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FILOPARANAVAÍ

sábado, 1 de maio de 2010

A ÉTICA SOCRÁTICA E A ÉTICA PLATÔNICA



É o intelecto, a mais nobre das faculdades da Alma que leva o Ser às Virtudes e ao Bem. A política é para Platão a ciência do Bem, com o objetivo de cuidar das almas dos cidadãos da cidade através da educação

OS FUNDAMENTOS DA ÉTICA PLATÔNICA ENCONTRAM-SE NOS ENSINAMENTOS DO MESTRE SÓCRATES:


A ÉTICA DE SÓCRATES

A Ética É a parte culminante da sua filosofia. Sócrates ensina a bem pensar para bem viver. O meio único de alcançar a felicidade ou semelhança com Deus, fim supremo do homem, é a prática da virtude. A virtude adquire-se com a sabedoria ou, antes, com ela se identifica. Esta doutrina, uma das mais características da moral socrática, é consequência natural do erro psicológico de não distinguir a vontade da inteligência. Conclusão: grandeza moral e penetração especulativa, virtude e ciência, ignorância e vício são sinônimos. “Se músico é o que sabe música, pedreiro o que sabe edificar, justo será o que sabe a justiça”. Sócrates reconhece também, acima das leis mutáveis e escritas, a existência de uma lei natural – independente do arbítrio humano, universal, fonte primordial de todo direito positivo, expressão da vontade divina promulgada pela voz interna da consciência.

Para Sócrates a obediência à lei era o divisor entre a civilização e a barbárie. Segundo ele, as ideias de ordem e coesão garantem a promoção da ordem política. A ética deve respeitar às leis, portanto, à coletividade. Sua abnegação pela causa da educação do homem e do bem coletivo levou-o a se curvar ante o desvario decisório dos homens de sua época. Após gerar incômodos e burburinho entre pessoas influentes em Atenas, Sócrates recebeu uma acusação que partiu, principalmente, do poeta Meleto e do político e orador Anitos. “A acusação era grave: não reconhecer os deuses do Estado, introduzir novas divindades e corromper a juventude”. Isso significava que o pensador, já passado dos setenta anos de idade, seria julgado por um júri composto por outros cidadãos da polis, e sua pena seria definida a partir do julgamento.

Sócrates foi julgado e condenado por não se deixar levar pela ordem estabelecida, mas sempre questionar o conhecimento tido como correto.

No tribunal em que o filósofo foi julgado, a defesa ficava por conta do réu. Ao contrário do que muitos réus faziam na época, Sócrates não lançou apelos misericordiosos, utilizando sua posição social, sua família e seus filhos como meio de comover os membros do júri. Essa prática é vista pelo Direito, hoje, como uma tática falaciosa. Trata-se do argumentum ad misericordium, ou apelo para a misericórdia, que não apresenta uma estrutura lógica argumentativa, mas tenta vencer pela emoção.

Sócrates recusou tecer esse tipo de defesa por considerar que um apelo à misericórdia seria quase que uma aceitação da denúncia. Sócrates manteve-se firme em apresentar argumentos que contradissessem as falas de seus acusadores, porém essa atitude não foi suficiente para que o filósofo fosse absolvido.


Sócrates foi condenado! Poderia aceitar o exílio pagando uma multa, mas não quis, porque sua consciência consideraria esse ato uma espécie de aceitação da culpa, que ele julgava não carregar. Ficou definido, então, que sua pena seria a morte.

Como Sócrates é o fundador da ciência em geral, mediante a doutrina do conceito, assim é o fundador, em particular da ciência moral, mediante a doutrina de que eticidade significa racionalidade, ação racional. Virtude é inteligência, razão, ciência, não sentimento, rotina, costume, tradição, lei positiva, opinião comum. Tudo isto tem que ser criticado, superado, subindo até à razão, não descendo até à animalidade – como ensinavam os sofistas. É sabido que Sócrates levava a importância da razão para a ação moral até àquele intelectualismo que, identificando conhecimento e virtude – bem como ignorância e vício – tornava impossível o livre arbítrio. Entretanto, como a gnosiologia socrática carece de uma especificação lógica, precisa – afora a teoria geral de que a ciência está nos conceitos – assim a ética socrática carece de um conteúdo racional, pela ausência de uma metafísica. Se o fim do homem for o bem – realizando-se o bem mediante a virtude, e a virtude mediante o conhecimento – Sócrates não sabe, nem pode precisar este bem, esta felicidade, precisamente porque lhe falta uma metafísica. Traçou, todavia, o itinerário, que será percorrido por Platão e acabado, enfim, por Aristóteles. Estes dois filósofos, partindo dos pressupostos socráticos, desenvolverão uma gnosiologia acabada, uma grande metafísica e, logo, uma moral.



A ÉTICA DE PLATÃO 
SINTETIZADA EM DEZ DESTAQUES

1. Platão propõe uma ética transcendente, dado que o fundamento de sua proposta ética não é a realidade empírica do mundo, nem mesmo as condutas humanas ou as relações humanas, mas sim o mundo inteligível. 


2. O filósofo centra suas indagações na Ideia perfeita, boa e justa que organiza a sociedade e dirige a conduta humana. As Ideias formam a realidade platônica e são os modelos segundo os quais os homens tem seus valores, leis, moral. Conforme o conhecimento das ideias, das essências, o homem obtém os princípios éticos que governam o mundo social.

3. O uso reto da razão é entendido como o meio de alcançar os valores verdadeiros que devem ser seguidos pelos homens. Somente pelo conhecimento racional o homem pode elevar-se até as Ideias, até o Ser e conhecer a verdade das coisas. Isto se dá através do método dialético, o qual elimina as aparências e encontra as essências, a verdade no conhecimento das coisas. Este método filosófico tem por finalidade libertar os homens da ignorância e levá-los ao conhecimento de ideia em ideia, até alcançar o conhecimento da Ideia Suprema: o Bem. As outras ideias participam desta e devem sua existência a esta.


4. O Bem ilumina o ser com a verdade, permitindo que seja conhecido, assim como o Sol ilumina os objetos e permite que sejam vistos – nota-se aqui a analogia entre Bem e Sol apresentada no mito da caverna. 

5. Existem diversas ideias e é devido à participação nestas, mesmo que enquanto cópia imperfeita, que se fez possível o mundo sensível. Ao contemplar a ideia do Bem, o homem passa a sofrer as exigências do Ser, isto é, suas ações devem ser pautadas conforme a ideia contemplada.

6. A alma humana – de suma relevância para a ética platônica- é tripartite, isto é, forma-se pela inteligência, pela irascibilidade e pela concupiscência. Tal como as partes da cidade ideal, cada uma das partes da alma possui suas funções específicas que não podem ser exercidas por nenhuma das outras partes. Cada uma das partes da cidade e, por analogia, cada uma das partes da alma, possui uma função própria a qual pode ser executada com excelência ou não, e, ao executá-la com excelência, sua virtude própria é exercida.

6. A virtude é definida, pois, como capacidade de realizar a tarefa que lhe é inerente. No caso do governante da cidade e da alma racional, a virtude inerente aos mesmos é a sabedoria; no caso dos guerreiro e da parte irascível da alma, a virtude que lhes é própria é a coragem; por fim, no caso da parte concupiscente da alma e dos produtores de bens da cidade, a virtude própria é temperança. Dada a posição de cada classe, pode-se definir a justiça como cada parte fazendo o que lhe compete, conforme suas aptidões. Portanto, ao estabelecer uma relação de analogia entre a sociedade e indivíduo, Platão define o conceito de justiça – o qual seria também concebido como princípio de equilíbrio do indivíduo e da sociedade – e o liga ao conceito de virtude.

7. O sentimento de justiça é, pois, a virtude maior cujo valor ético guia as condutas dos homens. Para que esta virtude seja alcançada, o homem deve buscar o bem em si mesmo, porque ele realiza o ideal de justiça, tanto com relação ao bem individual quanto social.

8. A ética platônica ocupa-se com o correto modo de agir e sua relação com o alcance da felicidade. Contudo, o discurso ético apresentado na República acerca da felicidade relaciona esta com o conceito de justiça. O problema da justiça enquadra-se no âmbito político, o qual tem estreita relação com o campo da ética: é deste modo que surge a tese central de que só o justo é feliz. 

9. Devemos ter em mente que a virtude correspondente a cada classe da cidade e a cada parte da alma humana deve ser ensinada visando a realização do ideal da polis. Esta educação embasa-se no método dialético ascendente, o qual liberta o homem dos sentidos e o eleva até o mundo inteligível, até o ponto mais claro do Ser, a ideia do Bem. Após contemplar o Bem diretamente, o filósofo deve retornar à cidade que lhe propiciou educação de modo a guiar os outros cidadãos da ignorância ao conhecimento racional.
As ideias – das quais se originam as cópias sensíveis – são, pois, existentes em si e por si, são realidades universais, eternas, imutáveis. Por tais motivos, são os modelos a serem seguidos, são paradigmas para a construção da cidade ideal e para a educação moral, política e espiritual do homem. Além do mais, são ordenadoras do cosmos.

10. Fica evidente que a proposta de Platão liga-se, principalmente, às ideias de Justiça e do Bem – este último é o supremo valor que sustenta a justiça com relação à organização política e à conduta individual. O equilíbrio entre as três partes componentes da alma e da cidade gera equilíbrio, harmonia e leva à felicidade. Assim, Platão busca por definições gerais, universais, imutáveis, eternas, existentes por si mesmas: as Ideias. Como veremos adiante, tal busca é oposta à busca aristotélica pela virtude ligada à aplicabilidade desta.


PARA COMPREENDER MAIS...

As dificuldades que Platão encontra quando quer explicar a relação existente entre os dois planos da realidade, o sensível e o inteligível, tornam-se mais agudas no caso do homem e de seus dois componentes, imaterial e sensível. A alma e o corpo constituem para Platão dois elementos não apenas diferentes, mas opostos e irreconciliáveis.

O corpo seria a prisão da alma, sua sepultura:

Talvez estejamos realmente morrendo, como ouvi de um sábio que afirmou que nossa vida atual é uma morte, nosso corpo, uma tumba. (Platão, Górgias, 493 a)

Enquanto o homem permanecer atado ao seu corpo, ele estará tão morto, porque a essência do homem é sua alma. A raiz de todo mal, paixões, lutas, ignorância é o corpo.

A ética platônica será, portanto, condicionada por tais pressupostos e terá como objetivo libertar a alma do corpo, buscar a purificação do sensível, viver com o olhar voltado para a morte, o que possibilita iniciar a vida real.

Guerras, dissensões, batalhas, é o corpo sozinho e seus apetites que são a causa; porque só vamos à guerra para acumular riqueza e somos forçados a acumulá-la por causa do corpo, cujo serviço nos mantém em escravidão. A consequência de tudo isso é que não temos tempo de lazer para dedicar à filosofia. Mas o pior de tudo é que, mesmo que ele nos deixe algum lazer e comecemos a examinar alguma coisa, ele constantemente intervém em nossa pesquisa, lança desordem e confusão nela e nos paralisa a tal ponto que 'nos torna incapazes de discernir a verdade'. 

Portanto, é efetivamente demonstrado para nós que, se quisermos ter um conhecimento puro de alguma coisa, devemos nos separar dela e olhar apenas com a alma as coisas em si. Parece que teremos o que desejamos e fingiremos amar, sabedoria, somente após nossa morte, como prova nosso raciocínio, mas durante a vida não. (Platão, Phedon, 66 c-e)

Prazeres sensatos seriam, portanto, desprovidos de qualquer valor moral; melhor ainda, eles devem ser considerados como a antítese do bem. Por outro lado, a vida da inteligência seria a mais divina e, embora o homem não possa alcançá-la inteiramente nesta terra, ele deve buscá-la.

Nesta jornada para a vida real, o homem terá que se purificar, buscando uma verdadeira sabedoria. Na medida em que uma alma eleva problemas sucessivos do conhecimento, ela purifica, cura e torna-se virtuosa. Platão, portanto, assume o intelectualismo.  Platão concebe a razão como um impulso à beleza, à sabedoria e ao bem, à felicidade e ao absoluto.

É preciso conhecer a natureza da alma, porque a raiz do amor platônico é precisamente a memória da sua origem e nostalgia do seu destino.  Somente nesta vida as memórias e a nostalgia são possíveis.

No entanto, não se pode esquecer que o ideal ético de Platão, a vida contemplativa, é ao mesmo tempo um ideal religioso. Platão coloca a divindade na esfera do transcendente; para ele, as Ideias, como também o Demiurgo e a alma, têm um caráter divino, e a vida virtuosa como ele entende é a vida mais divina, estritamente falando.

Mas qual é a conduta agradável a Deus? Apenas um, baseado neste princípio antigo, de que o gosto agrada o seu quando ambos estão no meio; pois todas as coisas que saem desse ambiente não podem agradar um ao outro, nem aquelas que não se afastam dele. Agora Deus é para nós a justa medida de tudo, muito mais do que qualquer homem pode ser, como afirmam. Portanto, sendo Deus assim, não há outra maneira de se fazer amar do que trabalhar com todo o poder de ser assim. De acordo com esse princípio, o homem temperado é amigo de Deus, porque ele se assemelha a ele; pelo contrário, o homem intemperado, longe de se parecer com ele, se opõe inteiramente a ele; e por isso mesmo é injusto. O mesmo deve ser dito de outras virtudes e outros vícios. Esse princípio nos leva a outro, o mais belo e o mais verdadeiro de todos: saber que, por parte do homem virtuoso, é uma ação louvável e excelente, que contribui infinitamente para a felicidade de sua vida e que está completamente em ordem, fazer sacrifícios aos deuses e comunicar-se com eles através da oração das ofertas e de um culto assíduo.  (Platão, As Leis, 716 c-d).

Através das obras de Platão emerge uma doutrina das ideias que podemos dividir em duas teses: a dualidade da realidade e a imortalidade da Alma.


A dualidade da realidade
Platão nos diz que devemos distinguir o mundo das aparências sensíveis, mutáveis, ilusórias e em movimento perpétuo, do mundo inteligível, aquele no qual as ideias são eternas e imutáveis, que é de fato o mundo real; o lugar do Verdadeiro em si. O mundo das ideias é, portanto, o lugar onde os modelos se mantêm em toda a sua pureza, é o mundo do Verdadeiro e do Bem e de onde tudo procede. Em contraste com o mundo sensível, que é apenas a materialização do mundo das ideias e condenado à degradação e imperfeição. Este último mundo deve sua realidade apenas à sua participação no mundo inteligível do qual é o ser copiado, é claro que a imitação não pode ter o mesmo grau de ser que o modelo. Platão, então, distingue a realidade como ela nos parece do que realmente é. A ideia desse pensamento serve de modelo para conhecer e agir no mundo dos sentidos. Então a mesa de madeira que vejo foi obra de um artesão, a partir de um modelo ideal de mesa. Este modelo ideal da mesa provém do mundo inteligível e existe independentemente de qualquer material, é eterno e imutável e não deve ser confundido com a realidade da mesa ou de outro. Essas ideias, portanto modelos imutáveis, têm sua própria definição e essência que devem ser dissociadas de sua realização concreta no mundo sensível; essas realizações são sempre cópias imperfeitas, pois estão sujeitas à realidade do tempo, pressão, temperatura, enfim, da física.

Nesta análise, Platão distinguirá o que ele chama de impressões sensíveis, que são os movimentos causados ​​no corpo por objetos externos por meio dos sentidos, e as sensações que são os julgamentos da alma nos objetos que a cercam. Ele conclui logicamente que impressões sensíveis não levam à verdade e que somente a alma tem capacidade para alcançá-la. Tomando uma ideia de Heráclito, “você nunca tomará banho duas vezes no mesmo rio.", Platão nos faz entender que o mundo sensível está em movimento perpétuo e, portanto, não é confiável.

A Alma é, portanto, capaz de descobrir as formas de pensamento que lhe permitem exercer suas Faculdades, a mais importante das quais é o intelecto. É o intelecto, a mais nobre das faculdades da Alma que leva o Ser às Virtudes e ao Bem. E é sobre essa questão da virtude e do Bem que é articulad a filosofia política de Platão, que é a ciência por excelência. A política é para ele a ciência do Bem, com o objetivo de cuidar das almas dos cidadãos da cidade através da educação. Claramente, na cidade ideal, todos os cidadãos devem poder, de acordo com sua tarefa, subir ao mundo das ideias, a fim de descobrir o Verdadeiro, o Belo, o Bom e descer deste mundo e aplicá-lo no mundo sensível. Através da alegoria da caverna (livro VII da República, 512a-515b) Platão nos mostra a condição humana; pela boca de Sócrates, ele descreve a ignorância da humanidade que é devida à nossa educação em nossas tradições e, de fato, nos torna prisioneiros das aparências do mundo sensível. Saber, então, é libertar-se do fascínio das sombras e da imagem da caverna, da ilusão e da ignorância, e permitir que a alma se levante para compreender e contemplar o que é o verdadeiro naquele mundo perfeito das Ideias. 

A imortalidade da alma

Essa teoria, sem dúvida, exige que saibamos o que Platão define pela alma; de fato, se estamos procurando a verdade, é porque não a conhecemos, no geral nos baseamos na educação, nas experiências do mundo sensível na busca por essa verdade. No entanto, para Platão, não se pode basear-se neste mundo sensível para detectar a verdade absoluta, pois este mundo é imperfeito e cheio de ilusão, claramente o absoluto, não pode nascer neste mundo, nem o infinito no temporal. Se é assim, então como a Alma sabe que essa verdade é verdadeira, que essa beleza é bela, que essa bondade é boa? Como, então, os humanos deixarão a caverna apenas pelo poder da alma e sem primeiro sondar uma experiência pessoal ou coletiva do mundo sensível?

Em Fedo, o próprio Platão fornece respostas. Segundo ele, a alma seria imortal e, sabendo de tudo, ao se prender a um corpo, esqueceu o que sempre soube. Ligada a um corpo, a alma se esconde por trás de nossas percepções sensoriais, que são a base de toda reflexão humana. Portanto, é importante libertar a alma das restrições corporais que a impedem de acessar o caminho dialético do conhecimento das verdades inteligíveis. Isto é tão bem dito em Fédon (65d): “... Mas a alma nunca raciocina melhor do que quando nada a perturba, nem a audição, nem a visão, nem a dor, nem qualquer prazer, mas pelo contrário, ele se isola mais completamente (...) para tentar apreender o real ...


Para essa definição de alma, Platão nos diz que a alma tem três partes. E cada parte da alma tem sua função e deve ter sua virtude à qual se acrescenta uma quarta virtude que não é outra senão a síntese das três anteriores. A primeiro, o epitimia, ou desejo sensível, reside no ventre e representa o movimento da alma, que visa a satisfação da vida animal; inclui vários desejos sensíveis, dos quais os mais fortes são a fome, a sede e a sexualidade. Epitimia tem a virtude da temperança ou moderação. A esta primeira parte se acrescenta a segunda que é o nous ou a cabeça, é a parte da alma que raciocina e cujo propósito não é outro senão o autocontrole, é a que combate o apetite no homem A virtude produzida é a sabedoria e é precisamente essa sabedoria que a vincula ao bem e à verdade; Platão qualificará a sabedoria como piloto do homem. E finalmente a terceira parte, o Tymos, onde o coração reside no peito. Abrange os dois anteriores, mesmo que pareça por natureza mais próximo do primeiro. Não é tumultuado nem razoável. Dependendo da educação dada a ele, ele se combinará com a razão e se tornará entusiasmado, ou então se combinará com o desejo sensível e se tornará irritado. A virtude do Tymos é a coragem que permite lutar contra os desejos interiores, de modo a conceder à razão a supremacia que lhe é devida. A quarta virtude não é outra senão a justiça. É justo aquele que é temperado, corajoso e sábio.


Às três partes da alma são adicionadas as três classes da cidade. Para Platão, a cidade ideal é composta de três classes. À frente estão os filósofos que realmente desempenham o papel de magistrado e que têm por função o governo da cidade; depois vem a classe de soldados que representam a vontade e que, sob as ordens dos magistrados, pretendem proteger a cidade. No final da escada, encontramos a classe trabalhadora, que, sob as ordens de outras autoridades, é responsável por produzir os bens de que a sociedade precisa. Para que a sociedade funcione bem, todos devem ocupar o lugar que melhor se adéqua às suas habilidades. O bom funcionamento da sociedade exige que não apenas todos tenham uma posição, mas que essa posição esteja em conformidade com suas profundas inclinações. Ele se distinguiu por sua razão, não poderia se tornar um soldado, mas um magistrado. A cidade é, portanto, sob vários aspectos comparável à Alma e usa uma classificação do homem de acordo com as virtudes que possui. Aos magistrados corresponde a virtude da razão, aos soldados, a coragem e o desejo da classe trabalhadora.

A partir dessa filosofia nasce uma concepção de ética que será diferente da concepção popular de seu tempo. De fato, Platão não acredita que a ética possa se basear em normas sociais. A ética adota uma visão mais individualista e gira em torno da ideia de que a virtude se baseia no conhecimento. O bem e o conhecimento do bem constituem a base de todas as decisões que desejam ser morais. Naturalmente, chega a conclusão de que quem age de maneira imoral o faz por ignorância, uma vez que Platão está convencido de que o homem moral é feliz e que todo indivíduo que aspira à sua própria felicidade deseja incessantemente agir de maneira virtuosa. Os padrões sociais não podem impor uma forma de ética, porque são obra de uma pessoa no caso de um regime tirânico ou são provenientes do interesse da maioria em um regime democrático. Deve-se notar que Platão não colocou nenhum desses dois regimes em alta estima; isso significa ensinar ao indivíduo que está em profundo diálogo consigo mesmo e com os outros que as crenças morais do indivíduo e da cidade podem ser descobertas. E, como ele ensinou, o homem deve libertar-se de seus sentidos e acessar a verdade elevando a alma para descobrir a felicidade. Essa concepção de ética baseia-se no desenvolvimento pessoal. Como Sócrates, seu mestre, Platão nos permite saber que uma ação ética se justifica porque está sempre em harmonia com seu autor. Portanto, fica claro que não é mais a sociedade, nem qualquer conselho sábio, nem mesmo o tirano que planejaria como a ação ética deveria ser, mas é o indivíduo. Essa harmonia de que ele fala não seria alcançada se o indivíduo se perdesse na busca de bens materiais que recordem, apenas excitam os sentidos, é necessário cultivar as três virtudes da alma para acessar a quarta que é a harmonia. A ética, voltando à sua definição, é o ramo da filosofia que visa indicar como os seres humanos devem se comportar, agir e estar uns com os outros e com os que os rodeiam; o que Platão nos diz através de sua filosofia é que "o como agir?" Depende de cada pessoa. Contanto que você faça algo e não tenha um sentimento que confunda sua harmonia, o ato é eticamente aceitável. A ética é individual e não pode ter uma base coletiva; cabe a todos atingir esse nível de harmonia e mantê-lo precisamente, realizando atos que não destruam a harmonia.

Referências



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