filosofia moral/ética" são sinónimos. Mas as duas palavras têm também sido usadas para fazer várias distinções:

1. Hegel contrasta a "Moralität" (moralidade) com a "Sittlichkeit" ("eticalidade" ou vida ética). Segundo Hegel, a moralidade tem origem em Sócrates e foi reforçada com o nascimento do cristianismo, a reforma e Kant, e é o que é do interesse do indivíduo autônomo. Apesar de a moralidade envolver um cuidado com o bem-estar não apenas de si mas também dos outros, deixa muito a desejar por causa da sua incompatibilidade potencial com valores sociais estabelecidos e comuns, assim como com os costumes e instituições que dão corpo e permitem a manutenção desse valores. Viver numa harmonia não forçada com estes valores e instituições é a "Sittlichkeit", na qual a autonomia do indivíduo, os direitos da consciência individual, são reconhecidos mas devidamente restringidos;

2. De modo análogo, alguns autores mais recentes usam a palavra "moralidade" para designar um tipo especial de ética. Bernard Williams (Ethics and the Limits of Philosophy, 1985), por exemplo, argumenta que "a instituição da moralidade" encara os padrões e normas éticas como se fossem semelhantes a regras legais, tornando-se por isso a obediência ao dever a única virtude genuína. Esta é uma perspectiva que, na sua opinião, deve ser abandonada a favor de uma abordagem da vida ética menos moralista e mais humana e sem restrições; 

3. Habermas, por outro lado, faz uma distinção que está também implícita na "Teoria da Justiça" de Rawls entre ética, que tem a ver com a vida boa (que não é o mesmo para todas as pessoas), e a moralidade, que tem a ver com a dimensão social da vida humana e portanto com princípios de conduta que podem ter aplicação universal. A ética ocupa-se da vida boa, a moralidade da conduta correta. 

Ética e Moral de MAUTNER, Thomas. Tradução e adaptação de Desidério Murcho Retirado de "Dictionary of Philosophy", org. por Thomas Mautner (Penguin, 2005) Copyright © 1997-2005 criticanarede.com, ISSN 1749-8457,disponível em: https://eticapublica.furg.br/

É importante ressaltar que tanto Ética quanto Moral, são conceitos que significam etimologicamente COSTUME. Toda sociedade tem seus costume próprios e obviamente esses costumes estão diretamente ligados a VALORES. Confira esses exemplos de Costumes em diferentes sociedades: VEJA COMO AS PESSOAS SE CUMPRIMENTAM EM 10 PAÍSES DIFERENTES.

Já foi demonstrado que os valores morais diferem de acordo com o grupo social. A moral se refere a valores e impõe regras de convívio sendo, porém, conectada a uma cultura, a uma sociedade, a um grupo de pessoas, por exemplo o 'católicos'. Assim, os grupos predominantes acabam por influir nos valores vivenciados por toda a Sociedade, valores esses disseminados por meio da cultura e amarrados na legislação de um país. 

Por exemplo, a rejeição à prática do aborto, que no Brasil é influenciada por grupos religiosos cristãos acabou por fundamentar a criminalização da prática do mesmo no país. Por isso há um tabu e quando querem discutir a descriminalização e legalização do aborto, então aparecem os conflitos.

Um outro exemplo para simplificar a compreensão de como os valores morais mudam de um grupo social para outro, é o dos casamentos. 'É perfeitamente legal ter várias esposas em mais de 50 países. Em outros 20, a poligamia não está nas leis, mas é culturalmente aceita'. E uma das grandes influências é novamente da religião e a legislação também é influenciada, caso um homem não pratique a poligamia pode acabar na cadeia (Leia mais aqui). Aqui no Brasil é justamente o contrário. O valor que prevalece é o do casamento monogâmico. Caso um homem viva em situação de bigamia pode responder processo e ser punido com reclusão (Leia mais aqui).

Os valores morais dão uma harmonia e organização à vida social. São adquiridos de forma natural, na maioria das vezes são praticados de forma acrítica. Porém, as mudanças pelas quais passam as culturas, que são dinâmicas, ao longo dos anos, tendem trazer muitos conflitos. 

Esses conflitos aumentam ao passo que a diversidade ganhe mais e mais espaço na sociedade centrada nos valores éticos que compõe a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (baixe aqui em PDF)

Como os valores morais muitas vezes estão engessados historicamente pela predominância de certos grupos - e o religioso é um ingrediente, os conflitos são inevitáveis. Daí a necessidade da reflexão ética a fim de encontrarmos, no que tange aos valores sociais, a harmonia requerida para o bom funcionamento da sociedade.

Os valores morais vivenciados nos grupos humanos de uma sociedade influencia diretamente a Cultura e ao mesmo tempo é produto dela. É pela cultura de uma sociedade que mais facilmente percebemos os valores latentes de um determinado povo. Esses valores influenciarão ainda a formulação das leis que visarão punir os transgressores. 

O antropólogo e professor emérito da Universidade de Brasília, Laraia (2001), lembra que na atualidade, há um entendimento geral nos meios acadêmicos de que a cultura é um produto humano resultado de milênios, ou séculos, ou anos, de acúmulo de experiências compartilhadas por uma diversidade de grupos humanos interagindo entre si. Logo, se a cultura é compartilhada, é por meio de processos de aprendizagem. Portanto, se a cultura é produto humano, então é histórico-social o processo de sua constituição. 

Para Laraia, a cultura é criação coletiva voltada para a comunidade e que ajuda na instrumentalização dos indivíduos para viverem em sociedade

O modo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos sociais e mesmo as posturas corporais são assim produto de uma herança cultural, ou seja, o resultado da operação de uma determinada cultura. [...] indivíduos de culturas diferentes podem ser facilmente identificados por uma série de características, tais como o modo de agir, vestir, caminhar, comer, sem mencionar a evidência das diferenças linguísticas, o fato da mais inédita observação empírica (LARAIA, 2001, p.68).

Quando Laraia (2001) adverte que a cultura é uma “herança” isso nos possibilita a compreensão de que a cultura é um elemento essencial nas formas de pensar e agir de homens e mulheres. A cultura é uma necessidade, pois para viver em sociedade o indivíduo precisa aprender sua cultura local marcada por língua (s) específica (s), modos de vida, formas de pensar, valores que orientarão sua conduta e, até mesmo, a crença religiosa, dentre outros aspectos.

Corroborando com esse entendimento de Laraia (2001) temos Laplantine, que é um pesquisador francês em etnologia e em antropologia, para quem é difícil conceber uma definição que seja absolutamente satisfatória para cultura. Laplantine (2003), tenta oferecer uma definição a partir da distinção entre o “social” e a “cultura”:

O social é a totalidade das relações (relações de produção, de exploração, de dominação...) que os grupos mantêm entre si dentro de um mesmo conjunto (etnia, região, nação...) e para com outros conjuntos, também hierarquizados. A cultura por sua vez não é nada mais que o próprio social, mas considerado dessa vez sob o ângulo dos caracteres distintivos que apresentam os comportamentos individuais dos membros desse grupo, bem como suas produções originais (artesanais, artísticas, religiosas...). [...] trata-se do social tal como pode ser apreendido através dos comportamentos particulares dos membros de uma determinada cultura, de pensar, de encontrar, trabalhar, se distrair, reagir frente aos acontecimentos (por exemplo, o nascimento, a doença, a morte).[...] a cultura é o conjunto dos comportamentos, saberes e saber-fazer característicos de um grupo humano ou de uma sociedade dada, sendo essas atividades adquiridas através de um processo de aprendizagem, e transmitidas ao conjunto de seus membros (LAPLANTINE, 2003, p. 95-96). 

Compreender essa dinâmica em que se dá a aquisição dos conhecimentos acumulados e socializados ao longo da história, nos possibilitará pensar a realidade cotidiana desde seu micro espaço, onde os sujeitos estão inseridos, bem como em seu macro espaço, para onde os sujeitos se projetam. 

A cultura como aprendizagem nos permite significá-la como objeto dinâmico. A cultura tem um enorme potencial humanizador, porém, também é verdadeiro dizer o contrário. Laraia (2001) esclarece que o conhecimento em conexão à cultura tem o poder de humanizar o homem por meio da liberdade, do respeito, da livre expressão, do convívio entre iguais e diferentes, da justiça e equidade.

Mas, se a Cultura é dinâmica poderíamos dizer que os Valores Morais sendo dinâmicos também estariam abertos às mudanças dos tempos. Sim e não. Os conflitos acontecem justamente pelo fato de que os valores não andam no mesmo compasso da Cultura. A Cultura molda-se em novos valores colocando em questão a vitalidade dos valores tradicionais. Conciliar esses valores tradicionais com os valores de um novo tempo, é uma tarefa para a Ética. 

Para compreender essas mudanças recordo que as pessoas, em geral, são detentoras de valores internalizados que regem as suas ações frente a diversas situações. Chamamos de moral esse conjunto de valores que molda o comportamento dos indivíduos. A ética é uma disciplina que aplica o método crítico e reflexivo, próprio da filosofia, ao estudo da moral. A ética também é uma necessidade que o indivíduo tem ao fazer suas escolhas diante das situações da vida. Um sujeito por agir pelo costume moral ao qual está coagido culturalmente, ou pode agir de maneira mais livre ao questionar e optar agir de uma forma e não de outra. A Ética está sempre centrada na Dignidade da Pessoa Humana. 

As mudanças culturais ocorrem não apenas de forma consciente, por meio da luta política, mas também por meio das mudanças dos arranjos sociais para se adaptarem às necessidades do tempo. 

Com as transformações ocorridas nas últimas décadas com os resultados advindos da união entre ciência e tecnologia e as ameaças advindas da exploração da Natureza e disputas pelo poder entre as grandes potências, fizeram com que surgisse uma nova grande área de investigação para a Ética, a Ética aplicada. A Ética pode ser compreendida em dois grandes grupos. 

Ela pode ser Geral e caracteriza-se por ser mais abrangente e/ou mesmo normativa, faz a investigação, análise e estudos das normas e moralidades (e códigos morais) que orientam a sociedade como um todo - preceito, regras, legislações – absorvendo a peculiaridade cultural, espacial e histórica de cada sociedade, em busca de valores universais. 

A Ética Aplicada é uma área recente da filosofia moral e pode também ser subdividida em vários frentes Ecoética, Bioética, Ética Profissional e outras, é mais restrita que a primeira, procura fazer reger os códigos de ética para determinada categoria e setor social e discutir problemas éticos ligados diretamente às Dignidades da Pessoa Humana e da Natureza. Uma diversidade de temas são abrangidos pela Ética Aplicada: O tratamento nocivo dado pelo homem à natureza, o problema do consumismo; aborto,  eutanásia, eugenia, suicídios, genocídios, também são tema em questão; a utilização de animais em alimentação e experimentos científicos, o maus tratos com animais; as desigualdades sociais e muitos outros.

Para finalizar gostaria de fazer uma distinção mais simples: 

Ética está relacionada à reflexão e estudos, é individual ou exercida por grupos de pessoas que buscam refletir sobre dado tema Moral e Social, a ética está voltada mais para o bem de toda a sociedade buscando a diversidade que marca sua totalidade.  A Ética é crítica, universal. 

Já a Moral é mais particular, é herdada, aprendida desde os seios da família e da sociedade ao longo de nosso desenvolvimento. Geralmente as pessoas vivem os valores morais por medo de transgressão e possíveis punições. Os valores referem-se mais diretamente a grupos determinados da sociedade e podem variar de grupo a grupo.

A Ética e a Moral lidam, por exemplo, com o valor do RESPEITO AO PRÓXIMO. Mas de formas diferentes. Na Moral é um respeito 'vassalo', portanto, mais limitado, podendo inclusive a ações anti-éticas. Na Ética é um respeito pensado, livre e, portanto, muito mais aberto à solidariedade. Ou seja, o mesmo que dizer: Não preciso ser mulher para me juntar a elas e lutar por igualdade de gênero; não preciso ser LGBTTQ para me juntar a eles e lutar contra a Homo-Lesbo-bi-Trans-FOBIA; não preciso ser negro para lutar contra o Racismo e por igualdade Étnico-Racial; e assim por diante.

Outras referências: 

LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 14. ed. Rio de janeiro: Jorge Zahar editor, 2001.

LAPLANTINE, François. Aprender antropologia. Trad. De Marie-Agnès Chauvel. São Paulo: Brasiliense, 2003.

UM PROBLEMA CHAMADO BOLSONARO!!!

Desgoverno, exatamente isso! E olha que não foi a oposição quem fez essa crítica. Foi o próprio Bolsonaro quem disse, quando foi lamber as botas do Trump recentemente nos EUA, afirmando que veio para ''Desconstruir' (Leia mais aqui) e não construir. O problema é todos nós sabemos que ele não tem a mínima capacidade para construir nada, como também ele mesmo já reconheceu! Portanto, ficarão apenas os escombros de uma Brasil que  num passado recente de Lula e Dilma, era respeitado lá fora e tinha seu povo dentre os mais felizes do mundo!

É muito difícil acompanhar a seleção de pérolas  proferidas por esse que está presidente do gigante sul americano, como nos chamam os nossos vizinhos da América do Sul. No Chile, onde está na companhia do Sebastián Piñera, da direita, recebeu muitas manifestações de repúdio, por ser identificado como um apologista da ditadura e da tortura. Seus discursos incomodaram e muito aos chilenos que ainda carregam na memória as atrocidades da ditadura de Pinochet e que veem, dia a dia, o Judiciário andino condenando militares ou ex-militares que participaram dessa triste história. Mas foi por lá que Bolsonaro soltou mais uma pérola contra o povo brasileiro: "Tenho dito à equipe econômica que na questão trabalhista nós devemos beirar a informalidade porque a nossa mão-de-obra é talvez uma das mais caras do mundo", declarou o presidente, durante café da manhã com empresários no Chile neste sábado 23 (Leia mais aqui).




Completamente despreparado para comandar, Bolsonaro joga o país em uma sucessão de crises intermináveis que custam muito caro para a vida econômica do país. Todos os setores da sociedade já demonstram saturação. Inclusive a população, aquela parcela ludibriada pelo ódio contra o PT - Partido dos Trabalhadores, por Fake News da fábrica bolsonariana, começa a abandonar o MITÔmano, segundo pesquisas recentes. Apenas os fanáticos ainda seguem defendendo o clã bolsonaro. Mas a realidade impõe-se. Em todos os setores da vida nacional, começam a se levantar opiniões contrárias à continuidade do governo Bolsonaro; um dos mais sensíveis onde já se fala abertamente sobre a queda do presidente é o econômico-financeiro; "Em menos de três meses de governo, às vezes parece que estamos falando de um mandato que está terminando", diz o Sérgio Vale, mestre em economia pela USP e pela Universidade de Wisconsin, economista-chefe da consultoria MB Associados. (Leia mais aqui: Vozes-do-mercado-já-falam-em-queda-de-Bolsonaro.).

Em alguns dias aprontou muito: possibilidade de importação de trigo dos EUA sem tarifas; permissão das entradas de norte-americanos no Brasil sem a necessidade de vistos; entrega da base de Alcântara aos americanos; disse que  imigrantes brasileiros ilegais nos EUA  são uma vergonha; Brasil votou contra a Palestina na ONU e provavelmente sofrerá retaliações econômicas dos árabes - e é bom lembrar que desastre mesmo será sua visita à Israel daqui uns dias; afirmou que filhos de beneficiários do 'Bolsa Família' possuem capacidade intelectual menor... De falácia em falácia, e decisões idiotas como governante, vai derretendo nas pesquisas. Nem mesmo os golpistas donos do capital e a mídia podre do Brasil, aguentam mais administrar tanta desinteligência em uma única pessoa.

Que situação! O presidente brasileiro é uma vergonha mundial! Os parlamentares da bancada progressista norte-americana Mark Pocan, Pramila Jayapal, Ro Khanna, Ilhan Omar e Raúl M. Grijalva enviaram uma carta ao secretário de Estado, Mike Pompeo, condenando Donald Trump por ter recebido e feito elogios ao presidente brasileiro Jair Bolsonaro, informa O Globo; na carta, eles relatam preocupação com Bolsonaro, que "tem uma longa história de discurso de ódio homogêneo, misógino e racista, elogiou a tortura e expressou admiração pela ditadura militar do Brasil, e prometeu proteger as proteções para a Amazônia e suas comunidades indígenas" (Leia mais aqui)

E saber que Lula e Dilma fizeram do Brasil um país respeitado em todo o mundo! (Leia mais aqui).

O melhor artigo que li hoje, e recomendo, fazendo uma análise de conjuntura do trágico momento político vivenciado por todos nós, foi o de Florestan Fernandes Jr. no site Brasil247, intitulado 'Bolsonaro pode provar do próprio veneno'. 

A pergunta que todos devem estar se fazendo hoje, menos de três meses após a posse do capitão, é por que, diabos, generais de alta patente embarcaram na campanha de Jair Bolsonaro? Todos tinham conhecimento do desequilíbrio emocional e da falta de estatura intelectual do candidato do PSL para a presidência da República. Todo o alto comando do Exército sabia dos motivos que levaram à expulsão de Bolsonaro da Escola de Oficiais. 

Em 1988, o então tenente respondeu a 11 inquéritos no Supremo Tribunal Militar. Um deles era por ter proposto explodir bombas em quarteis do Exército no Rio para protestar contra os baixos salários das tropas. "Serão apenas explosões pequenas, para assustar o ministro. Só o suficiente para o presidente José Sarney entender que o Leônidas Pires Gonçalves (ministro do Exército na época) não exerce nenhum controle sobre a tropa", disse uma esposa de oficial à repórter da Veja que fez a matéria sobre a ação nomeada de "Beco sem Saída". Na mesma reportagem, Bolsonaro diz: "temos um ministro incompetente e até racista". 

Por conta da indisciplina, Bolsonaro ficou 15 dias preso. Foi para a reserva como herói das polícias do Rio. Seu discurso tosco encontrou ressonância não só nos quartéis, mas também nas empresas de segurança privada comandadas por policiais aposentados e ex-policiais que controlam as milícias nas periferias. Um apoio que ajudou a elegê-lo e também a colocar na política seus filhos e sua ex-mulher.

Leia o artigo completo! Vale a pena! 

quinta-feira, 21 de março de 2019

A FILOSOFIA NO MUNDO, por Karl Jaspers

Qual o papel da filosofia?
Ensina, pelo menos, 
a não nos deixarmos iludir


Atitude da filosofia frente ao mundo
1. Seja a filosofia o que for, está presente em nosso mundo e a ele necessariamente se refere. Certo é que ela rompe os quadros do inundo para lançar-se ao infinito. Mas retorna ao finito para aí encontrar seu fundamento histórico sempre original.

Certo é que tende aos horizontes mais remotos, a horizontes situados para além do mundo, a fim de ali conseguir, no eterno, a experiência do presente. Contudo, nem mesmo a mais profunda meditação terá sentido se não se relacionar à existência do homem, aqui e agora.

A filosofia entrevê os critérios últimos, a abóbada celeste das possibilidades e procura, à luz do aparentemente impossível, a via pela qual o homem poderá enobrecer-se em sua existência empírica.

A filosofia se dirige ao indivíduo. Dá lugar à livre comunidade dos que, movidos pelo desejo de verdade, confiam uns nos outros. Quem se dedica a filosofar gostaria de ser admitido nessa comunidade. Ela está sempre neste mundo, mas não poderia fazer-se instituição sob pena de sacrificar a liberdade de sua verdade. O filósofo não pode saber se integra a comunidade. Não há instância que decida admiti-lo ou recusá-lo. E o filósofo deseja, pelo pensamento, viver de forma tal que a aceitação seja, em princípio, possível.

Atitude do mundo frente à filosofia 
2. Mas como se põe o mundo em relação com a filosofia? Há cátedras de filosofia nas universidades. Atualmente. representam uma posição embaraçosa. Por força da tradição, a filosofia é polidamente respeitada, mas, no fundo, objeto de desprezo. A opinião corrente é a de que a filosofia nada tem a dizer e carece de qualquer utilidade prática. É nomeada em público, mas — existirá realmente? Sua existência se prova, quando menos, pelas medidas de defesa a que dá lugar.

A oposição se traduz em fórmulas como: a filosofia é demasiado complexa; não a compreendo; está além de meu alcance; não tenho vocação para ela; e, portanto, não me diz respeito. Ora, isso equivale a dizer: é inútil o interesse pelas questões fundamentais da vida; cabe abster-se de pensar no plano geral para mergulhar, através de trabalho consciencioso, num capítulo qualquer de atividade prática ou intelectual; quanto ao resto, bastará ter “opiniões” e contentar-se com elas.

A polêmica torna-se encarniçada. Um instinto vital, ignorado de si mesmo, odeia a filosofia. Ela é perigosa. Se eu a compreendesse, teria de alterar minha vida. Adquiriria outro estado de espírito, veria as coisas a uma claridade insólita, teria de rever meus juízos. Melhor é não pensar filosoficamente.

E surgem os detratores, que desejam substituir a obsoleta filosofia por algo de alegre e totalmente diverso. Ela é desprezada como produto final e serviçal de uma teologia falida. A insensatez das proposições dos filósofos é ironizada. E a filosofia vê-se denunciada como instrumento servil de poderes políticos e outros.

Muitos políticos vêem facilitado seu nefasto trabalho pela ausência da filosofia. Massas e funcionários são mais fáceis de manipular quando não pensam, mas tão-somente usam de uma inteligência de rebanho. É preciso impedir que os homens se tornem sensatos. Mais vale, portanto, que a filosofia seja vista como algo entediante. Oxalá desaparecessem as cátedras de filosofia. Quanto mais vaidades se ensinem, menos estarão os homens arriscados a se deixar tocar pela luz da filosofia.

Assim, a filosofia se vê rodeada de inimigos, a maioria dos quais não tem consciência dessa condição. A auto-complacência burguesa, os convencionalismos, o hábito de considerar o bem-estar material como razão suficiente de vida, o hábito de só apreciar a ciência em função de sua utilidade técnica, o ilimitado desejo de poder, a bondade dos políticos, o fanatismo das ideologias, a aspiração a um nome literário — tudo isso proclama a antifilosofia. E os homens não o percebem porque não se dão conta do que estão fazendo. E permanecem inconscientes de que a antifilosofia é uma filosofia, embora pervertida, que, se aprofundada, engendraria sua própria aniquilação.

A filosofia deseja a verdade
3. O problema crucial é o seguinte: a filosofia aspira à verdade total, que o mundo não quer. A filosofia é, portanto, perturbadora da paz. E a verdade o que será? A filosofia busca a verdade nas múltiplas significações do ser verdadeiro segundo os modos do abrangente. Busca, mas não possui o significado e substância da verdade única. Para nós, a verdade não é estática e definitiva, mas movimento incessante, que penetra no infinito.

No mundo, a verdade está em conflito perpétuo. A filosofia leva esse conflito ao extremo, porém o despe de violência. Em suas relações com tudo quanto existe, o filósofo vê a verdade revelar-se a seus olhos, graças ao intercâmbio com outros pensadores e ao processo que o torna transparente a si mesmo.

Quem se dedica à filosofia põe-se à procura do homem, escuta o que ele diz, observa o que ele faz e se interessa por sua palavra e ação, desejoso de partilhar, com seus concidadãos, do destino comum da humanidade.

Eis por que a filosofia não se transforma em credo. Está em contínua luta consigo mesma.

4. A dignidade do homem reside em perceber a verdade. Só a verdade o liberta e só a liberdade o prepara, sem restrições, para a verdade. É a verdade o significado último para o homem no mundo? É a veracidade o imperativo último? Acreditamos que sim, pois a veracidade sem reservas, que não se perde em opiniões, coincide com o amor.

Nossa força está em agarrarmos os fios de Ariadne que a verdade nos lança. Mas a verdade só é a verdade total. É preciso que a verdade múltipla seja levada a convergir para a unicidade. Jamais chegamos a possuir essa verdade integral. Eu a nego quando vou ao extremo da afirmação, quando erijo o que sei em absoluto. Eu a nego também quando tento sistematizá-la em um todo, porque a verdade total não existe para o homem e porque essa ilusão o paralisa.

Todo aquele que se dedica à filosofia quer viver para a verdade. Vá para onde for, aconteça-lhe o que acontecer, sejam quais forem os homens que ele encontre e, principalmente, diante do que ele próprio pensa, sente e faz — está sempre interrogando. As coisas, as pessoas e ele próprio devem tornar-se claros a seus olhos. Ele não se afasta de seu contato. Ao contrário, a ele se expõe. E prefere ser desgraçado em sua busca da verdade a ser feliz na ilusão.

Faz-se preciso que o que é se ponha manifesto.

É possível certa confiança, mas não a certeza. A verdade, mesmo quando nos abate, revela — se for realmente a verdade — aquilo que nos salva. E produz-se o milagre da filosofia: se recusarmos todos os enganos, afastarmos todos os véus, se expusermos à luz todas as insinceridades, se nos obstinarmos a avançar de olhos abertos, sujeitando nossas críticas a outras críticas, essa crítica terminará por não ser destruidora. Muito ao contrário, veremos, por assim dizer, revelar-se o próprio fundamento das coisas onde vemos luz, como um restaurador vai-se apercebendo de um Rembrandt por sob a pintura posterior que o escondia.

E se a luz não se revelar? Se, ao fim, o homem descobrir a máscara de Górgona e vir-se transformado em pedra? Não temos o direito de olvidar que isso é suscetível de acontecer. A filosofia se expõe a abismos diante dos quais não deve fechar os olhos, assim como não pode esperar que desapareçam por encanto. Torna-se mais clara do que nunca a questão que, desde o início, se pôs para o homem. O “sim” para a vida é a grande e bela aventura, porque permite a realização da razão, da verdade e do amor. O “não” à existência, traduzido pelo suicídio, é a realidade para homens diante de cujo segredo permanecemos calados. Põe-se fronteira que não temos o direito de esquecer.

5. A filosofia se destina ao homem enquanto homem ou apenas a uma elite fechada em si mesma? Para Platão, poucos homens são aptos para a filosofia e só adquirem tal aptidão após longos anos de estudos. Há dois tipos de vida na Terra, disse Plotino, um próprio dos sábios e o outro da massa dos homens. Também Espinosa só espera filosofia do homem excepcional. Kant, porém, acredita que a rota por ele traçada pode tornar-se um caminho real: a filosofia aí está para todos. E seria mau se fosse diferente. Os filósofos não passam de elaboradores e guardiões de atas, onde tudo deve estar justificado com precisão máxima.

Contra Platão, Plotino, e quase toda a tradição, acompanhamos Kanl. Trata-se de uma decisão filosófica de grande alcance para a atitude interior do filósofo. Corresponde a uma recusa de se prostrar-se diante da realidade; foi assim até agora e assim é hoje; mas não deve permanecer assim e assim não continuará. Dar-se-ão ouvidos a exigências do homem como homem, exigências frequentemente ocultadas e reduzidas de importância, afastadas e negligenciadas. A decisão cabe a cada indivíduo.

Estaremos, talvez, transformando em virtude a trágica ausência de unia filosofia genial em nosso tempo? Não, a experiência de nossa própria mediocridade, do homem que, embora simples homem, pode compreender os grandes homens do passado, apropriar-se do que realizaram, aproximar-se deles, cheio de respeito, mas sem divinizá-los — essa experiência é encorajadora. O que está a nosso alcance está ao alcance de todos ou de quase todos, bastando que verdadeiramente o queiram.

Há, na História, uma grande exceção. Os padres da Igreja cristã considerando que lhes tocava o dever de enunciar a salvação e de praticar obras de amor, dirigiam-se a todos os homens. E encontravam um argumento contra os filósofos gregos no fato de estes só se dirigirem aos eleitos: Lema da Igreja foi: ninguém que deseje crer está excluído.

Aquilo que se revela, a plena claridade, nos sublimes pensamentos dos eleitos está contido na fé mais simples. Contudo, tal solicitude pelas massas é ambivalente: deseja dominá-las e, ao mesmo tempo e no interesse de dominá-las, tolera a mentira e a superstição e se envolve no político. Em razão disso, esse grande exemplo histórico não nos pode servir de modelo.

Outro inimigo da filosofia independente e, portanto, da liberdade do homem é o pensamento pretensamente democrático. Há razão em proclamar: o que não convém a todos deve, um dia, desaparecer. O que não desperta qualquer eco é, a priori, desprovido de realidade. Mas é errôneo afirmar: sabemos qual seja essa realidade; o que hoje é, sempre será; o que não atua agora, jamais atuará; o homem não se modifica. Antes, caberia dizer: o que ainda está isolado poderá expandir-se; o que hoje não encontra eco poderá encontrá-lo amanhã; e, principalmente, o que é real para reduzido número de pessoas poderá tornar-se a realidade suprema de uma época e, sob tal forma, perpetuar-se; o que ainda não atingiu as massas poderá penetrá-las no futuro.

Para libertar-se é inevitável que a verdade desça às massas, ao burburinho sonoro e confuso dos homens. A alternativa seria o domínio sobre as massas, a censura, a educação padronizada. E os seres humanos se tornariam matéria-prima para os déspotas.

Na incerteza, uma só coisa permanece: crer na possibilidade de liberdade humana e, alimentando essa crença, conservar-se ligado à Transcendência, sem a qual aquela convicção soçobraria.

6. Continua-se a afirmar que, no mundo, a filosofia está consciente de sua impotência. Desperta poucas respostas e não dispõe de nenhum poder de modelar o mundo; não é, de maneira alguma, um fator da História. Assim pareceu até agora.

Mas a filosofia está longe de ser impotente no que diz respeito ao indivíduo. Aí. ela constitui, muito ao contrário, a grande força que leva o homem a encontrar o caminho para a liberdade. Só ela possibilita a independência interior. Ganho essa independência exatamente quando e onde pareço completamente dependente, ou seja, quando reconheço que — em minha liberdade, em meu amor, em minha razão — fui dado a mim mesmo. Nenhuma dessas coisas está sob meu poder, eu não as faço surgir. Mas tudo quanto eu fizer surgir delas derivará.

Se atinjo o ponto em que sou dado a mim mesmo, distancio-me de rodas as coisas e, inclusive, de mim. Como que de um plano de observação externo a mim — em verdade, inatingível — contemplo o que acontece e o que faço. É como se me fosse preciso atingir aquele plano para mergulhar na realidade histórica. De lá jorra a luz que faz crescer minha liberdade interior. Torno-me independente na medida em que vejo as coisas a essa luz.

Essa independência é uma quietude, sem violência e sem orgulho. Tanto menos soberba quanto mais segura de si mesma. Evidencia-se permanecendo em obscuridade.

Na independência, a liberdade não permanece vazia. Limitar-se a si mesmo não seria independência. A independência quer participar do mundo. Age. Ouve e responde aos apelos da sorte. Não foge às exigências do dia. Quando o destino parece deter as rédeas, ousa envolver-se em situações de risco, na esperança de vir a dominá-las.

Não obstante, aceita sempre critérios que não pode trair porque provêm de sua mesma origem. Traí-los seria aniquilar-se.

7. A independência do filósofo torna-se falsa quando se mescla de orgulho. No homem autêntico, o sentimento de independência sempre se acompanha do sentimento de impotência, o entusiasmo de poder sempre se acompanha do desespero de não poder, a esperança sempre se acompanha de um olhar lançado ao fim. Filosofar dá-nos lucidez total acerca das várias formas de nossa dependência, mas de maneira tal que, em vez de permanecermos esmagados por nossa impotência, encontramos, a partir de nossa independência, meio de recuperação. 

Eis dois exemplos de como isso ocorre no pensamento:

a) O quantitativo tem predominância sobre o qualitativo. O universo, no seio do qual, a Terra, com todos os seus habitantes, não passa de um grão de poeira, tem predominância sobre nosso planeta. Na hierarquia em que figuram matéria, vida, alma e espírito, cada um dos estágios tem predominância sobre o seguinte. Ao fim, é a massa que tem preeminência. Diante dela, o indivíduo não conta. Só conta o universo, a matéria, a massa, o que tem peso.

Invertamos, porém, a escala de valores: o que há de mais precioso no universo é o homem; na hierarquia das realidades, é o espírito; entre as massas, o indivíduo como ele próprio; entre as obras da natureza, as criadas pela arte humana. Se julgamos as coisas de maneira diversa, é por sucumbirmos à tentação do quantitativo e renunciarmos ao senso do humano.

b) O conjunto da História que ninguém pode conhecer, que não precisamos imaginar necessariamente como uma totalidade — avassala-nos. O indivíduo sente-se indefeso. Tudo o que ele é, é determinado por aquele conjunto. E ele deve curvar-se.

Entretanto, o que se passa com a humanidade passa-se como resultado das forças ínfimas de bilhões de indivíduos. Cada um é responsável pelo que faz, pela maneira como vive. Parece-nos que a História não tenha sentido, mas ela está penetrada de razão. E essa razão depende de nós. Permanece, porém, o fato de que diretamente real para nós é o meio que, de imediato, nos cerca. Nosso primeiro dever é para com ele.

Quando nos desesperamos do futuro, porque não podemos orientar o curso dos acontecimentos, ou quando nos exaurimos em clamores vãos, como se disso dependesse o movimento do universo, estamos esquecendo o que nos toca mais de perto. Afirmamo-nos na realidade desse pequeno mundo que nos cerca. E, através dele, participamos do conjunto.

8. Na época atual, fazemo-nos conscientes de nossa impotência divisando-lhe um ângulo novo. Todos sabemos que a democracia é corrupta no seu operar, embora continue sendo a única via possível para a liberdade. Mais duvidoso é seu alcance entre povos em que ela não tem origem histórica própria.

Satisfazer-se com o milagre econômico é o ópio do mundo livre. O resto do mundo inveja esse milagre, mas não tem as condições capazes de propiciá-lo e lança ao mundo livre a culpa de suas desventuras.

No mundo ocidental, o econômico predomina sobre o político. E isso equivale a dizer que o Ocidente está cavando a própria cova. Nele, a liberdade política se reduz constantemente. É, com frequência, incompreendida. Assiste-se à desaparição do sentimento de liberdade e do espírito de sacrifício.

Em todo o mundo, manifestam-se tendências à ditadura militar e ao totalitarismo, pois a liberdade se degrada. Os povos se fazem presa dos poderosos.

Se continuar, a explosão demográfica levará necessariamente a uma conflagração que exterminará inúmeras vidas humanas.

Os povos de côr (mais de dois terços da humanidade) voltam-se contra os brancos, cheios de ressentimento e com determinação crescente.

A bomba atômica pesa sobre todos nós. Por algum tempo, ela continuará a impedir a grande conflagração que (não sabemos quando) provocará o aniquilamento total, se os homens continuarem a ser o que são hoje.

Até agora, quando Estados, povos ou civilizações pereciam, outros lhes tomavam o posto. Um elemento permanecia — a humanidade. Atualmente, caberia perguntar se a humanidade não está a ponto de cometer suicídio generalizado.

No ínterim, podemos gozar a vida, permanecendo, porém, ao pé do cadafalso. Ou afastamos o perigo mortal ou deveremos estar preparados para a catástrofe.

É escandalosa a tranquilidade do mundo ocidental, tranquilidade baseada na presunção de que essa agradável maneira de viver terá duração indefinida. As consequências das ilusões voluntárias de antes e após 1914 não nos terão ensinado ao que leva essa irresponsabilidade política e moral? Nossa época vive entre dois abismos. Compete-nos escolher: deixar-nos tombar no abismo da ruína do homem e do universo, com a consequente extinção de toda vida terrena, ou cobrar ânimo para nos transformarmos, dando surgimento ao homem autêntico, ante o qual se abrirão possibilidades infinitas.

9. Em tal contexto, qual o papel da filosofia?

Ensina, pelo menos, a não nos deixarmos iludir. Não permite que se descarte fato algum e nenhuma possibilidade. Ensina a encarar de frente a catástrofe possível. Em meio à serenidade do mundo, ela faz surgir a inquietude. Mas proíbe a atitude tola de considerar inevitável a catástrofe. Com efeito, apesar de tudo, o futuro depende também de nós.

Se fosse vigorosa em sua elaboração, convincente por seus argumentos e digna de fé pela integridade de seus expositores, a filosofia poderia tornar-se instrumento de salvação. Só ela tem o poder de alterar nossa forma de pensamento.

Mesmo diante do desastre possível e total, a filosofia continuaria a preservar a dignidade do homem em declínio. Numa comunidade de destinos, que se apoie na verdade, o homem encara face a face seja o que for.

Não se confunde o declínio com o nada. Em meio ao desastre, a última palavra cabe ao homem, que ama e conserva confiança incompreensível no fundamento das coisas.

Para falar sob forma de enigma: a origem de que brotaram o universo, a terra, a vida, o homem e a História encerra possibilidades que nos são inacessíveis. Enfrentando de frente o desastre, asseguramo-nos dessas possibilidades.

Fazemos uma tentativa, à qual outras hão de seguir-se, continuadamente. Mas, presentes, por um instante, nessa tentativa, o amor e a verdade atestam tratar-se de mais que uma tentativa. Uma palavra de eternidade foi pronunciada.

Nenhum pensamento suscetível de ser concretizado, nenhum conhecimento, nada de fisicamente tangível, nenhum dos enigmas por nós mencionados pode adentrar a eternidade.

Mas, para além de todos os enigmas, o pensamento penetra no silencio pleno de insondável razão.

Texto extraído da obra de JASPERS, Karl. Introdução ao pensamento filosófico. São Paulo: EDITORA CULTRIX LTDA.