“Roupa não tem importância. Moda tem. É
um documento histórico. É criação e liberdade.”
já dizia Zuzu Angel (1972).
Pode-se dizer que há dois Brasis: um antes de Zuzu (a.Z) e outro depois de Zuzu
(d.Z.).
O primeiro Brasil era conhecido no exterior, principalmente pelo café,
Copacabana, Pelé, futebol e carnaval. Mas essa mineira nascida há 75 anos na
cidade de Curvelo conseguiu, nos anos 60, o que até então nenhum costureiro
brasileiro conquistara: páginas inteiras em grandes jornais norte-americanos
como The New York Times e The New York Post.
Zuleika (Zuzu) Angel Jones
exportou muito dos seus modelos made in Brazil para os Estados Unidos,
competindo de forma amplamente vitoriosa no sofisticado campo da moda
internacional.
Ao criar seus modelos, Zuzu dizia: "Gosto que a mulher
fale, que se expresse". E isto incomodava a sociedade brasileira numa
época em que a mulher não tinha voz própria. Era o homem, o costureiro, quem
falava e impunha os seus desejos e sua estética à sua clientela feminina.
Parênteses: até 1962, ano em que foram aprovadas mudanças no Código Civil (Lei
4.121, criada pela advogada Romy Medeiros), a mulher brasileira não podia
viajar e nem ter conta em banco ou fazer uma cesariana sem autorização do
marido, que era legalmente dono do destino da mulher.
Quando seu filho, Stuart
Angel Jones, desapareceu e foi assassinado nas prisões da ditadura militar,
aquela mulher valente, audaciosa, corajosa, que enfrentava qualquer parada, se
viu impotente. Apesar de muito bem relacionada, andava às cegas e não
conseguiu sequer um esclarecimento e nenhum apoio de generais, ministros e
políticos do alto escalão do governo Emílio Garrastazu Médici.
A busca
desesperada, até mesmo obsessiva, de Zuzu Angel pelo corpo do seu Tute, apelido
familiar de Stuart a levou, inclusive, a criar um visual-denúncia, sendo, como
bem afirmou o escritor e jornalista Zuenir Ventura, "precursora das locas
de la Plaza de Mayo": passou a se vestir toda de negro, com um echarpe de
organza cobrindo os cabelos, um anjo nu rodeado por flores (uma criação de
Isidro) ornamentando o seu colo e na cintura, muitas cruzes, de todos os
tamanhos, o símbolo do martírio de Jesus Cristo, reflexo de seu martírio de
mãe, reflexo da sua via sacra, da sua peregrinação, sem pausa e sem temor, em
busca do corpo do amado filho Stuart.
Anjos machucados, anjos feridos, anjos e
tanques de guerra e manchas vermelhas foram os motivos das estampas criadas por
Zuzu Angel para denunciar, em um desfile que realizou no consulado do Brasil,
em Nova York, em 1971, o assassinato de seu filho Stuart pelo governo militar
chefiado por Emílio Garrastazu Médici.
Essa foi a primeira moda-política de que
se tem notícia. Nela, o humor e o trágico se combinavam.
Zuzu incomodou muitas
autoridades nacionais, com as denúncias políticas que fez no exterior, mais
precisamente nos EUA, país onde nasceu seu ex-marido e pai de seus três filhos:
Stuart, Hildegard e Ana Cristina.
Quando voltou ao Brasil, após ter deixado
relatórios sobre a morte de Stuart na ONU e no senado norte-americano, Zuzu
começou a ser seguida, a receber ameaças pelo telefone e teve até sua única
loja, localizada no Leblon (RJ), incendiada.
Tudo indica que sua morte em 1976
foi um assassinato com motivação política, assim está no roteiro do filme sobre
a sua vida [Título original: Zuzu Angel. Gênero: Drama - Ano: 2006. País de origem: Brasil.
Distribuidora: Warner Bros.Duração: 103 min. Classificação: 14 anos. Língua:
Português. Cor: Colorido - Som: Digital. Diretor: Sérgio Rezende. Elenco:
Patrícia Pillar, Daniel de Oli veira, Leandra Leal e Luana Piovani.], assim,
pensam duas eminentes feministas, a escritora Rose Marie Muraro e a deputada
estadual Heloneida Studart, que conviveream, de perto, com Zuzu. (Ficha técnica: http://portaldoprofessor.mec.gov.br/)
Biografia de Zuzu Angel
Zuzu Angel (1921-1976) foi uma estilista brasileira. Mãe de
Stuart Edgar Angel Jones, jovem desaparecido em 1971, durante o período da
ditadura militar no país.
Zuleika Angel Jones, conhecida como Zuzu Angel, nasceu em
Curvelo, em Minas Gerais, no dia 5 de junho de 1921. Ainda criança mudou-se com
a família para Belo Horizonte. Em seguida, morou em Salvador, na Bahia, época
em que costurava para a família. Da cidade, recebeu grande influência em seu
futuro trabalho.
Em 1940, Zuzu conheceu o americano Norman Angel Jones, com
quem se casou em 1943. No dia 11 de janeiro de 1946 nasceu o primeiro filho,
Stuart Edgar Angel Jones. O casal teve mais dois filhos, Hildegard e Ana
Cristina. Em 1947 mudou-se para o Rio de Janeiro. No final dos anos 50 começou
a trabalhar como profissional da costura. Os anos 60 o casal se separou. Em
1970, Zuzu abriu uma loja de roupas em Ipanema.
Com o tempo, Zuzu expandiu seu trabalho e chegou ao mercado
norte-americano. Foi vitrine de grandes lojas de departamento e ganhou
editoriais importantes. Chegou a ter clientes famosas, como as atrizes Kin
Novak e Joam Crawford.
Na manhã de 14 de maio de 1971, seu filho Stuart, então
estudante de economia, que era militante do Movimento Revolucionário 8 de
Outubro (MR-8), que combatia a ditadura militar que foi instalada no país em
1964, foi preso no Rio de Janeiro e levado para a Base Aérea do Galeão. A
partir do desaparecimento do filho, Zuzu transformou sua vida em uma batalha
incansável em busca de informações sobre o paradeiro do filho.
Ainda em 1971, realizou um desfile/protesto no consulado
brasileiro em Nova Iorque. Sua roupas incorporavam elementos que denunciavam a
situação política brasileira, como tanques de guerra, canhões, pássaros
engaiolados, meninos aprisionados e anjos amordaçados.
Zuzu angel denunciava à imprensa e aos órgãos internacionais
as arbitrariedades praticadas pela ditadura militar. Buscava informações sobre
o filho e queria o direito de poder sepultá-lo. Segundo o depoimento do preso
político Alex Polari, que esteve com ele no mesmo local, Stuart foi torturado,
não resistindo, vindo a falecer naquele mesmo dia.
Na madrugada do dia 14 de abril de 1976, Zuzu Angel dirigia
seu carro na Estrada da Gávea, quando na saída do túnel Dois Irmãos, em São
Conrado, Rio de Janeiro, o carro derrapou e saiu da pista, chocando-se contra a
mureta de proteção, em seguida capotando e caindo fora da pista. Zuzu teve
morte instantânea.
Depois de sua morte, Zuzu Angel recebeu diversas homenagens.
O túnel que liga o bairro de São Conrado à Zona Sul do Rio de Janeiro, onde
aconteceu o acidente recebeu o nome da estilista. Em 1993, a jornalista
Hildegard Angel criou o Instituto Zuzu Angel de Moda do Rio de Janeiro, em
memória da mãe. Em 2006, foi lançado o filme Zuzu Angel, do cineasta Sérgio
Resende, que retrata a vida de Zuzu.
Zuzu Angel faleceu no Rio de Janeiro, no dia 14 de abril de
1976.
Filoparanavaí 2020