PLATÃO e a sua Teoria Política
Sócrates
não queria se envolver em políticas ativas. Platão, por outro lado, sempre foi
atraído por ela, mas os eventos políticos de seu tempo e a morte de seu mestre
o levaram a desistir desse objetivo. No entanto, o interesse pela política estará presente
ao longo de sua vida, intimamente ligado ao seu pensamento filosófico.
Para Platão,
políticos autênticos só podem ser filósofos que, possuindo verdadeira
sabedoria, podem colocá-la em prática.
Não se pode esperar ver o fim das misérias humanas antes que
os verdadeiros filósofos cheguem à cabeça dos governos ou até que, por uma
providência inteiramente divina, aqueles que têm poder nos Estados se tornem
filósofos. [Platão, letra VII, 325d a 326b]
Platão oferece Sócrates como exemplo do verdadeiro político,
em oposição aos sofistas; em Górgias, ele faz Sócrates dizer, em sua própria
defesa, o que Platão pensa da política ateniense, não sem uma boa dose de
ironia:
Penso que me aplico à política real com um número muito
pequeno de atenienses, para não dizer sozinho, e que somente hoje cumpro os
deveres de cidadão. E como não procuro lisonjear aqueles com quem falo todos os
dias, a quem almejo o mais útil e não o mais agradável, e que não quero fazer
nada com todas essas coisas bonitas que você me aconselha, não saberei o que
posso dizer quando me encontrar diante dos juízes; e o que disse a Polus
aparece muito bem aqui; Serei julgado como seria um médico acusado diante de
crianças por um cozinheiro. Examine de fato o que um médico no meio de tais juízes
teria a dizer em defesa dele, se ele fosse acusado nos seguintes termos:
Filhos, este homem lhe causou grandes danos: ele é perdição para você e aqueles que são
mais jovens que você, e o lança em desespero, cortando, queimando, perdendo
peso e sufocando você; dá-lhe poções muito amargas e faz você morrer de fome e
sede, em vez de usar, como eu, pratos de todos os tipos, em grande número e
lisonjear a gosto. O que você acha que um médico diria em tal extremidade? Ele
diria o que é verdade? Filhos, fiz tudo isso para mantê-lo saudável. Como você
acha que esses juízes protestarão com essa resposta? Com toda a força, não é? [Platão, Górgias, 521 d - 522 a]
É impressionante notar o contraste entre a ideia que temos
hoje da tarefa da política, focada quase exclusivamente em fatores econômicos e
interesses pessoais e partidários, e o caráter ético que, segundo Platão tem
política.
Mafalda por Quino "DEMOCRACIA" (do grego, demos, povo e kratos, autoridade): governo no qual o povo exerce soberania".
As ideias
de Platão sobre política são basicamente expostas em três diálogos: República,
Política e Leis.
a) Na
República, ele explica como deve ser o estado para poder formar o homem
perfeito. Na descrição de tal estado. Ele descreve as diferentes classes de
cidadãos - trabalhadores, guardas e políticos - que correspondem aos três tipos
de almas.
Os guardas
terão que ter tudo em comum, abandonando a família e todas as formas de propriedade
privada. Este ponto sempre atraiu a atenção dos artistas e foi entendido de
maneiras muito diferentes. Contudo, não pode ser interpretado no sentido de uma
concepção comunista como é entendida hoje, porque não se pode esquecer que as
afirmações de Platão são o oposto de uma visão materialista de homem e
sociedade. Platão considerava a comunidade, a raça, a
sociedade acima do indivíduo e considerar este apenas de acordo com o grupo.
b) Se o estado pensado por Platão na República aparece como
utópico, na política e depois nas leis, é uma questão de um estado viável na
história. Ressalta que o verdadeiro político só pode ser um filósofo,
alguém que governa de acordo com a virtude e a ciência. Mas como não existem tais homens na Terra, a lei deve ter precedência. É assim que Platão estuda os
diferentes tipos de constituições políticas, que sempre terão que imitar o
ideal.
Nas Leis,
os problemas já são concretos, é uma questão de propor um modelo legislativo
para a cidade. O objetivo aqui é prático e é provavelmente nesse diálogo que os
discípulos de Platão fundaram as constituições que propuseram.
A alegoria da caverna
Essa
famosa passagem da República pode ser usada para resumir a visão geral do
pensamento platônico.
Bem! depois disso, digo, pense de acordo com um
teste como esse, nossa natureza em relação à educação e o fato de não ser
educado. Imagine, então, homens como em uma habitação subterrânea que se
assemelha a uma caverna, com a entrada aberta à luz por toda a extensão da
caverna, na qual estiveram desde a infância, com as pernas e o pescoço
acorrentados para que fiquem no lugar e vejam apenas na frente deles, incapazes
de virar a cabeça devido às correntes; e novamente a luz sobre eles, vinda de
cima e de longe, de um fogo ardente atrás deles; e, novamente, entre o fogo e o
acorrentado, uma estrada ao longo da qual você imagina que um muro é
construído, semelhante às paliçadas colocadas na frente dos homens pelos
criadores de prodígios, sobre as quais eles mostram suas maravilhas.
- Entendo, ele disse
- Agora veja ao longo desta parede homens carregando além de
utensílios de todos os tipos e as sombras que se projetam na parede, bem como estátuas de
homens e outros animais de pedra e madeira e várias obras; Como deve ser,
algumas dos objetos emitem sons enquanto outros ficam em silêncio.
- Estranho, ele disse, a imagem que você descreve!
"Semelhante a nós", eu disse; De fato, para
começar, você acha que eles poderiam ter visto outra
coisa senão que as sombras lançadas pelo fogo na parede da caverna? [Platão, República, 514 a - 515 b]
Dessa maneira simbólica, Platão descreve os diferentes graus
de realidade, desde as sombras das imagens refletidas na parede da caverna até
o sol. A esses graus de realidade correspondem os diferentes graus de
conhecimento, da vida dos prisioneiros, limitados às aparências, à visão do
sol, cujo acesso pressupõe o conhecimento prévio de outros objetos: a
dialética. Não se pode alcançar a contemplação do sol (verdadeira ciência) até
se libertar das correntes que aprisionam o homem, que expressa a concepção ética
platônica, que implica a libertação do corpo e dos sentidos. Por fim, quem
contemplou o sol só pode retornar à caverna com o desejo de libertar os outros
prisioneiros, mostrando-lhes a verdade e o erro a que estão sujeitos. Essa é a
função do filósofo governante, mas essa tarefa pode envolver um grande risco
para ele, até a morte, como para Sócrates, ou como o fim da história alegórica,
na qual os homens acorrentados tentam matar aquele que está tentando
libertá-los de sua existência conveniente, mas falsa.
SÓCRATES - Atenção ainda para este ponto. Supõe que nosso
homem volte ainda para a caverna e vá assentar-se em seu primitivo lugar. Nesta
passagem súbita da pura luz à obscuridade, não lhe ficariam os olhos como
submersos em trevas?
GLAUCO - Certamente.
SÓCRATES - Se, enquanto tivesse a vista confusa -- porque
bastante tempo se passaria antes que os olhos se afizessem de novo à
obscuridade -- tivesse ele de dar opinião sobre as sombras e a este respeito
entrasse em discussão com os companheiros ainda presos em cadeias, não é certo
que os faria rir? Não lhe diriam que, por ter subido à região superior, cegara,
que não valera a pena o esforço, e que assim, se alguém quisesse fazer com eles
o mesmo e dar-lhes a liberdade, mereceria ser agarrado e morto?SÓCRATES - Pois
agora, meu caro GLAUCO, é só aplicar com toda a exatidão esta imagem da caverna
a tudo o que antes havíamos dito. O antro subterrâneo é o mundo visível. O fogo
que o ilumina é a luz do sol. O cativo que sobe à região superior e a contempla
é a alma que se eleva ao mundo inteligível. Ou, antes, já que o queres saber, é
este, pelo menos, o meu modo de pensar, que só Deus sabe se é verdadeiro.
Quanto à mim, a coisa é como passo a dizer-te. Nos extremos limites do mundo
inteligível está a idéia do bem, a qual só com muito esforço se pode conhecer,
mas que, conhecida, se impõe à razão como causa universal de tudo o que é belo
e bom, criadora da luz e do sol, no mundo visível, autora da inteligência e da
verdade no mundo invisível, e sobre a qual, por isso mesmo, cumpre ter os olhos
fixos para agir com sabedoria nos negócios particulares e públicos. [Platão, República, 516 e - 517 a]
A grandeza
da filosofia platônica reside acima de tudo em sua descoberta da realidade
supra-sensível, que constitui uma revolução radical nas categorias de
pensamento filosófico. Tal descoberta, de fato, tem repercussões no
entendimento filosófico de toda a realidade. O sensível é entendido em uma nova
perspectiva, como causado ou derivado do supra-sensível; o problema
gnoseológico adquire contornos mais precisos; o conceito de homem é
radicalmente alterado, assim como os valores morais que devem governar sua
vida. Deus e o divino são pensados pela primeira vez em sua categoria
correta, isto é, como realidades imateriais.
[1] Ver Phédon, 83 b. No entanto, em outros diálogos
posteriores, Platão mitiga seu anti-hedonismo, considerando tantos tipos de
prazeres quanto partes da alma: concupiscível, irascível e racional. Os
verdadeiros prazeres seriam aqueles que pertencem à alma racional, mesmo que
ela não rejeite outros, desde que estejam sujeitos à parte superior da alma.
[2] Platão dedica espaço suficiente ao assunto do amor e um
de seus diálogos, o Banquete, é dedicado exclusivamente a ele.
[3] Platão concebe o divino como múltiplo e com várias
características: às vezes o divino é um princípio pessoal como o Demiurgo, os
deuses inferiores criados por este e alguns dos deuses da religião tradicional
que Platão admite; às vezes, como no caso das idéias, o divino assume uma forma
impessoal.
PARA NÃO FINALIZAR
Na cidade justa e perfeita de Platão, cada classe social ou grupo de cidadãos, faz o que deve fazer, sem ocupar-se das tarefas das outras classes: produtores não se arrogam títulos de governantes ou se põem a defender a cidade, nem estes querem governar ou produzir, assim como os governantes se atêm a governar. Na cidade de Platão, o indivíduo – seja ele produtor, guardião ou governante – está em imediata relação com a cidade inteira. Platão desfaz em especial a instituição da família: todos são filhos de todos, todos pertencem a todos. Não existem casais fixos. O Estado é quem ocupa-se da educação das crianças. Nessa cidade as mulheres e os homens têm os mesmos direitos, inclusive as mulheres podem trabalhar na guarda da cidade se tiverem a virtude respectiva exigida. Não há nenhuma instituição que faça a intermediação entre o indivíduo e o Estado. Para que a cidade seja bem governada, ou os filósofos são os governantes ou os governantes se transformam em filósofos.
Em oposição aos sofistas, Platão e Aristóteles afirmam o caráter natural da polis e da justiça. Embora concordem sob esse aspecto, diferem no modo como concebem a própria justiça.
Para Platão, os seres humanos e a polis possuem a mesma estrutura. Os humanos são dotados de três almas ou três princípios de atividade: a alma concupiscente ou desejante (situada no ventre), que busca satisfação dos apetites do corpo, tanto os necessários à sobrevivência, quanto os que, simplesmente, causam prazer; a alma irascível ou colérica (situada no peito), que defende o corpo contra as agressões do meio ambiente e de outros humanos, reagindo à dor na proteção de nossa vida; ealma racional ou intelectual (situada na cabeça), que se dedica ao conhecimento, tanto sob a forma de percepções e opiniões vindas da experiência, quanto sob a forma de idéias verdadeiras contempladas pelo puro pensamento.
Também a polis possui uma estrutura tripartite, formada por três classes sociais: a classe econômica dos proprietários de terra, artesãos e comerciantes, que garante a sobrevivência material da cidade; a classe militar dos guerreiros, responsável pela defesa da cidade; e a classe dos magistrados, que garante o governo da cidade sob as leis.
Um homem, diz Platão, é injusto quando a alma concupiscente (os apetites e prazeres) é mais forte do que as outras duas, dominando-as. Também é injusto quando a alma irascível (a agressividade) é mais poderosa do que a racional, dominando-a. O que é, pois, o homem justo? Aquele cuja alma racional (pensamento e vontade) é mais forte do que as outras duas almas, impondo à concupiscente a virtude da temperança ou moderação, e à irascível, a virtude da coragem, que deve controlar a concupiscência. O homem justo é o homem virtuoso; a virtude, domínio racional sobre o desejo e a cólera. A justiça ética é a hierarquia das almas, a superior dominando as inferiores.
O que é a justiça política? Essa mesma hierarquia, mas aplicada à comunidade. Como realizar a Cidade justa? Pela educação dos cidadãos – homens e mulheres (Platão não exclui as mulheres da política e critica os gregos por excluí-las). Desde a primeira infância, a polis deve tomar para si o cuidado total das crianças, educando-as para as funções necessárias à Cidade.
A educação dos cidadãos submete as crianças a uma mesma formação inicial em cujo término passam por uma seleção: as menos aptas serão destinadas à classe econômica, enquanto as mais aptas prosseguirão os estudos. Uma nova seleção separa os jovens: os menos aptos serão destinados à classe militar enquanto os mais aptos continuarão a ser educados. O novo ciclo educacional ensina as ciências aos jovens e os submete a uma última seleção: os menos aptos serão os administradores da polis enquanto os mais aptos prosseguirão os estudos. Aprendem, agora, a Filosofia, que os transformará em sábios legisladores, para que sejam a classe dirigente.
A Cidade justa é governada pelos filósofos, administrada pelos cientistas, protegida pelos guerreiros e mantida pelos produtores. Cada classe cumprirá sua função para o bem da polis, racionalmente dirigida pelos filósofos. Em contrapartida, a Cidade injusta é aquela onde o governo está nas mãos dos proprietários – que não pensam no bem comum da polis e lutarão por interesses econômicos particulares -, ou na dos militares – que mergulharão a Cidade em guerras para satisfazer seus desejos particulares de honra e glória. Somente os filósofos têm como interesse o bem geral da polis e somente eles podem governá-la com justiça.
Por seu turno, Aristóteles terá uma teoria política diversa da dos sofistas e de Platão.
Para determinar o que é a justiça, diz ele, precisamos distinguir dois tipos de bens: os partilháveis e os participáveis. Um bem é partilhável quando é uma quantidade que pode ser dividida e distribuída – a riqueza é um bem partilhável. Um bem é participável quando é uma qualidade indivisível, que não pode ser dividida nem distribuída, podendo apenas ser participada – o poder político é um bem participável. Existem, pois, dois tipos de justiça na Cidade: a distributiva, referente aos bens econômicos; e a participativa, referente ao poder político. A Cidade justa saberá distingui-las e realizar ambas.
A justiça distributiva consiste em dar a cada um o que é devido e sua função é dar desigualmente aos desiguais para torná-los iguais. Suponhamos, por exemplo, que a polis esteja atravessando um período de fome em decorrência de secas ou enchentes e que adquira alimentos para distribuí-los a todos. Para ser justa, a Cidade não poderá reparti-los de modo igual para todos. De fato, aos que são pobres, deve doá-los, mas aos que são ricos, deve vendê-los, de modo a conseguir fundos para aquisição de novos alimentos. Se doar a todos ou vender a todos, será injusta. Também será injusta se atribuir a todos as mesmas quantidades de alimentos, pois dará quantidades iguais para famílias desiguais, umas mais numerosas do que outras.
A função ou finalidade da justiça distributiva sendo a de igualar os desiguais, dando-lhes desigualmente os bens, implica afirmar que numa cidade onde a diferença entre ricos e pobres é muito grande vigora a injustiça, pois não dá a todos o que lhes é devido como seres humanos. Na cidade injusta, em lugar de permitirem aos pobres o acesso às riquezas (por meio de limitações impostas à extensão da propriedade, de fixação da boa remuneração do trabalho dos trabalhadores pobres, de impostos e tributos que recaiam sobre os ricos apenas, etc.), vedam-lhes tal direito. Ora, somente os que não são forçados às labutas ininterruptas para a sobrevivência são capazes de uma vida plenamente humana e feliz. A Cidade injusta, portanto, impede que uma parte dos cidadãos tenha assegurado o direito à vida boa.
A justiça política consiste em respeitar o modo pelo qual a comunidade definiu a participação no poder. Essa definição depende daquilo que a Cidade mais valoriza, os regimes políticos variando em função do valor mais respeitado pelos cidadãos. Há Cidades que valorizam a honra (isto é, a hierarquia social baseada no sangue, na terra e nas tradições), julgando o poder a honra mais alta que cabe a um só: tem-se a monarquia, onde é justo que um só participe do poder.
Há Cidades que valorizam a virtude como excelência de caráter (coragem, lealdade, fidelidade ao grupo e aos antepassados), julgando que o poder cabe aos melhores: tem-se a aristocracia, onde é justo que somente alguns participem do poder. Há Cidades que valorizam a igualdade (são iguais os que são livres), consideram a diferença entre ricos e pobres econômica e não política, julgando que todos possuem o direito de participar do poder: tem-se a democracia, onde é justo que todos governem.
Os regimes políticos Dois vocábulos gregos são empregados para compor as palavras que designam os regimes políticos: arche – o que está à frente, o que tem comando – e kratos – o poder ou autoridade suprema. As palavras compostas com arche (arquia) designam quantos estão no comando. As compostas com kratos (cracia) designam quem está no poder.
Assim, do ponto de vista da arche, os regimes políticos são: monarquia ou governo de um só (monas), oligarquia ou governo de alguns (oligos), poliarquia ou governo de muitos (polos) e anarquia ou governo de ninguém (ana).
Do ponto de vista do kratos, os regimes políticos são: autocracia (poder de uma pessoa reconhecida como rei), aristocracia (poder dos melhores), democracia (poder do povo)xv.
Na Grécia e na Roma arcaicas predominaram as monarquias. No entanto, embora os antigos reis afirmassem ter origem divina e vontade absoluta, a sociedade estava organizada de tal forma que o governante precisava submeter as decisões a um Conselho de Anciãos e à assembléia dos guerreiros ou chefes militares. Isso fez com que, pouco a pouco, o regime se tornasse oligárquico, ficando nas mãos das famílias mais ricas e militarmente mais poderosas, cujos membros se consideravam os “melhores”, donde a formação da aristocracia.
O único regime verdadeiramente democrático foi o de Atenas. Nas demais cidades gregas e em Roma, o regime político era oligárquico-aristocrático, as famílias ricas sendo hereditárias no poder, mesmo quando admitiam a entrada de novos membros no governo, pois as novas famílias também se tornavam hereditárias.
Devemos a Platão e a Aristóteles duas idéias políticas, elaboradas a partir da experiência política antiga: a primeira delas é a distinção entre regimes políticos e não-políticos; a segunda, a da transformação de um regime político em outro.
Um regime só é político se for instituído por um corpo de leis publicamente reconhecidas e sob as quais todos vivem, governantes e súditos, governantes e cidadãos. Em suma, é político o regime no qual os governantes estão submetidos às leis. Quando a lei coincide com a vontade pessoal e arbitrária do governante, não há política, mas despotismo e tirania. Quando não há lei de espécie alguma, não há política, mas anarquia.
A presença ou ausência da lei conduz à ideia de regimes políticos legítimos e ilegítimos. Um regime é legítimo quando, além de legal, é justo (as leis são feitas segundo a justiça); um regime é ilegítimo quando a lei é injusta ou quando é contrário à lei, isto é, ilegal, ou, enfim, quando não possui lei alguma. Os regimes políticos se transformam em decorrência de mudanças econômicas – aumento do número de ricos e diminuição do número de pobres, diminuição do número de ricos e aumento do número de pobres – e de resultados de guerras – conquistas de novos territórios e populações, submissão a vencedores que conquistam a Cidade.
Presença ou ausência da lei, variação econômica e militar determinam, segundo Platão e Aristóteles, a corrupção ou decadência dos regimes políticos: a monarquia degenera em tirania, quando um só governa para servir aos seus interesses pessoais; a aristocracia degenera em oligarquia dos muito ricos – plutocracia – ou dos guerreiros – timocracia -, que também governam apenas em seu interesse próprio; a democracia degenera em demagogia e esta, em anarquia. Em geral, a anarquia leva à tirania, quando a sociedade, desgovernada, apela para um homem superior aos outros no manejo das armas e dos argumentos, nele buscando a salvação.
A tipologia platônico-aristotélica segundo o valor dos que participam do poder e a teoria da decadência ou corrupção dos regimes políticos serão mantidas até o século XVIII, aparecendo com vigor numa das obras políticas mais importantes da Ilustração, O espírito das leis, de Montesquieu. Nessa obra, encontramos também uma ideia desenvolvida por Aristóteles, para quem a variação dos regimes políticos depende de dois fatores principais: a natureza ou índole do povo e a extensão do território.
Assim, por exemplo, um povo cuja índole ou natureza tende espontaneamente para a igualdade e a liberdade e cuja Cidade é de pequena extensão territorial, naturalmente instituirá uma democracia e será mal-avisada se a substituir por um outro regime. Em contrapartida, um povo cuja índole ou natureza tende espontaneamente para a obediência a uma única autoridade e que vive num território extenso, naturalmente instituirá a monarquia, sendo desavisada se a substituir por outro regime político. Em outras palavras, os filósofos gregos legaram ao Ocidente a ideia de regimes políticos naturais.
ALGUNS CONCEITOS
E ALGUMAS REFLEXÕES
IMPORTANTES SOBRE POLÍTICA
Baixe em PDF - ALVARO JOSE DOS PENEDOS O PENSAMENTO POLÍTICO DE PLATÃO
Leia o artigo de Cláudio William Veloso - A verdadeira cidade de Platão
Referências:
CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. 6.ed. São Paulo, Ática,1997. p. 381-384
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