ACESSE O ARQUIVO DO BLOG
FILOPARANAVAÍ

domingo, 5 de abril de 2020

ESTÉTICA - MARCEL DUCHAMP o ícone das vanguardas artísticas europeias do início do século XX. O precursor da arte conceitual, do dadaísmo, do surrealismo, do expressionismo abstrato e o inventor dos "ready-made"

MARCEL DUCHAMP

             Marcel Duchamp jogando xadres



Considerado um dos precursores da arte conceitual, Marcel Duchamp introduziu a ideia de ready made como objeto de arte.



Marcel Duchamp nasceu em 1887 em Blainville na Seine –Maritime. 

Em 1902, começa a pintar paisagens de Blainville. As suas primeiras obras mais importantes mostram influência de Cézanne e dos pintores fauvistes. Também foi influenciado pelo simbolismo e futurismo. É influenciado pela cronofotografia – técnica de fotografia aplicada a assuntos em movimento e que consiste na obtenção de imagens a intervalos regulares. Faz quadros de jogadores de xadrez . 

Em 1911 faz “Homem triste...” e o esboço a óleo para “Nu descendo uma escada”. A primeira pintura de uma máquina é o “Moinho de Café”.

Em 1912 pinta o “Nu descendo uma escada”, que é recusado no Salão dos Independentes. Os quadros sobre xadrez evoluem para o “Rei e a Rainha Rodeados por Nus Rápidos”. Começa a fazer anotações e a guardá-las. 

Em 1913 começa a fazer desenhos mecânicos, estudos a óleo e anotações que irão resultar na “Noiva...”. Monta uma roda de bicicleta sobre um banco de cozinha . Faz “3 Paragens padrão”. Em Nova Yorque o “Nu ...” faz escândalo e torna-o célebre. 

Em 1916 inventa o termo “readymade”. 
Em 1917 “A Fonte” é recusada no Salão dos Independentes. Com outros publica a revista de inspiração Dada “The Blind Man”. 

Em 1920, em N.Y., trabalha com Man Ray em experiências cinematográficas e nos seus objetos de ótica de precisão, como por ex. a “Placa de vidro rotativa”, que é um dispositivo com motor para fazer experiências de efeitos óticos. Surge “RroseSelavy”, duplo feminino de M.D., fotografado por Man Ray. 

Em 1934 publica a “Caixa Verde” com réplicas das anotações e de esboços. 

Em 1941 publica “Caixa numa Mala”, uma seleção representativa da sua obra através de reproduções em miniatura, contidas numa caixa desdobrável. 

Em 1945 o Museu de Arte Moderna de N.Y. compra “A passagem da Virgem à Noiva” – É a primeira vez que um museu adquire uma obra sua. 

Em 1946 começa a trabalhar nos “Dados “ que leva 20 anos a fazer. 

Em 1959 organiza com Breton a exposição Internacional do Surrealismo em Paris. 

Morre em 1968 e pede para porem na sepultura “Aliás são sempre os outros que morrem”. 

Com a Revolução Modernista nas primeiras décadas do séc.XX, há a suspensão dos valores clássicos, as pessoas no início do séc. assistem a uma mudança rápida do mundo que as rodeia – a industrialização enche o mundo de formas novas, produtos novos, e altera a paisagem. Há as descobertas das ciências micros. O real deixa de ser fixo, existindo uma outra dimensão que não nos é dada ao olhar – dimensão microscópica da realidade. Há esgotamento do realismo ótico.

Surgem as primeiras imagens mecânicas – a fotografia, o cinema, que permitiam reproduzir a realidade. Assim, o primeiro modernismo vai rejeitar a sujeição a qualquer norma representativa, a qualquer padrão clássico e temas, sendo formado por artistas chamados de vanguarda. Estes criam uma arte experimental e socorrem-se de tudo.

O Corpo artístico cada vez é mais desordenado e cada vez é maior o, esforço para organizá-lo. A primeira dificuldade em analisar a arte tem a ver com o facto de a arte ser formada por objetos que pertencem a universos diferentes . O objeto artístico serve diversas finalidades e os materiais podem ser muito diversos.

Com Francis Picabia foi um precursor importante do dadaísmo. Este nasceu em parte do desencantamento que a guerra provocou, e de uma negação dos valores aceites da arte e da literatura, que os dadaístas consideravam os produtos duma civilização decadente.

Havia espírito de protesto, de provocação. Muitos manifestos “dada” proclamavam a espontaneidade, a liberdade e a anarquia. Este movimento agitou pelo absurdo, pela ironia, pelo sarcasmo, um certo número de hábitos e de ideias preconcebidas, e suscitou algumas modificações radicais na arte e na estética.

A obra de M.D. compreende três dimensões: produção de sentidos, material do quotidiano, relação com o observador. Isola os objetos do seu contexto familiar, da sua função originária e recontextualiza-os, transformando-os noutra coisa . É sempre possível fazer uma nova interpretação das suas obras. Ele utiliza o título que joga com o próprio objeto – o urinol passou a ser chamado “ A fonte ” e tem a particularidade de ser um objeto que enquanto fonte, o seu jato de água tem o trajeto de dentro para fora e como urinol recebe o líquido num trajeto oposto. Na revista “The Blind Man” de 1917, M.D. escrevia que Mutt (assinatura da fonte) escolhera a “fonte” , tendo desaparecido o seu sentido utilitário, e que havia criado um pensamento novo para este objeto . Que Mutt tenha feito com as suas mãos o objeto, não tem importância. A obra só se completa com o espectador, realiza-se através da relação deste com o objeto. O espectador participa da obra e cria sentidos.

M.D. reunia os objetos que considerava significativos. Descontextualizando os objetos e assim fazendo criar neles novos sentidos, produz-se um efeito de instabilidade semântica, fazendo com que o objeto seja e ao mesmo tempo não seja o que parece ser, e há produção de uma série de processos mentais de memória e esquecimento. Os elementos da realidade física são apropriados e usados como material para a arte. São usados materiais provenientes de fora dos materiais tradicionais artísticos e são usados como um dos elementos do conteúdo; são manipulados como se fossem significados. Há procedimentos de construção que não cabem no princípio de organização tradicional, ou seja, na “Gestalt”. Há abandono do princípio da composição. O princípio organizativo dos elementos é a materialização de uma ideia. O sentido destas obras não está localizado no objeto para ser descoberto pelo espectador, é produzido no encontro entre este e a obra. Não têm sentido fixo, têm instabilidade de evocações que são produzidas quando são observadas; são obras “abertas”. Abalam qualquer princípio de identidade, podem ser uma coisa e outra coisa ao mesmo tempo – “são máquinas celibatárias que pedem alguém que as complete”, como diz Gilles Deleuze. Estes objetos desafiam, inquietam, e estão de acordo com Fernando Pessoa quando diz que o espectador é tão autor da obra como o próprio autor.

M. Duchamp não pretendia impor uma nova linguagem revolucionária, mas propor uma atitude de espírito.

M. Duchamp. : “não acredito na função criativa do artista. Este é um homem como qualquer outro, a sua ocupação é fazer certas coisas. A palavra “arte” vem do sânscrito, significa “fazer”. Toda a gente faz alguma coisa e aqueles que fazem coisas sobre uma tela com uma moldura são chamados artistas. Antigamente eram nomeados por uma palavra que eu prefiro: artesãos. Somos todos artesãos ”.

Não se reproduz o real, é um trabalho com fragmentos da realidade, toma uma posição na própria construção da realidade. Não são janelas sobre o mundo, ou espelhos do mundo , são partes do mundo, acrescentam ao mundo. Na relação do espectador com a obra, o recetor participa na criação da obra. A arte é uma coisa que acontece entre espectador participante e um conjunto de estímulos que age sobre ele.

Foi cartoonista e vendeu desenhos humorísticos , na maior parte dos casos provocadores e baseando-se muitas vezes em trocadilhos verbais e visuais. No início dos anos 60 tornou-se uma personalidade influente no mundo da arte. Alguns artistas recusavam-se a aceitar a sua obra incondicionalmente, como foi o caso de Joseph Beuys que afirmou que o silêncio de Duchamp era sobrestimado. Duchamp manteve durante toda a vida a atitude de não comentar as interpretações dadas à sua arte.


Duchamp pode considerar-se como tendo provocado a rotura modernista no início do séc. Ele desmaterializa a obra, todo o universo que a envolve. Faz centrar a discussão sobre o processo e não sobre o resultado da obra. Entre 1914/16, há quatro operações de alteração no seu trabalho: mudar o objeto fazia mudar o estatuto do objeto e a sua perceção (colocá-lo num museu; torná-lo peça de museu) .

Rotação espacial do objeto (urinol invertido).

Alterações do sentido (o nome do objeto remete para outra significação do objeto). Mecanismo emissor ( em vez de recetor, passou a ser emissor do sentido).

O modo como a peça surge é definidor do sentido da peça.

A partir de 1918 preocupa-se com o movimento ligado à ocupação espacial. A vulgaridade do objeto é importante no processo.

Duchamp substitui a questão do belo pela questão de ser ou não ser arte, colocada pela primeira vez no “Escorredor de Garrafas” . Duchamp retira ao objeto a funcionalidade, a manufatura e a categoria de “belo”. Levanta a questão da permissividade – qualquer um “eventualmente” pode ser artista. M.D. nunca teve um trabalho sistemático, quis romper com a sistematização. O seu trabalho está todo interligado como uma teia. Há remissões e ligações de peça para peça . Duchamp nunca passou para o estatuto do ato criativo, apenas se importou com o estatuto do objeto.

Na “Crítica da Faculdade de julgar”, Kant dizia que um juízo de gosto pode ser discutido porque existe em nós uma espécie de apetência para o “bom senso”. O sentido comum a que chegamos é o cimento da sociedade, isto é que liga as comunidades humanas. Esta interpretação de Kant permitiu a Shiller escrever as “Cartas para a educação da humanidade” e dizer que nós precisamos de uma sociedade que seja muito mais sedimentada numa educação estética, porque na educação estética existe uma espécie de tensão com tendência para o diálogo e também para o sentido comum para determinar a sua atividade. O problema posto com Duchamp, é que este divorcia a prática artística desta tentativa de encontro de um sentido comum, que era um dos fundamentos da estética da modernidade.

A aquisição da modernidade é posta pelo problema da transformação do representativo da obra, num problema referencial. As obras já não representam, mas presentificam. Presentificando têm universos de referência.


A “fonte” foi proposto como objeto artístico mas ao mesmo tempo era um objeto encontrado e transformado pela posição em que era apresentado e assinado como R. Mutt, havendo a hipótese de este ser o nome da firma que tinha fabricado a peça . O trabalho foi recusado e ficou levantada a questão da fronteira entre aquilo que é arte e o que não o é . O problema que Duchamp levantou foi o do estatuto negocial da arte; a arte não é algo colado aos objetos, não é uma essência interna dos objetos, mas é um estatuto negocial que determinado tipo de objetos tem em determinadas circunstâncias. Esse estatuto negocial que ele desnudou apresentando o urinol, de algum modo inicia um processo de separação, por um lado do universo da estética e por outro lado do universo da arte. Em relação a este objeto a única pergunta que não era admissível era sobre o juízo de gosto. Era uma pergunta sem sentido porque ele estava a cumprir num determinado momento um determinado papel na própria negociação do estatuto daquele objeto . Há pela primeira vez um divórcio entre o universo da estética e o universo da arte.

“Desde que os generais já não morrem a cavalo, os pintores já não são obrigados a morrer nos seus cavaletes” . 

CONTINUAR LENDO EM:http://aimagemcomunica

Nenhum comentário: